Os partidos admitem que uma lei não resolve todos os problemas, mas é mais um instrumento para aumentar a transparência. PCP e Bloco de Esquerda estão contra, alegando que está em causa a legalização do tráfico de influências.
terça-feira, novembro 28, 2023
Valor das casas caiu em outubro e crédito à habitação caiu para 100 mil milhões
O valor mediano ficou nos 1.536 euros por metro quadrado, cinco euros abaixo da média registada por metro quadrado em setembro. Ainda assim, o valor de outubro fica 8,2% acima do mesmo mês do ano passado.
Crédito à habitação caiu em outubro
O volume total de crédito à habitação caiu 1%, em outubro, para cerca de 100 mil milhões de euros. É, segundo o Banco de Portugal, uma descida face ao mesmo mês de 2022.
Sondagem: José Luís Carneiro é o preferido dos portugueses para líder do PS e primeiro-ministro
O atual ministro da Administração Interna é o preferido dos portugueses para líder do PS e também para primeiro-ministro, segundo revela a sondagem da Universidade Católica para a RTP, Antena 1 e jornal Público. José Luís Carneiro surge à frente de Luís Montenegro na preferência para chefe de Governo e é o candidato que reúne mais votos para líder dos socialistas. No entanto, para os inquiridos que votaram PS nas últimas legislativas, o líder escolhido é Pedro Nuno Santos. A 10 de março do próximo ano, os portugueses serão de novo chamados às urnas para escolher um novo Parlamento e um novo primeiro-ministro.
A sondagem da Universidade Católica para a RTP, Antena 1 e jornal Público pôs em confronto Luís Montenegro e dois dos candidatos à liderança do PS (Pedro Nuno Santos e José Luís Carneiro). Para a maioria dos portugueses inquiridos, José Luís Carneiro seria melhor chefe de Governo do que o líder dos social-democratas (42% contra 37%). No entanto, se o confronto for com Pedro Nuno Santos, há um empate, com uma ligeira vantagem para Luís Montenegro (40% contra 39%). Nos dois cenários há um número significativo de indecisos (21%).
José Luís Carneiro preferido para a liderança do PS
Pedro Nuno Santos e José Luís Carneiro são os candidatos à liderança do Partido Socialista, depois de António Costa se ter demitido na sequência da “Investigação Influencer” e ter anunciado que não se recandidataria ao cargo. A escolha do novo secretário-geral do PS será feita pelos militantes socialistas nos dias 15 e 16 de dezembro. No entanto, se a nomeação do novo líder socialista estivesse nas mãos dos portugueses, o favorito seria José Luís Carneiro.
Sondagem: Carneiro ganha a Pedro Nuno e Montenegro para primeiro-ministro
Luís Montenegro com popularidade atrás de Carlos Moedas e de Pedro Passos Coelho para candidato a primeiro-ministro do PSD. José Luís Carneiro fica à frente de Luís Montenegro – com 42% das intenções de voto – na corrida para primeiro-ministro. Pelo menos este é o número que a sondagem Universidade Católica/PÚBLICO/RTP revela quando se pergunta ao universo de participantes na sondagem quem preferiam para primeiro-ministro. Num cenário de confronto com José Luís Carneiro nas legislativas de 10 de Março, Luís Montenegro seria derrotado, já que apenas 37% do universo o considera melhor primeiro-ministro do que o actual ministro da Administração Interna.
Já numa disputa com Pedro Nuno Santos, os dados da sondagem revelam um empate técnico, com Luís Montenegro à frente por um ponto. Assim, à pergunta “qual seria o melhor primeiro-ministro”, Luís Montenegro recolhe 40% das preferências, enquanto Pedro Nuno Santos apenas 39%. Mas se restringirmos a análise aos inquiridos que votaram no PS nas últimas eleições, os dois candidatos ultrapassam Luís Montenegro por larga margem. Tanto Pedro Nuno Santos como José Luís Carneiro obtêm 64 por cento na pergunta sobre “quem é melhor primeiro-ministro” em confronto com Luís Montenegro.
Sondagem: direita sem Chega vale o mesmo que toda a esquerda
Os partidos de direita todos juntos, sem o Chega, valem tanto como os partidos de esquerda, incluindo o PAN. É o que revela a sondagem de Novembro do Centro de Estudos e Sondagens de Opinião da Universidade Católica (Cesop) para o PÚBLICO, RTP e Antena 1. O PSD obtém 29%, a Iniciativa Liberal 9%, o CDS 2%, o que representa 40% das intenções de voto. O PS com 28% somado com a CDU (3%), BE (6%), o Livre (2%), e o PAN (2%) consegue formar um bloco que recolhe 41% das intenções de voto. Isto significa que os dois blocos têm praticamente a mesma força, sem ter em conta o Chega. Com o partido de André Ventura, um bloco de direita liderado pelo PSD com 56% teria possibilidades de obter a maioria absoluta. A sondagem não faz a distribuição de mandatos porque as eleições legislativas não têm um círculo eleitoral único mas 22, que correspondem aos distritos e dois círculos de emigração. Nas eleições legislativas de 2022, o PSD teve 27,6% dos votos, a IL 4,9% e o CDS 1,6%. Sem o Chega que teve 7,1%, o bloco de direita valia 34,1%. A sondagem mostra que os eleitores preferem um governo de coligação do que um governo minoritário e que aceitam também que haja "geringonças", como em 2015, ou seja, que o segundo partido mais votado possa formar governo se conseguir reunir os apoios de outros partidos. O presidente do PSD, Luís Montenegro, já disse que não aceita fazer coligações com o Chega.
Ficha técnica
Este inquérito foi realizado pelo CESOP - Universidade Católica Portuguesa para a RTP, Antena 1 e PÚBLICO entre os dias 15 e 24 de Novembro de 2023. O universo alvo é composto pelos eleitores residentes em Portugal. Os inquiridos foram seleccionados aleatoriamente a partir duma lista de números de telemóvel, também ela gerada de forma aleatória. Todas as entrevistas foram efectuadas por telefone. Os inquiridos foram informados do objectivo do estudo e demonstraram vontade de participar. Foram obtidos 1102 inquéritos válidos, sendo 41% dos inquiridos mulheres. Distribuição geográfica: 31% da região Norte, 20% do Centro, 33% da Área Metropolitana de Lisboa, 7% do Alentejo, 5% do Algarve, 2% da Madeira e 2% dos Açores. Todos os resultados obtidos foram depois ponderados de acordo com a distribuição da população por sexo, escalões etários e região com base no recenseamento eleitoral. A taxa de resposta foi de 31%. A margem de erro máximo associado a uma amostra aleatória de 1102inquiridos é de 3% com um nível de confiança de 95% (Publico, texto da jornalista Helena Pereira)
Expresso: Alberto João Jardim defende “uma grande frente, incluindo o Chega, para derrotar o socialismo e o comunismo”
Ex-presidente do governo regional da Madeira celebrou
o 25 de Novembro em Câmara de Lobos e conversou com o Expresso sobre uma
aliança de toda a direita, entre o PSD, o CDS e o Chega. “Se a solução é esta,
vamos a esta”, diz. Deixa avisos ao seu partido e uma provocação a Pedro Nuno
Santos
“Neste momento, é preciso ver que tipo de bloco é
possível fazer entre o CDS e o PSD, que contributo ambos podem dar para fazer
um grande partido de massas ao centro-direita”, é a proposta que Alberto João
Jardim lança no dia do Congresso do PSD que prepara as eleições antecipadas de
10 de março. Mas o governante que permaneceu mais tempo em funções na
democracia portuguesa vai mais longe no desafio à sua área política. Não é
apenas uma fusão entre velhos aliados, mas também uma coligação com os novos
concorrentes. “Eu hoje defendo que deve haver uma grande frente, incluindo o
próprio Chega, para derrotar o socialismo e o comunismo”. Caso necessário, até
com presença no executivo. “Se for preciso uma coligação governamental, defendo
que seja feita”, adianta, em divergência ‒ ou
antecipação ‒ face ao restante PSD.
