"Estou
convencido de que o discurso feito ontem por Passos Coelho, caso tivesse sido
há dois anos, não produziria a enorme rejeição e até violência verbal com que
tem vindo a ser recebido. Poderia até ser saudado por muitos setores da
sociedade. Há dois anos a equiparação dos funcionários públicos aos privados, o
apelo ao consenso e a ideia de que as medidas estão em aberto e poderiam ser
discutidas seriam percecionadas pela maioria dos portugueses como positivas.
O
problema é que há dois anos Passos não gerava a desconfiança que hoje gera. Há
dois anos, não tinha havido o colossal aumento de impostos, a taxa de
desemprego não rondava os 20 por cento, os colossais falhanços de previsão de
Vítor Gaspar não existiam. Há dois anos o Governo não estava dividido e o PS
não podia virar pura e simplesmente as costas a uma proposta de compromisso.
Hoje tudo é demasiado tarde.
Apesar de as medidas anunciadas serem o que já se sabia e produzirem
tecnicamente um corte efetivo (e não temporário) na despesa do Estado, aliás, o
primeiro grande corte na despesa, já ninguém acredita que este caminho não crie
mais desânimo, quebra do consumo e recessão. O problema não é a medida, porque
não haverá equilíbrio das contas sem haver cortes na despesa do Estado (e a
maioria da despesa do Estado são salários e prestações sociais). O problema é
que quem propõe já não consegue convencer ninguém. A liderança do Governo
tornou-se um problema para o país" (texto de Henrique Monteiro, Expresso com
a devida vénia)