Estudo do ISCTE-ICS mostra recorde de decisão na última hora. Há 6% de eleitores PS arrependidos, mas são mais no PSD e BE. Nos últimos 20 anos, desde que há registo de estudos pós-eleitorais, nunca os portugueses guardaram tanto para o último dia a sua decisão quanto ao sentido de voto: foram 14% nestas últimas eleições, um valor que ganha peso se comparado com as anteriores legislativas. Até agora, o recorde tinha sido registado em 2005, quando 8% decidiram à última hora em quem votar, e desde então que a percentagem vinha a descer: foi de 3% em 2011 e de 5% em 2015. Estes são dados do estudo feito pelo Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (ICS-ULisboa) e do ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL) para o Expresso e SIC e que tem por base uma sondagem cujo trabalho de campo decorreu entre os dias 11 de fevereiro e 7 de março de 2022 — com trabalho de campo realizado pela GfK Metris. Agora, como nessa ida eleição de 2005, a decisão à última hora favoreceu o PS. Ao que conta o relatório do estudo, 28% dos que afirmam ter decidido no próprio dia da eleição votaram no PS, quase três vezes mais do que os que votaram no PSD (11%), e muito acima dos 6% que escolheram o Chega, 5% o BE, 3% a CDU e 2% a IL. Ao todo, 9% dos votos que o PS teve (mais de 2,3 milhões) terão sido de indecisos até à última hora, sem eles não haveria maioria absoluta.
Mas a maioria do PS acabou por ser uma surpresa na noite das eleições. E conhecidos os resultados, como olham os portugueses para o seu voto? 87% dos que votaram no partido de António Costa dizem-se satisfeitos com o resultado, mas 12% dos eleitores do PS assumem-se desagradados — sendo que metade (6%) mostra insatisfação com o próprio voto. Soubessem que haveria maioria, provavelmente Costa não teria o seu voto (e podia não chegar ao seu objetivo).
Sem surpresa, os mais desencantados com a maioria socialista são os que votaram noutros partidos — entre esses, são os da CDU quem menos desaprova a maioria absoluta socialista e, mesmo assim, apenas 8% se dizem conformados com o resultado (vs. 6% dos eleitores do BE). Mas é quando a pergunta mede o arrependimento com o próprio voto que aparecem mais surpresas: são arrependidos 31% dos eleitores do PSD, 30% dos do BE e 28% dos da CDU. Estes serão os partidos, doravante, com mais riscos de voltarem a perder eleitores.
12% de eleitores do PS assumem que não queriam uma maioria, mas só 6% se mostram arrependidos do seu voto
E agora? Agora a questão é a quem cabe o papel de monitorizar a ação do Governo que Costa apresentou esta semana ao país. Entre os inquiridos, 39% consideram que esse é um papel a ser desempenhado pela Presidência da República, seguindo-se um empate a 21 pontos, entre os que depositam a responsabilidade nos restantes partidos e no Tribunal Constitucional. Ao fundo, surge a imprensa com 1% das respostas. Sem diferenças de relevo entre sexo, idade ou grau de instrução entre os que apontam ao Presidente da República como o fiel da balança entre os poderes, um número salta à vista. São os simpatizantes do PS (44%), em oposição aos do PSD (39%), quem deposita maior fé em Marcelo Rebelo de Sousa. Sinal de desejo de convivência pacífica entre Belém e São Bento?
Quanto a Costa e ao seu Governo, se restassem dúvidas quanto à avaliação positiva que o eleitorado nacional faz sobre o seu desempenho, passados dois meses das eleições continua a colher uma avaliação positiva entre os inquiridos: 59% consideraram como “bom” e outros 6% como “muito bom” o desempenho do Governo de Costa, contra apenas 28% de opinião contrária quanto aos últimos dois anos.
AFINAL, O QUE INFLUENCIOU O VOTO?
Com um recorde de indecisos até ao último dia, que fatores influenciaram os portugueses nas legislativas? O estudo do ICS-ISCTE mostra que os debates televisivos entre líderes ajudaram 7% a decidir o voto e a campanha eleitoral 9%, sendo que foi no escalão entre os 25 e os 44 anos que se encontraram menos votos definidos (58%) antes de os partidos sequer arrancarem para a estrada.
No extremo oposto, com 75% dos votos já definidos, os eleitores mais velhos, com mais de 65 anos, estiveram imunes aos alarido das campanhas. Olhando para os eleitores de acordo com a escolaridade a tendência é clara — quanto mais a instrução, mais tarde é tomada a decisão quanto ao voto. E na divisão entre esquerda e direita política, são os de esquerda quem mais dobrou o boletim sem esperar pela campanha. E no campeonato da fidelidade, quem ganhou? Por muito, a CDU cuja esmagadora maioria do eleitorado (86%) a parecer imune a arruadas e debates. Depois surgiu o PS, com 80% dos eleitores decididos a mais de um mês da ida às urnas, PSD (70%) e Chega (52%).
No extremo oposto, com os eleitorados mais indecisos, destacaram-se IL e BE, respetivamente, com apenas 34% e 47% dos votos assegurados a mais de um mês das eleições. Os liberais foram em crescendo com a campanha, o BE em perda — mas ainda assim podiam ter tido uma débâcle maior, visto que 23% dos seus votos foram apanhados na reta final (5% do total dos votos de último dia).
Com a televisão a ser o meio preferido para o consumo de notícias em período eleitoral e 58% dos inquiridos a assumirem o consumo frequente de notícias sobre partidos e candidatos, apenas 27% se confessaram bastante ou muito atentos (11%) às sondagens. E desses, a ideia que ficou foi de divisão das perceções: 28% viram nelas que tudo estava num empate entre PS e PSD (28%), 30% que já anunciavam uma vitória folgada do PS (30%). Contas feitas agora, passados dois meses da votação, 83% dizem-se satisfeitos com o seu voto e 16% arrependidos da escolha (Expresso, texto do jornalista Filipe Garcia)
Sem comentários:
Enviar um comentário