E o veterano dos sociais-democratas tem argumentos na manga. “Neste momento, estão partidos de extrema-direita em vários governos da Europa. Em nenhum deles se verificou qualquer atentado à democracia ou violação da normalidade democrática. Estão ali, direitinhos, a cumprir a Constituição. Não se derrota a extrema-direita com as tiradas da esquerda. Derrota-se, obrigando-a a cumprir o jogo democrático e esvaziando-a dentro do jogo democrático”, é a tese de João Jardim, revelada ao Expresso esta tarde. “A direita democrática só derrotará a esquerda e a extrema-direita se, perante a derrota da esquerda, colocar a extrema-direita numa área de poder em que esta cumpre a Constituição e deixa de ser qualquer tipo de ameaça”, concretiza.
Os aviões andam a voar à "velocidade do som". Eis porquê
A corrente de jato é conhecida por reduzir em cerca de uma hora os voos de longo curso de oeste para leste. Mas, neste momento, está a ser especialmente difícil para os viajantes em classe económica, pois a corrente de jato sobre o Atlântico é tão forte que os voos que se dirigem dos EUA para a Europa estão a atingir velocidades equivalentes à do som. O som viaja a cerca de 1225 km por segundo em "condições normais ao nível do mar", segundo a NASA. Nas últimas 24 horas, os aviões de passageiros que viajam para leste dos EUA, atravessando o Atlântico, atingiram até 1252 km/h. Isto é um pouco mais de 322 km/h mais rápido do que as velocidades de cruzeiro normais.
Mas se pensa que estes tempos de voo estão à altura do desaparecido Concorde, cujas explosões sónicas costumavam assinalar a quebra da barreira do som, é altura de pensar de novo. Há uma diferença entre a velocidade no solo e a velocidade no ar (velocidade indicada no ar, essencialmente a velocidade do avião em relação ao ar que o rodeia). Estes voos de passageiros, por muito rápidos que sejam, não quebraram a barreira do som.
Aviação: Subida de dois dígitos nas taxas alvoraça companhias
A subida das taxas aeroportuárias proposta pela ANA para 2024 está a agitar o sector e já levou inclusive a Ryanair a ameaçar retirar os voos dos aeroportos da Madeira, Açores e Faro usando o custo como argumento. É que no próximo ano, se a proposta da concessionária for aceite pela ANAC, as taxas irão aumentar 14,55%, em média, o equivalente a €1,6 por passageiro. Uma subida significativa, fruto do crescimento da procura, associado ao galope da inflação — e ainda assim revista em baixa pela ANA que inicialmente apontava para uma inflação de 9,7% e reviu depois para 8,8%. São subidas permitidas pelo contrato de concessão, que quanto mais procura existe, mais permite aumentar as taxas. É no Aeroporto Humberto Delgado que o aumento será maior: 16,98%, o equivalente a €2,29 por bilhete. É também em Lisboa que a procura é maior, deverá chegar aos 34 milhões em 2023. No polo oposto estão os Açores, onde o aumento será menor: 7,47% (€0,57). No Porto a subida será de 11,92% (+€0,92), em Faro de 11,35% (+€0,88) e na Madeira de 7,92% (+€0,98).
A proposta está sob a análise da ANAC, que prefere manter o silêncio sobre o assunto. Já teve, no entanto, o protesto das companhias. A Associação das Companhias Aéreas em Portugal (RENA) e a IATA (Associação Internacional de Transporte Aéreo) assinaram um documento conjunto, que enviaram ao regulador da aviação, onde contestam o aumento. “Foi apresentada uma reclamação pela RENA e a IATA à ANAC contestando a decisão da ANA relativamente à proposta das taxas aeroportuárias para o próximo ano, especialmente a do aeroporto de Lisboa”, confirmou ao Expresso o diretor-geral da RENA, António Moura Portugal. Mas não quis avançar as razões do protesto. O Expresso sabe, porém, que um dos argumentos usados pelas companhias para justificar o desacordo com a subida prende-se com o facto de os custos da ANA com os passageiros terem recuado mais de 2%, em 2022.
A ANA tem desdramatizado, sublinhando que se trata de um valor mínimo no preço de um bilhete, inferior a 1% do montante cobrado em média pelas companhias que voam para Lisboa. A bola está agora do lado da ANAC, que terá de dizer se aceita a proposta ou obriga a concessionária a revê-la (Expresso, texto da jornalista ANABELA CAMPOS)
Os benefícios do ‘clube’ do rating A
A dívida portuguesa de longo prazo tem, finalmente, uma maioria confortável de notações de rating A, depois de a agência Moody’s, na semana passada, ter subido, de surpresa, a classificação portuguesa para A3 (o equivalente a A- nas outras agências), tanto mais que a decisão foi tomada no meio de uma crise política grave. Há um efeito reputacional imediato: “Os investidores confiarão mais na dívida portuguesa, porque uma agência de referência como a Moody’s diz que é mais segura”, refere-nos David Brito, diretor-geral em Portugal da plataforma internacional de gestão de risco Ebury.
Com a melhoria da notação decidida pela Moody’s, a dívida portuguesa passa a ter quatro classificações no patamar de rating A (ver tabela). “Falta, apenas, a Standard & Poor’s (S&P) para fazer o pleno no rating A”, diz David Brito. A S&P ainda classifica a dívida portuguesa em BBB+. Até final do ano não está prevista mais nenhuma decisão de agências, e o calendário para 2024 ainda não é conhecido. O leque de notações atuais já equilibrou a situação com os ratings para a dívida espanhola (ver tabela).
Eleições 2024: Sondagem aponta para empate técnico entre PS e PSD
Depois do terramoto que levou à demissão de António Costa e à consequente crise política, a sondagem da Universidade Católica para a RTP, Antena 1 e jornal Público, divulgada esta segunda-feira, aponta para um empate técnico entre PS e PSD nas eleições legislativas de 2024. Os social-democratas têm uma ligeira vantagem de um ponto percentual em relação ao Partido Socialista. Os resultados desta sondagem política realizada pelo CESOP–Universidade Católica Portuguesa indicam que 75% dos inquiridos têm já a ideia de votar nas próximas eleições legislativas, marcadas para 10 de março. Os dois principais partidos estão lado a lado na tabela no que respeita às intenções diretas de voto dos portugueses (20%), com ligeira vantagem para os social-democratas na estimativa de resultados eleitorais (29% para 28%). Os números representam uma queda para os dois partidos em relação aos resultados do CESOP de julho último, embora se mantenha o empate técnico.
Mas o maior prejudicado é o Partido Socialista, que sofre uma queda de 13 pontos percentuais face às últimas eleições, onde obteve uma maioria absoluta. Já o PSD conquista mais um ponto percentual em relação a esse escrutínio. O Chega, por sua vez, é o partido que tem a maior subida no número de votos. O partido de André Ventura consegue agora 16% dos votos - mais nove pontos percentuais em relação ao resultado das legislativas do ano passado. A Iniciativa Liberal também cresce para 9% e quase duplica as intenções de voto. À esquerda, o Bloco de Esquerda sobe para 6% e a CDU cai ligeiramente para os 3%. O Livre, PAN e CDS-PP estão empatados com 2% dos votos. A sondagem aponta para uma maioria clara dos partidos da área não socialista, que juntos somam 56%. Por sua vez, os da área socialista totalizam 41%.
Sem apoios sociais quase 4,4 milhões de pessoas em Portugal seriam pobres
Quase 4,4 milhões de pessoas em Portugal seriam pobres se não houvesse transferências sociais, revela o Instituto Nacional de Estatísticas baseando-se em dados de 2022, ano em que a taxa de risco de pobreza aumentou para 17%. Os dados constam do mais recente Inquérito às Condições de Vida e Rendimentos (ICOR), realizado em 2023, mas relativo aos rendimentos de 2022, e dão conta de um aumento da taxa de risco de pobreza de 0,6 pontos percentuais (p.p.) em comparação com 2021, o que significa mais 81 mil pessoas. De acordo com o INE, “o contributo das transferências sociais para a redução da pobreza foi de 4,2 p.p. em 2022”.
“Considerando apenas os rendimentos do trabalho, de capital e transferências privadas, 41,8% da população residente em Portugal estaria em risco de pobreza em 2022”, o equivalente a 4.365.675 pessoas, refere o instituto. Segundo o INE, os rendimentos provenientes de pensões de reforma e sobrevivência fizeram com que o risco de pobreza baixasse em 20,6 p.p., “resultando assim, numa taxa de risco de pobreza após pensões e antes de transferências sociais de 21,2%”.
