Passos já não esconde desilusão com incapacidade reformista do atual Governo. Adversários veem novas críticas como vontade de condicionar futuro pós-Montenegro. Mas há quem desvalorize. "Nada mudou." Pedro Passos Coelho anda por aí. Para onde vai e o que verdadeiramente quer, ninguém arrisca dizer. Os mais próximos garantem que é só um “homem livre” a dizer o que pensa, sem qualquer agenda secreta. Os adversários internos (ou, pelo menos, os mais céticos) advinham-lhe intenções de se posicionar para um futuro pós-Luís Montenegro. Num ponto, todos concordam: continua a ser suficientemente apelativo (para uns) e incómodo (para outros) para ser ignorado.
Ao Observador, fonte próxima de Pedro Passos Coelho garante que “nada”
se alterou e que o antigo primeiro-ministro continuará a aparecer no espaço
público independentemente das “teorias conspirativas” que se construam sobre os
seus planos. Está fora da política ativa e assim permanecerá, ainda que
preservando sempre os seus direitos de intervenção na vida pública. “Não vale a
pena perder tempo com esse assunto”, despacha a mesma fonte. Em breve, sabe o
Observador, Passos assinará o prefácio do livro de Carlos Carreiras, agora
ex-presidente da Câmara Municipal de Cascais, e participará no evento
“Encontros improváveis: Conversas com Fé”, a 16 de novembro.
“Está a posicionar-se para o futuro pós-Luís Montenegro. Parece-me óbvio”, contrapõe ao Observador fonte próxima do atual primeiro-ministro. Mesmo que o calendário seja complexo, a lógica é relativamente simples: toda a atual e futura geração de quadros do PSD foi cooptada pelo montenegrismo, está dentro do Governo ou orbita em torno dele; quando se der uma mudança de ciclo, e mudança, em política, é sempre inevitável, Pedro Passos Coelho estará sozinho no campo da alternativa. Mais: como em qualquer transição de poder no PSD, será feita em rutura com a linha dominante.
Conspiração ou não, o certo é que um bater de asas de Passos tem
conseguido provocar pequenos tornados em várias latitudes políticas. Foi assim
quando apareceu (por duas vezes) ao lado de Marco Almeida, na corrida a Sintra,
foi assim quando apareceu ao lado de Suzana Garcia, na Amadora, e foi assim
quando não apareceu ao lado de Carlos Moedas, em Lisboa, num sinal inequívoco
de que o primeiro-ministro não morre de amores pelo presidente da Câmara de
Lisboa. Já tinha feito estragos quando, em declarações ao Expresso, sugeriu que
não vai apoiar Luís Marques Mendes, e, mais recentemente, na apresentação do
livro de Miguel Morgado, o seu verdadeiro delfim, fez um verdadeiro ajuste de
contas com António Costa e a sua política de imigração.
Tudo isto num par de semanas, intensidade estranha para quem vinha a
gerir com parcimónia as suas participações públicas. Mas o que disse na sua
mais recente aparição, no Congresso Internacional do Cooperativismo, pertence a
outra categoria. Pela primeira vez, o antigo primeiro-ministro atingiu em cheio
Luís Montenegro e sugeriu publicamente que o seu sucessor, com quem cortou há
um par de anos, estava a ser pouco mais do que um António Costa aditivado. Quem
conhece Pedro Passos Coelho não ficou exatamente surpreendido, porque sabe que
esta é há muito a opinião do próprio; o que impressionou mais o universo
social-democrata foi a violência com que o disse publicamente.
Fonte próxima de Passos garante que “nada” se alterou e que continuará a
aparecer no espaço público independentemente das “teorias conspirativas” que se
construam sobre os seus planos. “Está a posicionar-se para o futuro pós-Luís
Montenegro. Parece-me óbvio”, sinaliza ao Observador fonte próxima do atual
primeiro-ministro.
Em rigor, Pedro Passos Coelho já tinha sinalizado a disponibilidade para
pegar no partido logo a seguir às eleições europeias. Na altura, perspetiva-se
a saída sem honra nem glória de Luís Montenegro, a quem muitos vaticinavam um
fim precoce. Mas a queda de António Costa precipitou o calendário político e
fez de Montenegro primeiro-ministro, primeiro pela margem mínima, depois por
números redondos. A janela de oportunidade parecia ter-se fechado para Pedro
Passos Coelho.
Em condições normais, olhando para o histórico de eleições legislativas
em Portugal, Luís Montenegro deverá ter um ciclo longo de poder pela frente —
só dois chefes de governo perderam eleições em Portugal, Pedro Santana Lopes
(2005) e José Sócrates (2011). Um ciclo longo de Montenegro não joga a favor de
Pedro Passos Coelho, que teria 71 anos em 2033 — seria caso único na democracia
portuguesa, mas não necessariamente no resto do mundo. Mas não é exatamente
impossível. “Veja-se Donald Trump“, assinala um influente social-democrata.
Ainda assim, se Passos estivesse de facto apostado em suceder a Luís
Montenegro num horizonte de tempo mais razoável, teria de esperar que o próprio
deitasse a toalha ao chão (como fez António Guterres, em 2001) ou se afastasse
em virtude de um escândalo (como aconteceu com António Costa, em 2023). Ora, se
o primeiro cenário parece inverosímil, o segundo nem por isso: continua a
pender sobre Luís Montenegro a ameaça de uma abertura de inquérito por parte
Ministério Público no âmbito do caso “Spinumviva”. No passado, o próprio já
disse que não se demitirá se for constituído arguido, mas a realidade pode
trazer outros quinhentos.
Quem conhece o antigo primeiro-ministro jura a pés juntos que não está a jogar com esse calendário. Nem com nenhum, na verdade. “Está só a dizer que o rei vai nu. O dinheiro está-se a acabar”, sugere uma fonte próxima. Em grande medida, foi isso que Pedro Passos Coelho disse quando apareceu no almoço de Montenegro na campanha das últimas legislativas e que agora repetiu na última intervenção que fez: “Chegou o fim das margens de manobra que permitem ir adiando decisões importantes. Todo o dinheiro que é distribuído no dia-a-dia está distribuído, está gasto“ (Observador, texto do jornalista Miguel Santos Carrapatoso)

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