"Perguntam as pessoas: mas para isso, e dadas as características totalitárias e protofascistas deste governo de coligação e considerando a sua visão conservadora e hiperliberal quanto ao modelo de sociedade, eles não podiam limitar-se a aprovar legislação dispondo para o efeito de maioria absoluta no parlamento? Podiam, mas não o querem fazer. Porquê?
Por três razões concretas: o receio da instabilidade social e suas consequências, a necessidade, segundo este governo, de transformar essas medidas em decisões definitivas, portanto, imutáveis, independentemente de quem vier no futuro a ser governo, e a necessidade de uma revisão constitucional. Por isso, na óptica desta maioria ainda no poder, é imperioso que o PS seja forçado a envolver-se neste processo, o que explica o desespero do governo e da atual maioria quando confrontados com a sistemática recusa (por puro oportunismo político e branqueamento de memória) dos socialistas. Sem o PS, e no presente quadro parlamentar, não há revisão constitucional e sem essa alteração da Constituição, dificilmente serão legais quaisquer reduções de despesa pública, muito menos as impostas unilateralmente, que colidam com princípios constitucionais que datam desde 1976.
Desde logo permitindo-me citar o jornalista do Expresso, Nicolau Santos, especialista na área económica - por vezes temos no jornalismo dos nossos dias uns "especialistas" feitos a martelo, e agora muito mais, particularmente em economia, subitamente caídos do céu que abordam com sobranceria e deslumbrante eloquência e "sabedoria" esta temática complexa, como se, por magia, fossem dotados de uma formação académica, que eu não tenho, o que me remete para superficialidades e generalidades que visam apenas transmitir uma opinião. Com Nicolau Santos não, porque reconhecidamente é jornalista especializado, por formação nestes domínios. E permito-me citar um seu texto de opinião, neste contexto, porque muitas vezes as pessoas passam ao lado destas opiniões, desvalorizando-as ou relegando-as mesmo para planos de prioridade secundários que contrastam com as preocupações mais prementes e atuais da sociedade, com os seus protestos, frustrações e angústias:
"Vítor Gaspar colocou hoje (dia da realização da ridícula conferência de imprensa do Ministro das Finanças) o seu melhor ar de hipnotizador para nos tentar passar três ideias: que o ajustamento está a correr como o previsto; que o défice orçamental foi cumprido; e que em 2014 tudo começa a melhorar. São tudo inverdades. O ajustamento não está a correr como o previsto. O défice orçamental não é cumprido desde 2011. E em 2014 não há sinais de melhoria no horizonte.
O certo é que com o seu experimentalismo económico e o seu fundamentalismo ideológico, o ministro colocou o país de pantanas. A dívida pública vai chegar aos 124% em 2014, um valor obviamente impagável. O desemprego está descontrolado, porque atingir 2016 sempre com taxas de desemprego acima dos 18% é uma barbaridade - e vamos ver se este valor não trepará ainda mais. Estamos no terceiro ano de recessão, com um valor acumulado de 7%. E o défice orçamental foi de 6,6% no ano passado contra o objetivo inicial de 4,5% e final de 5% - apesar do ministro agora ter descoberto que há três valores para o défice: o que conta para a troica (4,9%), o que conta para o Eurostat (6,6%) e o saldo orçamental sem efeitos pontuais (6%). Uma conversa para obviamente enganar e confundir os incautos.
Na verdade, foi Gaspar que optou, depois de falhar o ajustamento orçamental em 2011 e 2012, por carregar a sério num brutal aumento de impostos para 2013, contra o que estava escrito no programa de ajustamento e contra a vontade da troica. O resultado é uma economia devastada pelo napalm dos impostos.
Que Gaspar piedosamente fale agora em algumas medidas de apoio ao crescimento só dá para chorar, porque não há nenhuma vontade de rir. Quem é que investe neste ambiente? Quem é que aposta num país sem energia? E quem acredita que é mesmo isso que o ministro quer?
Gaspar fala fala mas nós não o vemos a fazer nada para apoiar o crescimento. Talvez não seja ele que tenha de fazer isso. Mas então é melhor não mencionar a corda na casa do enforcado. Até porque os seus truques de hipnotismo deixaram obviamente de ter qualquer credibilidade".
É neste contexto, e com um país e um governo de coligação refém de um falhado, que vamos dar início à discussão política dos cortes do chamado ”estado social” numa discussão que está completamente viciada e que se transformou num dos maiores embustes políticos de que há memória nos últimos anos, devido a erros comunicacionais, aliás denunciados e criticados pela própria troica, conforme foi noticiado.
A exigência da troica de que o dinheiro reportado a esta 7ª avaliação só será disponibilizado quando for divulgado o rol dos cortes na despesa pública, e que afetarão inevitavelmente áreas sensíveis, social e constitucionalmente como a saúde, a educação e segurança social, poderão transformando-se num perigoso rastilho passível de originar, mesmo antes de tais medidas serem aprovadas, uma contestação social com consequências imprevisíveis. Estamos a falar de um país desesperado, desmotivo, desesperançado e que cada vez mais se mostra disponível para um ajuste de contas cuja dimensão violenta será proporcional ao impacto dos cortes que serão efetuados.
Neste quadro, considero ofensivo o descaramento do FMI, expresso no comunicado divulgado à margem da patética conferência de imprensa de Gaspar, quando faz alusão a um “amplo consenso político e social continua a ser um importante fator do êxito do programa” que contrasta com a realidade. Estes asquerosos técnicos do FMI – incluindo o africano chefe da missão, oriundo de um dos países mais pobres do mundo, com maiores níveis de corrupção e mergulhado em guerras civis constantes, algo que o devia preocupar, mais do que andar a perorar pela Europa sobre as contas públicas de terceiros - não conhecem a realidade do país, vivem em função de modelos de austeridade falhados, chegam a Portugal hospedando-se em hotéis luxuosos, andam em carros de marca de topo de gama, insistem na teoria de soluções falhadas, avaliam sempre positivamente tudo o que é feito no país, pelo menos até o momento em que deixarmos de pagar aos credores o que lhes devemos. Se um dia o fizermos, então não há santos que nos valham.
Finalmente, não percebo o que espera este falhado ministro Gaspar, cuja incompetência está à vista de todos, até porque não conseguiu acertar uma previsão que fosse desde que foi empossado, que impõe austeridade quando a austeridade anterior falha e toma os portugueses todos por tontos com aqueles discursos idiotas lidos num timbre de voz absolutamente patético - que se comporta como se não fosse mais do que um servo servil e submisso dos capitalistas europeus, dos mafiosos da finança europeia, dos agiotas dos credores, dos especuladores e da banca - para se demitir. O que espera Gaspar para se ir embora e defender assim, se é que ainda vai a tempo, uma réstia da sua dignidade? Ou será que Gaspar foi imposto a Coelho pelos agiotas europeus e ainda não recebeu “autorização” para se afastar ou ser demitido? Será que Gaspar é um funcionário da troica e não ministro? Competente de certeza não é porque ninguém o conhecia de lado nenhum, ninguém ouviu falar dele, ninguém lhe conhece obra feita, ninguém o convidou para nada antes deste cargo que por mero acidente de percurso lhe foi entregue? Demita-se!" (LFM(JM)