E com razão: Quase três em cada quatro portugueses pensa que IA vai eliminar empregos
São os homens e os mais jovens (até aos 34 anos) quem mais procura saber como a Inteligência Artificial (IA) poderá alterar a sua função. Um estudo do Observador Cetelem divulgado esta segunda-feira mostra que quase três em cada quatro portugueses (68%) acredita que a Inteligência Artificial (IA) levará a uma redução do número de postos de trabalho. “Os resultados do Observador Inteligência Artificial 2023 (…) revela que a maioria dos inquiridos (68%) acreditam que a IA irá provocar uma redução dos postos de trabalho”, lê-se num comunicado. “Uma das dúvidas que prevalece é sobre a possibilidade de as máquinas substituírem o homem nas suas funções profissionais”, acrescenta a nota sobre o estudo. De acordo com o documento, a opinião de que os humanos “poderão ser substituídos pelas máquinas, levou a que 80% dos inquiridos referissem que se informaram ou se tencionam informar sobre o impacto da Inteligência Artificial no seu trabalho”. São os homens e os mais jovens (até aos 34 anos) quem mais procura saber como a IA poderá alterar a sua função. A “importância do conhecimento das novas tecnologias é reconhecida pelos inquiridos”, revela o estudo, “uma vez que se verifica que a larga maioria (75%) tem interesse em formações na área, tendo intenção de procurar – ou já procurado – informações sobre as que estão disponíveis” (Sol)
Público - Taxa de risco de pobreza em Portugal subiu para 17%. Lisboa teve o maior aumento
Em 2022, havia mais 81 mil pessoas a viverem com menos de 591 euros mensais. A pobreza ou exclusão social ameaça agora 2,1 milhões de portugueses. Especialistas admitem agravamento da pobreza urbana. Depois de uma diminuição registada em 2021, a taxa de risco de pobreza em Portugal voltou a subir, para os 17%, em 2022, segundo os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) revelados esta segunda-feira. Um aumento de 0,6 pontos percentuais, o que significa que mais 81 mil pessoas viviam com rendimentos mensais líquidos inferiores a 591 euros.
A Área Metropolitana de Lisboa (AML) destaca-se pela negativa: é a região com o maior aumento de pobreza e também a que apresenta o maior nível de desigualdades. “Alguma coisa estranha se está a passar na Área Metropolitana de Lisboa”, diz o investigador Fernando Diogo, especialista em questões de pobreza, da Universidade dos Açores. “Este aumento ligeiro da taxa do risco de pobreza tem muito que ver com o que se passou na AML nesse período e também um bocadinho nos Açores. Mas é sobretudo a AML que influencia, pelo peso do aumento e pelo peso da população que ali reside – porque é que há esta divergência e, sobretudo, este aumento de pobreza, é a questão que se coloca e não tenho resposta para ela”, diz.
O sociólogo destaca assim os dados relativos à taxa do risco de pobreza por região, em que se percebe que apenas a AML e os Açores viram crescer esse risco, enquanto no centro a taxa se manteve, tendo baixado nas restantes. Apesar de os Açores e a Madeira continuarem a ter as taxas de risco de pobreza mais elevadas do país – 26,1% e 24,8%, respectivamente –, os dois arquipélagos revelaram tendências diferentes na comparação entre os dois últimos anos, com a taxa a subir um ponto percentual nos Açores e a diminuir 1,1 pontos percentuais na Madeira.
Sondagem PÚBLICO-RTP: PS e PSD caem e mantêm empate. Chega sobe para 16%
Dois maiores partidos continuam com empate técnico, mas dão um tombo. Chega, IL e PAN sobem na primeira sondagem do Cesop desde a crise política. O centro afunda-se e o Chega sobe. É isto que mostra a sondagem de Novembro do Centro de Estudos e Sondagens de Opinião da Universidade Católica (Cesop) para o PÚBLICO, RTP e Antena 1: 29% para os sociais-democratas, 28% para os socialistas. Na última sondagem, de Julho, o PSD tinha também mais um ponto do que o PS – 33% contra 32%. O “empate técnico” entre PS e PSD mantém-se, mas a conclusão nova e mais evidente é que os dois maiores partidos sofrem um rombo eleitoral em igual medida, o que significa que desde o Verão o eleitorado penaliza praticamente da mesma forma os grandes partidos. Em quatro meses, os dois partidos alienam juntos oito pontos percentuais, sendo que os únicos partidos a subir no mesmo período são o Chega, IL, PAN e CDS.
Esta sondagem foi feita entre os dias 15 e 24 de Novembro, reflectindo já os efeitos da crise política aberta no dia 7, com buscas a gabinetes do Governo e com a demissão de António Costa por causa da Operação Influencer. Nessas buscas, foram constituídos arguidos o chefe de gabinete do primeiro-ministro, o então ministro das Infra-Estruturas e o advogado e amigo de António Costa Diogo Lacerda Machado, entre outros. No dia 9, o Presidente da República reuniu o Conselho de Estado e anunciou que a solução para o país seria eleições antecipadas, que marcou para o dia 10 de Março.
Com a demissão de Costa, o PS prepara-se para escolher um novo líder em eleições directas nos dias 15 e 16 de Dezembro, sendo que há três candidatos: Pedro Nuno Santos, José Luís Carneiro e Daniel Adrião. De acordo com a sondagem, a maior subida na intenção de voto é no Chega, que passa de 10% em Julho para 16%. A Iniciativa Liberal sobe de 7% para 9%, o PAN de 1% para 2% e o CDS também de 1% para 2%.
Sondagem: sem maioria, coligações são cenário preferido mesmo que com adversários ideológicos
A sondagem avalia quais as preferências dos inquiridos perante um cenário em que o partido mais votado não tem maioria para governar. São poucos os que querem ver o vencedor a governar sozinho. O partido que vencer as eleições legislativas de 10 de Março deve procurar apoio à esquerda ou à direita, se não tiver maioria absoluta, mesmo que esse suporte venha do lado oposto do hemiciclo. A sondagem feita pelo Centro de Estudos e Sondagens de Opinião (Cesop) da Universidade Católica para o PÚBLICO e RTP mostra assim que a fatia de leão dos inquiridos defende entendimentos que permitam governar, em vez de o partido vencedor governar sozinho. Se as eleições fossem hoje, o PSD seria o partido mais votado, com 29% dos votos, e o PS seria o segundo partido com maior percentagem de votos, com 28%. Uma diferença curta e que não dá maioria absoluta a nenhum dos dois maiores partidos. O inquérito previa esta possibilidade e quis questionar os inquiridos sobre as coligações pós-eleitorais.
Olhando em primeiro lugar para o partido que teve maior percentagem de votos, os inquiridos foram questionados: “Se o PSD ganhar as próximas eleições legislativas sem maioria absoluta, o que será melhor para o país?” Setenta por cento dos inquiridos consideram que deve haver um governo apoiado pelo PSD. No entanto, dividem-se sobre a que lado do hemiciclo o partido de Luís Montenegro deve ir buscar apoios. Naturalmente, 42% (a maior percentagem) consideram que o Governo deve ser apoiado pelo PSD e “um ou mais partidos à sua direita”.
Mas 28% admitem que o executivo possa ser apoiado pelo PSD e por “um ou mais partidos à sua esquerda”. Só 10% responderam que, no cenário de o PSD ser o mais votado mas sem maioria absoluta, Portugal deve ter um Governo “apoiado apenas pelo PSD” – ou seja, são mais os que admitem o apoio da esquerda ao PSD do que aqueles que admitem o PSD sozinho, sem maioria.
Público - Regiões exportam mais para outras regiões nacionais do que para o estrangeiro
Novo modelo económico construído pelo PlanAPP e pela Universidade de Coimbra traça retrato mais completo das economias regionais portuguesas e das fortes dependências que têm entre si. Os bens e serviços vendidos pelas diferentes regiões portuguesas para as outras regiões do país têm um maior peso nas suas economias do que as vendas que realizam para o estrangeiro, de acordo com uma estimativa realizada utilizando um novo modelo para a economia portuguesa construído para analisar o impacto de medidas e políticas. O Alentejo, muito graças à refinaria de Sines, é a única região do país a registar um excedente comercial.
Os cálculos são apresentados no relatório “Comércio inter-regional em Portugal”, publicado esta segunda-feira pelo PlanAPP - Centro de Competências da Administração Pública. Este organismo encomendou à Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra a construção de um modelo que, sendo utilizado pelos diversos organismos do Estado, lhes permita avaliar o impacto das políticas públicas que estejam a implementar ou que pretendam introduzir, não só a nível nacional, como já acontece com outros modelos, mas também a nível regional.
