sexta-feira, setembro 23, 2022

Sondagem SIC/Expresso: pacote de ajuda do Governo desagrada, mas não tanto aos pensionistas

 

Mais de um terço dos portugueses não gostaram das medidas anti-inflação apresentadas por António Costa, mostra a sondagem ICS/ISCTE. Mas os reformados são dos menos descontentes, apesar da polémica das últimas semanas. Famílias ‘aflitas’ sobem sete pontos em seis meses. Para 87% dos inquiridos o pior está para vir. Há três semanas que a oposição critica reiteradamente o Governo por se preparar para fazer um corte no valor-base das pensões a partir do próximo ano, há três semanas que no mundo mediático se critica a forma que o Governo escolheu para aliviar os pensionistas do aumento da inflação, ou o modo como o anunciou. Mas, se as medidas anunciadas por António Costa para aliviar o impacto da inflação na vida das famílias, aprovadas agora pelo Parlamento, não merecem aplauso da maioria dos portugueses, elas também não parecem ter melindrado particularmente os eleitores socialistas, ou sequer os pensionistas. De acordo com a sondagem ICS/ISCTE realizada para o Expresso e a SIC, são mais os inquiridos que consideram as medidas “más” ou “muito más”, 36%, do que aqueles que as veem de forma positiva (18%), mas o pacote “Famílias Primeiro” acaba por ser visto como neutro para 41% dos inquiridos neste estudo.

Mais ainda, analisando as respostas de acordo com os perfis dos inquiridos percebe-se que apenas 19% dos que se declaram simpatizantes do PS dão nota negativa às decisões do Governo, muito longe não só da média, como sobretudo dos 56% de simpatizantes do PSD insatisfeitos com os anúncios — uma tendência semelhante quando separamos as respostas por eleitores de esquerda e de direita.

Entre os simpatizantes socialistas, como se sabe, contam-se muitos reformados, um eleitorado que foi essencial para a maioria absoluta de outubro. E o facto é que o anúncio de que o aumento das pensões seria repartido — igualando em 2023 o valor da inflação, mas prenunciando um corte no valor-base da pensão no futuro — acabou por evitar uma desilusão geral com o Governo de Costa: os pensionistas insatisfeitos com o pacote de medidas são 32%, quatro pontos abaixo da média e seis pontos abaixo dos que estão em idade laboral (dos 25 aos 64 anos).

Seja a explicação para esta ‘resistência’ a forma como Costa comunicou as medidas ou as medidas em si, a realidade é que no próximo ano os reformados serão dos portugueses mais protegidos pelo Governo da subida dos preços: os funcionários públicos, por exemplo, contarão com uma perda significativa do poder de compra, tendo em conta a referência de aumentos de 2% assumida pelo primeiro-ministro numa entrevista na semana passada.

Olhando para a sondagem, as críticas ao pacote de medidas anunciado pelo Governo são maiores sobretudo entre os portugueses que dizem ter dificuldades em viver com o atual rendimento, mas ainda assim num valor estatisticamente pouco significativo: 39% para 34%, para uma margem de erro que ronda os 3,5%. O cheque de €125 por pessoa (mais 50 por criança) pode ter atenuado uma avaliação mais negativa, embora a sondagem realizada entre 10 e 18 de setembro não tenha ido aos detalhes das medidas anunciadas.

PREPARADOS PARA PIOR

Outro dado a ter em conta nesta sondagem é o da avaliação da situação económica: como mostra o gráfico, de março para cá a perceção de que piorou subiu 19 pontos, acentuando muito a imagem de um país pessimista — 67% a sentirem o peso da crise contra 7% a avaliarem a situação positivamente. Porém, olhando o histórico percebe-se que o ceticismo ainda não atingiu o pico do período da pandemia. É que em abril de 2021 as respostas negativas atingiam os 82% — menos 15 pontos percentuais do que hoje.

Só que, olhando para a frente, o pessimismo acentua-se... muito. “No que diz respeito ao aumento dos preços, acha que o pior já passou ou ainda está para vir”, perguntava o inquérito. E a resposta é clara: 87% dos portugueses respondem que o pior “está para vir”; apenas 6% que “o pior já passou”. Se o Presidente da República tem insistido com o Governo para que diga aos portugueses que o que aí vem é “bem pior”, descanse: os portugueses parecem estar bem conscientes, “sem diferenças significativas por sexo, idade, instrução, avaliação do atual rendimento ou posicionamento ideológico”, acrescenta o relatório elaborado pelo ICS/ISCTE, que anota apenas um ligeiro menor pessimismo entre os simpatizantes do PS (mesmo assim, 81% de respostas negativas sobre a evolução dos preços).

METADE DO PAÍS AFLITO

Se o cenário à frente é difícil, a avaliação que é feita da evolução do nível de vida do agregado mostra como as dificuldades já atingem boa parte da população. Metade dos inquiridos desta sondagem garante que, no último ano, a situação financeira familiar piorou (43%) ou piorou muito (7%), face a apenas 5% que viram as contas melhorar. No meio estão ainda 44% de portugueses que dizem estar na mesma — sem alterações substanciais de nível de vida.

Quando a pergunta é mais precisa — “relativamente ao rendimento do seu agregado familiar”, as respostas consolidam um cenário de aflição. É que 48% dizem ser já “difícil” ou “muito difícil” viver com o rendimento atual, mais sete pontos do que em março passado e, neste caso, também sete ponto acima das respostas verificadas no pico da pandemia (abril do ano passado).

FICHA TÉCNICA

Sondagem cujo trabalho de campo decorreu entre os dias 10 e 18 de setembro de 2022. Foi coordenada por uma equipa do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (ICS-ULisboa) e do Iscte - Instituto Universitário de Lisboa (ISCTEIUL), tendo o trabalho de campo sido realizado pela GfK Metris. O universo da sondagem é constituído pelos indivíduos, de ambos os sexos, com idade igual ou superior a 18 anos e capacidade eleitoral ativa, residentes em Portugal Continental. Os respondentes foram selecionados através do método de quotas, com base numa matriz que cruza as variáveis sexo, idade (4 grupos), instrução (3 grupos), região (5 Regiões NUTII) e habitat/dimensão dos agregados populacionais (5 grupos). A partir de uma matriz inicial de região e habitat, foram selecionados aleatoriamente 83 pontos de amostragem onde foram realizadas as entrevistas, de acordo com as quotas acima referidas. A informação foi recolhida através de entrevista direta e pessoal na residência dos inquiridos, em sistema CAPI, e a intenção de voto em eleições legislativas recolhida recorrendo a simulação de voto em urna. Foram contactados 2742 lares elegíveis (com membros do agregado pertencentes ao universo) e obtidas 807 entrevistas válidas (taxa de resposta de 29%, taxa de cooperação de 42%). O trabalho de campo foi realizado por 40 entrevistadores, que receberam formação adequada às especificidades do estudo. Todos os resultados foram sujeitos a ponderação por pós-estratificação de acordo com a frequência de prática religiosa e a pertença a sindicatos ou associações profissionais dos cidadãos portugueses com 18 ou mais anos residentes no Continente, a partir dos dados da vaga mais recente do European Social Survey (Ronda 9). A margem de erro máxima associada a uma amostra aleatória simples de 807 inquiridos é de +/- 3,5%, com um nível de confiança de 95%. Todas as percentagens são arredondadas à unidade, podendo a sua soma ser diferente de 100% (Expresso, texto dos jornalistas David Dinis e Sofia Miguel Rosa)

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