Os níveis de endividamento das famílias, das empresas e do Estado ainda estão acima do registado antes da pandemia, em 2019. Mas os investidores na dívida pública olham para Portugal de um modo mais positivo do que para Espanha e colocam o país bem longe da zona vermelha. No caso da dívida pública, situava-se em 116,6% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2019 e estava em 125,6% no final do primeiro semestre de 2022, apesar da queda de um máximo trimestral de 138,9% nos primeiros três meses de 2021. Quanto ao endividamento das famílias — onde o crédito à habitação é determinante —, estava nos 68,1% do PIB no final de junho deste ano, segundo os dados do Banco de Portugal, em queda depois de ter atingido os 72,6% nos primeiros três meses de 2021, mas acima dos 65,4% registados no final de 2019. O mesmo se regista nas empresas privadas. O endividamento de 129,2% do PIB no final de junho compara com 135,8% em março de 2021 e 125% no final de 2019.
Neste contexto, o surto
inflacionista tem obrigado a apertar o cinto. Famílias e empresas sofrem a
pressão da subida das taxas de juro Euribor, que no prazo a seis meses saltaram
de terreno negativo (-0,55%) no final do ano passado para mais de 1,3% esta semana
(ver gráfico). O que, no caso das famílias, “já se está a refletir na
desaceleração do consumo”, aponta o economista Abel Mateus, considerando que,
como resultado do desendividamento desde 2012, “as empresas, excetuando casos
pontuais, estão melhor preparadas para enfrentar a subida dos juros”. Quanto ao
Tesouro, já viu o custo médio de novas emissões mais do que duplicar em relação
ao ano passado.
“A subida dos juros vai
afetar as economias mais endividadas, o que inclui Portugal”, aponta João
Borges de Assunção, professor da Católica Lisbon, salientando que “Grécia,
Itália e Espanha estão mais vulneráveis”. Um aumento que “retira margem de
manobra ao Governo para apoios às famílias ou estímulos fiscais”.
Assiste-se a um agravamento
da ‘fragmentação’ no mercado da dívida pública da zona euro. Aquele palavrão
técnico usado pelo Banco Central Europeu (BCE) significa que há uma disparidade
crescente entre os prémios de risco (spreads) face ao custo de financiamento
alemão exigido pelos investidores. Para além da linha vermelha (spread acima de
2 pontos percentuais) estão duas economias, a Grécia (apesar de três resgates
desde 2010) e Itália (onde falhou a gestão política por Mario Draghi), e oito
membros do euro estão acima da média da zona euro. Portugal regista um spread
acima da média, mas melhorou significativamente aos olhos dos investidores,
distanciando-se da vizinha Espanha e de outros periféricos mediterrânicos e
bálticos (ver gráfico).
A dívida portuguesa está a beneficiar da flexibilização nos reinvestimentos dos valores que chegam à maturidade na carteira do BCE. Através deste mecanismo, o banco comprou em junho e julho €514 milhões em títulos anteriormente adquiridos no âmbito do programa PEPP (para responder à pandemia) e €382 milhões de obrigações que tem na carteira do programa PSPP (mais antigo). Mas o BCE tem centrado reinvestimentos de milhares de milhões de euros em Itália, Espanha e Grécia, sem que o spread exigido pelos investidores saia da zona vermelha para Itália e Grécia ou de um nível acima da média em Espanha (Expresso, texto dos jornalistas Jorge Nascimento Rodrigues e Sónia M. Lourenço)
Sem comentários:
Enviar um comentário