Uma das características inovadoras deste novo modelo – denominado PReMMIA (Portuguese Regions Model for Multi Impact Analysis) – está no facto de levar em conta a estrutura produtiva de cada região e a forma como se relacionam, quer com outros países, quer com as outras regiões do país.
Para conseguir fazer isto, os criadores do modelo tiveram de ir mais além do que a informação já disponível nas estatísticas oficiais. Aquilo que o Instituto Nacional de Estatística (INE) publica é, em relação ao comércio de bens e serviços das regiões portuguesas (as sete da classificação NUT II), apenas os fluxos de e para outros países, isto é, as exportações e importações internacionais. Já no que diz respeito às exportações e importações inter-regionais, estas não constam das estatísticas oficiais.
Expresso - Madeira: O ano de todos os recordes
É de manhã que tudo acontece. Os grandes navios chegam, sorrateiros, durante a noite, modificando a paisagem do Funchal. Na ilha todos sabem quais são os cruzeiros, a que horas chegam, de onde vêm e para onde vão, porque são estas cidades flutuantes que contribuem para o sustento de muita gente. Acorrem ao porto os táxis amarelos, carrinhas brancas de nove lugares, autocarros e jipes. Enquanto alguns passageiros se espreguiçam à varanda, outros apressam-se no pequeno-almoço para irem ocupar o seu lugar nas viagens organizadas.
Os que preferem caminhar até ao centro da cidade, a poucos metros, não tardarão a encontrar o Mercado dos Lavradores. Aqui, a algazarra é feita de turistas, de locais e de vendedores, que alimentam coloridas bancas de flores, frutas, de paredes de piripíri, frutos secos e especiarias. Um jovem casal alemão faz as primeiras férias com o bebé de meses. A Madeira estava nos planos desde a pandemia por causa das imagens de sonho que viram no Instagram. A descrição é próxima da de Xavier, um espanhol que está a percorrer a Levada dos Balcões, no centro da ilha. Tem 25 anos e veio com uma amiga, que neste dia preferiu ir fazer mergulho. O jovem, que trabalha num teatro, conta que descobriu a Madeira a fazer scroll e encantou-se com as fotografias. Mais à frente, Alexandre e Joana, de 29 e 28 anos, de Torres Vedras. As imagens que (também) viram antes não os prepararam para o que estavam a viver naquele momento no Miradouro dos Balcões: Joana exibe um tentilhão, pequeno pássaro de tom azulado, na sua mão. É certo que levaram comida para aves, seguindo as recomendações de um amigo, mas não imaginavam que iriam estar num miradouro com uma vista incrível sobre a ilha com um pássaro na mão. Não eram os únicos. Os tentilhões aqui não passam fome — antes pelo contrário.
Pobreza aumenta em Portugal: 17% da população vive com menos de 591 euros por mês
Os resultados do Inquérito às Condições de Vida e Rendimento, realizado em 2023 sobre rendimentos do ano anterior, indicam que 17% das pessoas estavam em risco de pobreza em 2022, mais 0,6 pontos percentuais (p.p.) do que em 2021. A taxa de risco de pobreza correspondia, em 2022, à proporção de habitantes com rendimentos monetários líquidos (por adulto equivalente) inferiores a 7 095 euros (591 euros por mês). Segundo o INE, o aumento da pobreza abrangeu todos os grupos etários, embora de forma mais significativa os menores de 18 anos (mais 2,2 p.p. relativamente ao ano anterior). A taxa de risco de pobreza dos adultos em idade ativa aumentou 0,4 p.p e a da população idosa aumentou 0,1 p.p. O crescimento da taxa de risco de pobreza afetou mais significativamente as mulheres (mais 0,9 p.p., de 16,8% em 2021 para 17,7% em 2022) do que os homens (mais 0,3 p.p., de 15,9% em 2021 para 16,2% em 2022). Os mesmos dados mostram que em 2022, 22,7% da população que apenas tinha concluído o ensino básico era pobre, um valor significativamente superior às proporções de 13,5% para a população que tinha terminado o ensino secundário ou pós-secundário e de 5,8% para a população que tinha concluído o ensino superior.
Expresso: 127 noites de clima tropical ajudam a novo recorde da produção de banana da Madeira
Em 2022 foram 22 766 mil toneladas, este ano deverão ser 25 mil. A produção de banana da Madeira bate recordes ano após ano, beneficiando com as grandes temporadas de calor até agora invulgares na região. Pode parecer, mas não são só boas notícias. “Tivemos 127 noites consecutivas com temperaturas acima de 20 graus na ilha da Madeira. Este ano foi um ano excecional, para o bem e para o mal. Nunca tínhamos tido temperaturas de 40 graus no Arco da Calheta e tivemos durante vários dias. É uma brutalidade. Sim, a banana gosta, e houve um recorde de produção. Mas depois houve os incêndios, e os incêndios queimam floresta, com menos floresta há menos água”.
António Freitas está num dos seus bananais, no Arco da Calheta, freguesia na costa sul da ilha, a 30 quilómetros do Funchal. Corre uma aragem que faz restolhar as folhas verdes e abanar os pesados cachos que, não tarda, estarão bons para apanhar. É um recanto de sol e sombra, fresco, em que os caules das enormes plantas estão todos amparados por estacas, mais do que uma por pé, para resistirem aos fortes ventos que assolam a Madeira.
Falávamos dos desafios do seu trabalho, de como tem sempre que fazer nas oito parcelas onde, desde 2014, se dedica ao cultivo de bananas. Foi uma mudança de vida e o regresso ao local onde cresceu. Desde pequeno que carregava cachos mais pesados do que ele às costas e, mal pôde, saiu da ilha procurando outra vida. Há nove anos, resolveu voltar e aprender tudo de novo. Fez formação e tem trabalhado para transformar os seus bananais numa fonte de rendimento. Aos 51 anos, que está em contracorrente: “Imagine dez minutos com um cacho de 80 quilos às costas, trazer do monte cá para baixo é muito complicado. É muito difícil ter pessoas com menos de 30 anos a acartar banana. Ninguém quer vir para a banana, a média é de 65 anos nos produtores”, aponta.
Expresso - “Vieram como formiguinhas”: depois da pandemia o turismo da Madeira explodiu
Os recordes vão sendo batidos: número de dormidas, de rendimento por quarto, de visitantes, de receitas, mas também de número de rent-a-car e de alojamentos locais. Na ilha da Madeira, a dinâmica turística está viçosa e a mudar, com a chegada de visitantes mais jovens de telemóvel em riste. É de manhã que tudo acontece. Os grandes navios chegam, sorrateiros, durante a noite modificando a paisagem do Funchal. Na ilha todos sabem quais são os cruzeiros, a que horas chegam, de onde vêm e para onde vão, porque são estas cidades flutuantes que contribuem para o sustento de muita gente. Acorrem ao porto os táxis amarelos, carrinhas brancas de nove lugares, autocarros e jipes. Enquanto alguns passageiros se espreguiçam à varanda, outros apressam-se no pequeno-almoço para irem ocupar o seu lugar nas viagens organizadas.
Entre os passageiros, há quem prefira caminhar até ao centro da cidade, a poucos metros. Não tardarão a chegar ao Mercado dos Lavradores, no coração do Funchal. Aqui a algazarra é feita de turistas, de locais e de vendedores, que alimentam coloridas bancas de flores, frutas, de paredes de piripiri, frutos secos e especiarias. Um jovem casal alemão faz as primeiras férias com o bebé de meses dentro do carrinho. Escolhem frutas perfumadas, a fazer contas aos dias que lhes restam na ilha. Estão alojados num alojamento local, que marcaram pela internet. A Madeira estava nos planos desde a pandemia, por causa das imagens de sonho que viram no Instagram.
Quais os salários médios na Europa? Em que países se paga mais (e menos) e que posição ocupa Portugal?
A legislação laboral da UE é geralmente bastante rígida, nomeadamente no que diz respeito às condições de trabalho e direitos trabalhistas. No entanto, quando se trata de salários entre os estados-membros da UE, ainda existem variações significativas, dependendo de vários factores, tais como legislação, procura e inflação. A Euronews Business analisa os países que melhor recompensam os trabalhadores. De acordo com o Statista, em 2022, o salário médio anual variou entre 73.642 euros na Islândia e 24.067 euros na Grécia.
Os países com salários mais elevados em 2022 foram:
Islândia (73.642 euros)
Luxemburgo (72.529 euros)
Suíça (67.605 euros)
Bélgica (63.758 euros)
Dinamarca (59.405 euros),
Já os países com remunerações mais baixas foram:
Grécia (24.067 euros)
Eslováquia ( 24.337 euros)
Hungria (26.376 euros)
Portugal (29.540 euros)
República Checa (30.967 euros).
Madeira: alterações climáticas assustam e podem ameaçar a floresta laurissilva
Apesar de, nos últimos anos, se falar mais das medidas de redução de CO2, o tema da captura de carbono “é uma opção relevante na descarbonização do sistema energético”, pode ler-se no Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050. Se nada for feito para conter as emissões de carbono, a Madeira do fim do século XXI será uma ilha 3 a 5 graus mais quente, com menos chuva e maior risco de inundações nas localidades ribeirinhas devido à subida do nível do mar. As projeções dos cenários climáticos para o arquipélago indicam que até a floresta laurissilva pode estar em risco.
Todos os dias, centenas de turistas percorrem as levadas e os trilhos para ter a experiência de atravessar a floresta húmida e densa que cobre as montanhas da Madeira. A floresta laurissilva é património da UNESCO, está protegida por lei, mas poderá não sobreviver às alterações climáticas. As projeções dos cenários climáticos indicam que, se nada for feito para diminuir as emissões de dióxido de carbono, em 2100 a temperatura poderá subir até mais 10 graus nos picos mais altos da Madeira.
“Em termos médios a temperatura deverá aumentar 3 a 5 graus”, explica Ara Gouveia, diretor regional do Ambiente. Foi a direção do Ambiente que apresentou, em outubro, a regionalização dos cenários climáticos e as alterações na temperatura, precipitação e nível da água do mar para os próximos 75 anos. E, tal como no resto do planeta, as conclusões são preocupantes.
O futuro será pior, embora a questão seja já o presente na Madeira. Junho de 2023 foi uma amostra de como o clima está a mudar. O mês começou com a passagem de uma tempestade, de nome Oscar, que colocou o arquipélago em aviso vermelho. E, em poucas horas, foi batido o recorde de chuva do país. Não só a tempestade passou tarde – no fim do Primavera – e depois de três meses quase sem chuva – como poucas semanas depois, no fim de Junho, a região enfrentou uma onda de calor, com temperaturas acima dos 30 graus e índices muito baixos de humidade no ar.
Expresso - Madeirensidade: Um jeito de falar que é mais do que um sotaque
Os estudos desenvolvidos pela Universidade da Madeira no âmbito da linguística mostram que a forma de falar dos madeirenses é mais do que um sotaque: tem um léxico próprio e uma sintaxe diferente do português falado no continente. E os vários inquéritos para teses de sócio-linguística revelaram que a população tem um sentimento de dupla pertença: é português, mas é madeirense e sente orgulho na maneira como fala. Se há característica que permite identificar um português nascido e criado na Madeira é forma como fala. Essa mistura de sotaque, léxico e sintaxe à qual é leal e sente orgulho. “Os madeirenses não têm um problema de auto-estima. Os vários estudos e inquéritos em sócio-linguística que fizemos mostram isso mesmo: há uma lealdade, um sentimento de pertença à comunidade que se traduz na forma como se fala. E esse orgulho é evidente nas classes sociais mais desfavorecidas e menos escolarizadas, entre os jovens universitários e nas elites”.
Aline Bazenga é professora da Universidade da Madeira e, nos últimos anos, tem orientado vários trabalhos académicos a propósito do português que é falado na ilha, essa variedade madeirense que, na verdade, tem várias camadas. Num espaço isolado a forma de falar trazida pelos povoadores no século XV misturou-se com as influências vindas de fora e o léxico próprio de atividades económicas desenvolvidas pela população em 600 anos de História.
Expresso - Levadas: As veias aquáticas da Madeira esperam o veredicto da UNESCO
A candidatura das levadas da Madeira a património mundial está entregue. Oito das 134 levadas da ilha aguardam o reconhecimento do valor excecional destas construções que sulcam a ilha desde há 600 anos, levando a água das nascentes, na serra, até aonde dela precisam. É novembro e a água corre fininha e segura no canal. Um silvo delicado de vida que escorre pela ilha, levada pela gravidade desde a nascente no alto da serra, em carreiros esculpidos na pedra e na terra. É esta água que chega às torneiras, às plantações de banana, aos campos de golfe, e aciona as centrais hidroelétricas e engenhos antigos, como os moinhos. E é esta água que acompanha os passeios ao longo das levadas, nos vários itinerários turísticos na Madeira.
“Dizemos Madeira é como se a Madeira tivesse um sistema sanguíneo, com as veias, as artérias e os vasos capilares. As artérias, que transportam a água no seu melhor estado, desde a origem, são as levadas principais que distribuem a água pelas secundárias e as secundárias fazem chegar a água aos diferentes campos agrícolas. A Madeira é como se fosse um grande corpo vivo irrigada por água. Se na sua origem teve a lava, na atualidade tem a água”. Susana Fontinha é bióloga e a coordenadora da equipa multidisciplinar que durante três anos preparou a candidatura das levadas da Madeira a património mundial da UNESCO na categoria de paisagem cultural.
O grupo de trabalho, que envolveu várias entidades sob coordenação da Secretaria Regional de Agricultura e Ambiente, escolheu oito levadas principais para submeter à apreciação da UNESCO: As levadas dos Tornos, do Rei, do Caldeirão Verde e da Serra do Faial, na zona oriental da ilha, e as levadas do Norte, do Risco, das 25 Fontes e do Alecrim, na zona ocidental. “Foram candidatas oito levadas localizadas em dois maciços, o maciço montanhoso oriental e ocidental, porque é onde estão as nascentes. Contemplámos a levada desde a origem até pontos de entrega de água”, explica Susana Fontinha.
Expresso - Sindicatos dos Bordados da Madeira fecha... por falta de associados
Da indústria dos bordados da Madeira sobra uma fábrica e cerca de 400 bordadeiras de casa, a maioria com mais de 45 anos. O sector, que chegou a empregar milhares de mulheres, corre o risco de desaparecer. O sindicato, ícone das lutas laborais do pós-revolução, fechou quando a empresa onde trabalhava a presidente abriu falência. Ana Paula foi dobradeira e consertadeira, duas categorias profissionais em vias de extinção como todas as outras funções desempenhadas pelas trabalhadoras das casas de bordados. A fábrica onde começou a trabalhar chegou a ter 250 funcionários. Quando encerrou, em 2022, eram apenas sete. Ana Paula Rodrigues estava nesse lote de resistentes, dedicou 38 anos ao sector e à luta sindical.
E coube-lhe a amarga missão de ser a última presidente do Sindicato dos Bordados, ícone das lutas laborais na Madeira do pós-revolução. Ainda assim, antes de fechar as portas, conseguiu negociar salários das trabalhadoras das fábricas e estabelecer a tabela dos preços pagos às bordadeiras de casa por cada 100 pontos de bordado. “O que conseguimos foi 2,12 euros por cada 100 pontos”. Esta é ainda a tabela em vigor.
Foi a última negociação numa altura em que era cada vez mais complicado manter o sindicato a funcionar. As fábricas, que chegaram a ser perto de 50, encerraram quase todas e “era cada vez mais difícil cobrar quotas”. Quando a empresa onde trabalhou 38 anos – a Patrício Gouveia - abriu falência e passou a ser apenas um bazar de visita percebeu que a luta, o sindicato já não fazia sentido.
Para trás ficaram anos de trabalho e de sindicalismo. A vida das mulheres das casas dos bordados – o nome que tinham as fábricas de bordado Madeira – não era fácil, recebiam pouco e tinham má fama. “Eu lembro-me do que contavam as mais velhas, quando as mulheres dos bordados eram consideradas putas e bilhardeiras (cosculheiras)”. Em 1986 o quadro já era outro, mas ainda assim duro.
segunda-feira, novembro 27, 2023
Operação Lawrence, investigação do Expresso: A aventura do banqueiro Ricardo Salgado no país do coronel Kadhafi (2)
De como Ricardo Salgado se interessou por um banco sem valor e com uma organização completamente caótica para ocultar grandes movimentações de dinheiro para o exterior da Líbia. Esta é a segunda de três partes de uma investigação feita pelo Expresso, pela SIC e pelo Setenta e Quatro. O Aman Bank era um banco insignificante. Não apenas no contexto financeiro líbio, mas sobretudo na operação global do Grupo Espírito Santo. Daí que vários quadros do BES, à margem de Ricardo Salgado, tenham criticado a concretização do negócio. No início de 2011, após a eclosão da primeira guerra civil na Líbia, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) pediu “esclarecimentos adicionais ao mercado sobre os potenciais impactos na situação patrimonial do banco”.
Em resposta, Elsa Ramalho, responsável do BES pelas relações com os investidores, esclareceu por email que, “no final de 2010, o Aman Bank tinha 478 milhões de euros de ativo líquido”. O correspondente a 0,6% do ativo total consolidado do BES, “um valor imaterial” para as contas do grupo àquela data. A somar à “ausência de valor”, a desorganização interna e operacional do Aman Bank era “assustadora”. Ou, como alertaria igualmente por correio eletrónico Rui Silveira, as “deficiências” funcionais e operativas detetadas no banco líbio eram “potenciadoras de sérios riscos legais, reputacionais e para toda a atividade”. O administrador do BES reagia aos resultados da primeira auditoria interna ao Aman Bank, em agosto de 2010, cujo relatório final concluía que aquela instituição apresentava uma “falta geral de cultura de controlo”.
A situação não parecia inquietar ou desagradar Ricardo Salgado. Antes pelo contrário. O banqueiro ignorou os alertas emitidos por uma auditoria externa “completa” ao Aman Bank realizada pela KPMG, entre janeiro e fevereiro de 2011, e que custou ao BES meio milhão de euros, de acordo com uma ata do banco de 26 de outubro de 2012.
Operação Lawrence, investigação do Expresso: A aventura do banqueiro Ricardo Salgado no país do coronel Kadhafi (1)
Apoderou-se da gestão do único banco líbio exclusivamente privado, o Aman Bank. Corrompeu o governador do banco central. Criou uma brigada de operacionais que remunerou através do ‘saco azul’. Teceu uma teia de influências que se estendeu a políticos e diplomatas portugueses nos Governos de Sócrates e de Passos Coelho. Lavou e expatriou a fortuna de Kadhafi. Contornou sanções internacionais e lucrou com os dois lados da guerra. Uma investigação do Expresso, da SIC e do “Setenta e Quatro” com base na agenda de Ricardo Salgado. Na viragem do milénio, o ‘reabilitado’ Mouammar Kadhafi converteu-se no astro mais luminoso da galáxia geopolítica mundial. A Líbia, até então uma nação pária sob sequestro internacional, emergiu do deserto como uma espécie de novo eldorado petrolífero para as democracias ocidentais. Portugal posicionou-se na linha da frente na corrida ao ouro negro líbio.
Em menos de cinco anos, entre outubro de 2005 e setembro de 2010, José Sócrates visitou a Líbia quatro vezes. E até deixou que Kadhafi armasse a sua tenda de campanha no forte de São Julião da Barra, durante a segunda cimeira União Europeia-África, que decorreu em Lisboa, em dezembro de 2007. Enquanto os media e a opinião pública se entretinham com as extravagâncias do líder magrebino, o Governo português tratava de “lançar a rede” aos fundos de investimento, ao gás natural e ao petróleo líbios. Já Ricardo Salgado ficou com uma cifra a ressoar nos ouvidos: 180 mil milhões de dólares. O valor dos fundos soberanos que a Líbia prometia despender entre 2008 e 2010.
Ricardo Salgado não perdeu tempo e soltou os seus “batedores” de confiança no terreno. A 11, 12 e 18 de dezembro de 2008, o banqueiro recebeu no seu gabinete Alexandre Barreto, referenciado no processo-crime Universo Espírito Santo como “uma espécie de ministro dos Negócios Estrangeiros” ao serviço do presidente do BES.
O “diplomata” do banqueiro trazia notícias do Norte de África, recolhidas através do seu “colega e amigo” Fernando Costa Freire. O antigo conselheiro diplomático de Durão Barroso, e funcionário da ONU nos governos de Cavaco Silva, contou que tinha “um contacto no fundo soberano da Líbia que poderia ter interesse como potencial investidor no GES”, revelou Alexandre Barreto ao Expresso.
Desde 11 de dezembro de 2008, Costa Freire aparece referenciado 68 vezes na agenda de Ricardo Salgado. E logo na primeira oportunidade, o antigo conselheiro de Durão Barroso terá posto em cima da secretária do banqueiro uma “toupeira” capaz de escavar o túnel dos dinheiros líbios: Farhat Bengdara, à data governador do Banco Central da Líbia e atual presidente da poderosa Libyan National Oil Corporation.
Público - "Ministério Público: como chegámos aqui?"
Por estes dias, tenho sido abordada para me pronunciar em televisões sobre as adjacências processuais, jurídicas e políticas do caso que vem preenchendo os espaços da comunicação social e que deixou os cidadãos perplexos. Não aceito, pois não posso falar com total liberdade. Já os sindicalistas desfrutam desse privilégio e temos-lhes escutado afirmações controversas, cínicas no dizer de alguém.
Como foi possível acontecer tudo aquilo a que assistimos há duas semanas? Como se chegou até à tomada de decisões que provocaram uma monumental crise política e cujas consequências vão ainda no adro? Uma coisa é certa: ver um certo político populista de extrema-direita monopolizar a defesa da atuação do MP, dá muito que pensar! Outros haverá que resguardaram o regozijo da crise por entre dentes e aguardam a sua oportunidade num silêncio de marketing.
O meu colega António Cluny escreveu um interessante artigo de opinião, onde destaca a atuação individual de cada procurador no despacho de inquéritos criminais, pelo que considera errado que o jornalismo se refira coletivamente ao MP como “autor” das decisões agora controvertidas. Conclui que a sua experiência na Eurojust lhe permitiu confirmar a necessidade de uma coordenação forte e ágil, por procuradores com legitimidade e experiência, sem o que não haverá sucesso na luta contra a criminalidade atual.
Originalmente, o MP foi concebido como um corpo hierarquizado piramidal, para representar o Estado nos tribunais, tendo no topo o procurador-geral da República, que dirigia, coordenava, determinava e dava instruções, plasmadas em diretivas. De permeio, entre o procurador-geral da República e os procuradores da base, a organização hierárquica é regionalista, coincidindo com os quatro tribunais da Relação. Desde há décadas, paulatina e persistentemente, o sindicato (SMMP) lançou e insistiu numa reivindicação de maior autonomia individual dos procuradores nas decisões que tomassem, em todas as áreas de intervenção, mas e sobretudo na investigação criminal. O que se pretendia era que cada procurador conduzisse os processos-crime sem interferências, ao seu grado, exigência que tem subjacente e camuflada uma desconfiança relativamente às hierarquias intermédias e superiores, a meu ver injusta e infundada. Porque há-de ser mais “autónomo” e idóneo um procurador da base do que um de topo? Desde logo, como em todas as profissões, há a excelência, a mediania e o sofrível, pelo que se impunha a supervisão do que fosse mais relevante.
Noutros estados europeus avançados, vigoram modelos interventivos diferentes. A gama é variada.
Na Itália dos anos 1980/90, como os leitores recordarão, a atuação autónoma dos procuradores era de tal ordem que começou a criar graves problemas de desestabilização e até de oportunismo político, com os resultados que se conhecem. Foi necessário introduzir normas de equilíbrio, ali por via de regulamentação interna.
Não há muito tempo, no processo do caso Tancos, quem investigava (DCIAP) pretendia inquirir como testemunhas o Presidente da República e o primeiro-ministro. O então diretor daquele departamento opôs-se e impediu tal diligência, por entendê-la inútil, tendo fundamentado a sua decisão num despacho próprio que entendeu dever ficar arquivado à parte. Gerou-se grande sururu dentro da corporação; sindicalistas clamavam que esse despacho tinha de ficar visível no próprio inquérito, outros que não, que podia ficar guardado no que chamamos “dossier de acompanhamento”, como acabou por acontecer. No fim, o desfecho do processo demonstrou que o hierarca tinha razão quanto à inutilidade de inquirir as duas altas figuras do Estado.
Acontece haver quem entenda a investigação criminal como uma extensão de poder sobre outros poderes, sobretudo os de natureza política. Daí que sejamos surpreendidos, de vez em quando, com buscas cuja utilidade e necessidade é nenhuma, pese embora quem as promove sempre se escude no argumento de opacidade: “Eu é que sei o que está no processo, eu é que sei se são necessárias ou não!” E a sorte é que até há pouco tempo o DCIAP dispunha de um tribunal de instrução privativo, com um juiz de instrução igualmente privativo por ser o único durante largos anos. O perfil decisório desse JIC era conhecido, não há constância de contrariedade ao MP. Maus hábitos.
Já noutra frente, a frase que não saía da boca de sindicalistas e de certas responsáveis máximas do MP era o “reforçar da autonomia interna” dos procuradores, empenho bem-sucedido, pois a autonomia não só foi reforçada, como até calafetada!
As personagens aludidas granjearam assim a simpatia e até quase camaradagem (em congressos) de certo jornalismo que segue as peripécias da corrupção atribuída a políticos e que tem a militância de deixar Portugal bem colocado nos rankings internacionais da percepção desse flagelo.
Desta sorte, procuradores que não hesitem em meios de recolha de prova intrusivos, humilhantes, necessários ou não, são o top da competência! Outros magistrados de elevado escalão que seguem esta linha argumentativa e a verbalizando no discurso público também têm o elogio garantido. Pelo contrário, quem se opõe à estridência processual é rotulado protetor dos corruptos! Neste enquadramento e sendo a nossa dimensão quase paroquial, poucos têm pulso para impor o que deve ser a sensatez, a escorreita interpretação jurídica dos factos, o respeito pelos direitos fundamentais dos cidadãos suspeitos, a investigação célere.
Em todos os departamentos de investigação e ação penal, mas mormente no DCIAP, deveria privilegiar-se o pensamento crítico, a discussão interdisciplinar, nomeadamente com colegas de outras jurisdições tocantes ou conexas; temo que se tornem cabines herméticas, onde pontuam algumas prima donnas intocáveis e inamovíveis e onde a “falta de meios”, de peritos disto e daquilo é sempre a velha razão para os passos de tartaruga a que se movem as investigações.
Permitiu-se a criação de uma bruma de auto-suficiência totalmente nefasta e contrária ao que deve ser a qualidade e a excelência desta profissão; os desfechos de vários casos já julgados permitem extrair que há aspectos do trabalho dos procuradores de investigação a carecer revisão e aprimoramento pelo exercício da autocrítica.
Uma investigação bem feita e fundada em provas irrefutáveis conduz a uma acusação de boa síntese factual e melhor incriminação nos tipos de ilícito aplicáveis ao caso. Um julgamento com esta base acusatória corre rápido e permite a quem julga uma decisão célere e bem fundamentada.
Não resisto e exemplificar, por curiosidade, o que deve ser a ponderação de conceitos no crime de recebimento indevido de vantagem, que tem como elemento objetivo nuclear o recebimento de uma vantagem patrimonial ou não patrimonial indevida.
O conceito de “vantagem patrimonial” não oferece qualquer dúvida interpretativa: é um acréscimo de património. Já a vantagem “não patrimonial” é de mais difícil recorte, podendo ser uma vantagem social. Assim, a oferta de um almoço num restaurante caro será uma vantagem? Em que se traduz essa vantagem? No prazer da degustação? E se o agente não apreciou a refeição, quid iuris? (Publico, texto de opinião da magistrado Maria José Fernandes, Procuradora Geral Adjunta, 19.11.2023, com a devida vénia)
Público - “Malhar” no Ministério Público
Sem espanto, a Operação Influencer detonou uma explosão política, com estilhaços em ricochete para o Ministério Público (MP). Entre interrogações legítimas, intervenções cínicas e cortinas de fumo, vale a pena esmiuçar algumas dúvidas que circulam por aí, à luz do senso comum e da lei; não dos interesses partidários.
Primeira: o MP pode investigar o primeiro-ministro? Assim que tomar conhecimento da “notícia de um crime” (é assim que a lei lhe chama), não só pode como tem de abrir um inquérito para confirmar ou afastar a suspeita. O indício inicial não precisa ser “forte”, basta que seja plausível e justifique razoavelmente uma investigação. O argumento circular, segundo o qual o primeiro-ministro só pode ser investigado se, logo no momento da primeira suspeita, houver uma quase-certeza de que se vai chegar ao fim com prova para acusar, não tem sentido. É óbvio que, para poder concluir alguma coisa, o MP precisa de investigar primeiro. Aliás, se não abrir inquérito por razões de oportunidade política, poderá até haver crime de denegação de justiça.
Segunda: quem investiga o primeiro-ministro? Talvez por desconhecimento, diz-se que o primeiro-ministro está a ser investigado no Supremo Tribunal de Justiça. Isso é confundir o órgão jurisdicional “tribunal”, composto por juízes, com o edifício do Terreiro do Paço, onde também está instalado um “departamento do MP”, composto por procuradores-gerais adjuntos. Os juízes não conduzem inquéritos criminais. Quem trata disso são os procuradores do MP. Os juízes apenas intervêm nos inquéritos para autorizar certos actos que afectam direitos fundamentais. Mais adiante, se houver acusação, aí, sim, será aberto um processo judicial, num tribunal, conduzido e decidido por juízes.
Terceira: e o parágrafo? É muito curioso dizer-se que o primeiro-ministro se demitiu por causa de meia dúzia de linhas no comunicado da procuradora-geral da República. O tal parágrafo dizia que foi aberto inquérito contra o primeiro-ministro relacionado com uma investigação a pessoas que lhe são próximas e membros do seu Governo. Sem que a lei obrigasse, o primeiro-ministro entendeu demitir-se por imperativo de consciência. E a culpa, acusam agora alguns, é do MP. Mas então era suposto que a procuradora-geral da República fizesse o quê? Omitia aquele esclarecimento público para ser depois acusada de esconder informação relevante para beneficiar o Governo e o PS? Ou, melhor ainda, mandava arquivar o inquérito, independentemente do que lá estivesse, para poupar o país a uma crise política?
Quarta: a montanha pariu um rato? O facto de o juiz de instrução não ter validado a indiciação por todos os crimes nem ter decretado prisões preventivas é, dizem uns, a prova da incompetência do MP; ou da cabala, segundo outros. Grande equívoco. A decisão judicial em causa, além de poder ser revertida em recurso, limitou-se a verificar se existiam os indícios de crimes e as razões cautelares invocadas pelo MP, apenas para efeitos da aplicação de medidas de coacção. A avaliação global da suficiência dos indícios para levar alguém a julgamento só ocorrerá se e quando houver uma acusação. De resto, considerar que a indiciação de quatro pessoas por crimes de oferta indevida de vantagens e de tráfico de influência é uma minudência tem muito que se lhe diga.
Já agora, há outra “ninharia” de que não se fala. Em 29 de Março de 2022 entrou em vigor o artigo 18.º-A da Lei 52/2019, que pune com prisão de um a cinco anos o crime de ocultação intencional de património, para quem, estando sujeito às obrigações declarativas, estiver na posse de dinheiro intencionalmente escondido que devesse ter declarado. Convém ir lendo o Diário da República.
Quinta: influenciar decisões políticas é apenas lobbying? O que interessa é saber se o interesse público foi salvaguardado? Como se “meter cunhas” fosse coisa pouca. A lei é clara. Influenciar o processo de decisão pública para obter um resultado ilícito a troco de vantagens não devidas é crime. Tecnicamente, não é corrupção, mas anda lá perto. A incriminação desses comportamentos corresponde, além do mais, a uma obrigação de Portugal, por força de convenções internacionais que assinou. O lobbying é outra coisa. Não vale a pena mistificar a realidade.
Com estas dúvidas, quem, como eu, apenas souber o que aparece na imprensa achará, no mínimo, precipitado começar já a “malhar” forte e feio no MP. Sobretudo se, atrás disso, se esconder a intenção, muito perigosa, de querer aproveitar um eventual percalço do MP para se passar a controlar politicamente a sua acção.
O reparo final: uma advocacia digna não diz, com ar de conversa de salão, que o presidente do Supremo Tribunal de Justiça faz “conversa de tasca”. Isso é impróprio e impõe um pedido de desculpa (Publico, texto de opinião do magistrado Manuel Soares, Presidente da Direcção da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, 22.11.2023, com a devida vénia)
Público - "O nacionalismo volta a ameaçar a Europa"
1. Viktor Orbán quis ser o primeiro dirigente europeu a saudar a vitória de Geert Wilders nas eleições legislativas dos Países Baixos. Telefonou-lhe para celebrar o verdadeiro “tremor de terra” eleitoral que provocou. “O vento da mudança está a soprar”, escreveu na rede social X. Não foi o único. A extrema-direita europeia já deixou de viver há muito nas franjas das democracias liberais para se transformar numa força política que disputa directamente o poder. Que já faz parte das soluções governativas em vários países da União Europeia.
Giorgia Meloni, cujo partido nasceu da herança das forças pós-fascistas italianas, lidera a Itália em coligação com a extrema-direita de Matteo Salvini. Os Democratas Suecos e os Verdadeiros Finlandeses fazem parte das coligações parlamentares que apoiam os governos de Estocolmo e de Helsínquia. Marine Le Pen é o maior partido da oposição ao Presidente Macron, na Assembleia Nacional Francesa, e a sua Reunião Nacional lidera de longe todas as sondagens. As mesmas que colocam persistentemente a Alternativa para a Alemanha (AfD) em segundo lugar, atrás da CDU/CSU e à frente dos sociais-democratas de Olaf Scholz, dos Verdes e dos Liberais da actual “grande coligação”. Em Espanha, o Vox perdeu alguns deputados nas últimas eleições, mas esteve à beira de entrar no Governo de Madrid, coligado com o Partido Popular, o que só não aconteceu porque Pedro Sánchez conseguiu evitá-lo, mesmo que através de alianças polémicas com partidos independentistas.
2. Na sexta-feira, num encontro do grupo “Identidade e Democracia” do Parlamento Europeu, Marine Le Pen, sentada à direita de André Ventura numa sala do Parlamento português, disse com todas as letras que é contra a União Europeia precisamente “porque defende a Europa”. À esquerda de Ventura sentava-se o líder da AfD, ferozmente xenófobo e antieuropeu. O que é a Europa deles? A mesma Europa que Wilders defende – branca, cristã, construída por nações soberanas, donas das suas fronteiras e das suas próprias leis, contra a Europa que nasceu dos escombros da segunda “guerra civil” europeia a partir de uma simples ideia fundadora: a rejeição do nacionalismo através da partilha dos mesmos valores políticos da democracia, do liberalismo, dos direitos humanos, da soberania. E que garantiu o mais longo período de paz e de prosperidade que a Europa jamais viveu. Foi preciso que uma vaga democrática varresse as ditaduras nacionalistas que dominavam Portugal, Espanha e Grécia, na década de 1970, para lhes abrir as suas portas. Depois da implosão da União Soviética, a mesma vaga democrática afastou os regimes comunistas dos países da sua metade leste, abrindo-lhes o caminho da adesão. É de novo para defender a democracia e a liberdade que a União Europeia apoia a Ucrânia contra o nacionalismo expansionista e agressivo do regime de Moscovo.
O nacionalismo de Wilders, Orbán, Robert Fico, Le Pen ou Salvini está na origem da sua defesa, mais ou menos assumida, de Vladimir Putin. A sua “guerra” é contra aqueles que ameaçam uma mítica Europa cristã e etnicamente pura. A sua arma política é convencer os europeus “de origem” de que acabarão por ser “substituídos” por uma nova maioria vinda de fora, com outra cor de pele, outra religião e outra cultura – a chamada “teoria da grande substituição”. O mesmo conjunto de ideias que continua a alimentar os republicanos de Donald Trump.
3. Os partidos nacionalistas e populistas que hoje ocupam um espaço cada vez maior na generalidade dos países da União Europeia não se apresentam como antidemocráticos, como aconteceu na Europa dos anos 1930. Ganham força política e chegam ao poder através de eleições livres e justas. Mas basta observar o que aconteceu na Hungria nos últimos dez anos para entender, para lá de qualquer dúvida, que o seu objectivo é destruir a democracia liberal. Servem-se do poder para anular a independência dos tribunais, limitar drasticamente a liberdade de expressão, calar os media, asfixiar legalmente os partidos da oposição, distorcer a concorrência dos mercados, alterar as Constituições para enfraquecer os direitos dos indivíduos em nome do interesse nacional. A Hungria é já hoje um regime autoritário. Podem ser distintos de país para país, mas não tenhamos dúvidas de que o nacionalismo étnico que defendem tem as suas raízes na mesma rejeição dos fundamentos da democracia liberal. Não é uma questão de propostas diferentes para problemas comuns. É muito mais do que isso.
4. Estão a ganhar terreno porque estão a conseguir “normalizar” as suas bandeiras políticas. Ocupam o espaço que os partidos democráticos do centro político deixaram vago pela falta de respostas convincentes aos problemas que se colocam às sociedades desenvolvidas – a dificuldade de integrar os imigrantes, mas também de combater as desigualdades crescentes que nasceram do neoliberalismo, da globalização sem regras, da perda de estatuto das classes médias, da incompreensão dos medos e dos ressentimentos de muita gente, do crescente distanciamento de elites que se foram tornando cada vez mais distantes e cosmopolitas, os “passageiros frequentes”, na feliz designação do sociólogo alemão Wolfgang Merkel, ou do “politicamente correcto” que, mesmo podendo ser correcto, não levava em conta as percepções de uma parte maioritária da população.
O perigo maior está em que o centro-direita está a ceder à tentação de mimetizar parte do seu discurso e das suas bandeiras, nomeadamente as que fazem dos imigrantes a origem de quase todos os males. Na Alemanha e na França, a CDU/CSU pós-Merkel e os Republicanos viraram à direita. A sucessora de Mark Rutte à frente dos liberais holandeses, por sinal uma refugiada turca, prometeu endurecer as leis migratórias e de asilo. Não quer dizer que essas leis não possam ou não devam ser revistas. Quer dizer que os partidos centrais perderam a iniciativa, deixando-se ir a reboque de soluções xenófobas e racistas que não deviam nem podiam aceitar. “Evitar a questão da imigração e do asilo quando está no topo das preocupações dos eleitores não é uma solução”, escreve o Monde em editorial. “Mas deixar a extrema-direita fixar os termos do debate e acabar por alinhar pelas suas posições também não é.”
O centro-esquerda também ainda não encontrou respostas para um conjunto de problemas novos e velhos. Porque, na União Europeia, não conseguiu encontrar alternativas à visão alemã do funcionamento da moeda única, que levou à resposta “austeritária” à crise financeira de 2008 com as consequências que conhecemos. Porque está ainda longe de conceber um programa económico que seja diferente da mera submissão à lógica dos mercados globais e da competição entre os países europeus com uma dimensão social que responda aos problemas concretos das pessoas concretas. Talvez devesse olhar com mais atenção para a agenda interna de Joe Biden. Só o conseguirá se o fizer a nível europeu. Fá-lo-á em circunstâncias difíceis. Perde terreno em quase todos os países, com a excepção ibérica.
Mas, em primeiro lugar, o centro moderado está a perder terreno porque aceitou a lógica de radicalização própria dos extremos, cortando as pontes que unem a esquerda e a direita.
5. A velha ideia, a que tanta gente se agarrou durante tanto tempo, de que esta vaga nacionalista seria facilmente contida e acabaria por recuar é negada pelos factos todos os dias. A vitória do partido nacionalista, xenófobo e antieuropeu de Wilders numa democracia fundadora da União Europeia, liberal, aberta, tolerante e rica é, de facto, um “tremor de terra” cuja escala se arrisca a causar danos sérios no próprio edifício europeu.
Wilders quer um referendo para decidir sobre o “Nexit”. Como o “Brexit”. Tal como Orbán, promete suspender imediatamente qualquer apoio a Kiev. “A reunião dos chefes de Estado e de Governo prevista para 14 e 15 de Dezembro será um primeiro teste”, escreve também o Monde. O Conselho Europeu terá de aprovar o início das negociações de adesão da Ucrânia e rever o orçamento anual da União para integrar um apoio de 50 mil milhões de euros a Kiev até 2027. O outro debate urgente é sobre uma hipotética vitória de Trump nas presidenciais americanas. Wilders é conhecido como o “Trump holandês”. Orbán é um seu devotado seguidor.
O nacionalismo volta a ameaçar a Europa. Combatê-lo em todas as suas dimensões é cada vez mais urgente. O século XX ensinou-nos quais são as suas consequências (Publico, texto de opinião da jornalista Teresa de Sousa, 26.112.2023, com a devida vénia)