Escreve
a jornalista do Económico, Inês David Bastos que as "críticas dos barões social democratas a
Passos crescem dia após dia. Aparelho está a segurar o líder mas autárquicas
podem levar à crise. "O
PSD está desanimado [com a governação de Passos] e o próprio aparelho um dia
vai reagir e as autárquicas podem ser esse teste". As duras palavras do
histórico ministro do PSD Ângelo Correia, tido como o ‘padrinho' político de
Passos, espelham o sentimento que cada vez mais é transversal no partido:
desagrado face à liderança de Passos, quer no PSD, quer no Governo. Em
declarações ao Diário Económico, Ângelo Correia, um dos únicos históricos que
esteve ao lado de Passos na sua ascensão, vem agora dizer que o
primeiro-ministro "falhou no foco" e na estratégia desde o início,
apoiando a critica feita também ontem por Eduardo Catroga: o Executivo
"falhou". É entre os notáveis que a oposição a Passos mais se tem
manifestado. Nomes como Manuela Ferreira Leite, Santana Lopes, Marcelo Rebelo
de Sousa (ex-líderes), Rui Rio, António Capucho ou Mira Amaral têm vindo a terreiro
lançar alertas e críticas. O desagrado tem vindo em crescendo e já começa a ser
manifestado nas bases do PSD, com Passos a ficar cada vez mais isolado no
partido. E até no Governo. O apoio incondicional a Gaspar e a insistência em
algumas medidas (como aconteceu na TSU) e numa agenda mais ideológica têm
afastado Passos daquele que era, há dois anos, o seu núcleo duro no Executivo:
Miguel Macedo e Paula Teixeira da Cruz. Até de Miguel Relvas, que o lançou para
a liderança e ‘controla' o aparelho, Passos se foi distanciando e o ex-ministro
acabou por ser forçado a sair do Governo num ambiente tenso com o presidente do
PSD.
Até
notáveis que sempre tentaram poupar o primeiro-ministro ou suavizar críticas
começam agora a endurecer o discurso. Ontem, além de Ângelo Correia, foi
Eduardo Catroga quem veio assumir (em entrevista à RR) que Passos
"falhou" porque devia ter apresentado o corte permanente na despesa
logo no início do mandato. Em declarações ao Diário Económico, o politólogo
António Costa Pinto admite que "a popularidade de Passos no interior do partido
começa a complicar-se" Autárquicas
vão ser um teste Marques Mendes já chegou a dizer que o Governo "está
paralisado e em fim de ciclo" e António Capucho acrescenta ao Diário
Económico que a liderança de Passos "está por pinças". Isto é,
explica o ex-secretário-geral do partido, "o PSD é hoje um somatório de
pequenas oligarquias concelhias e distritais" que "estão a segurar
Passos".
O
histórico do PSD Pacheco Pereira confirma que há um sector do partido que tem
"carreiras profissionalizantes nas estruturas partidárias e do
Estado" e que mantém Passos, o que faz com que as críticas dos notáveis
tenham mais peso mediático (e de influência) na sociedade do que no partido.
Mas também deixa claro que as autárquicas podem trazer_"agitação". Ângelo
Correia concorda que é parte do aparelho que segura o líder, mas discorda de
Pacheco Pereira sobre o relativo peso dos notáveis. E avisa: "ninguém tem
força no aparelho para controlar o estado de espírito" do partido. E este,
alerta sem concretizar, poderá dar voz à sua revolta caso se dê um desaire
eleitoral nas autárquicas deste ano. As eleições directas no PSD para eleger o
novo líder ocorrem em 2014, já depois das eleições locais e por ocasião da saída
da ‘troika' de Portugal. Desconhece-se ainda se Passos vai recandidatar-se.
Ontem, em declarações publicadas no jornal "i", o pai de Passos
Coelho revelava que o chefe do Governo "está morto" por sair do
Executivo.
António
Capucho revela que, perante o avolumar de críticas e contestação interna, tem
dúvidas de que o Governo cumpra o mandato até ao fim (2015). Também ontem, o
ex-ministro do PSD Mira Amaral reconheceu que Passos está com "um problema
de liderança política". Com a aproximação das autárquicas e a austeridade
sem abrandar, as distritais começam a rebelar-se e autarcas de renome como
Menezes demarcam-se do Governo.
Barões
descontentes com desvio da matriz social-democrata
O
facto de Passos ter tentado impor, para lá do memorando da ‘troika', uma agenda
liberal (ou "ultraliberal" como dizem alguns) está a ser o maior
ponto de tensão no partido. As críticas ao líder por se ter distanciado da
matriz social-democrata têm sido muitas e a ‘vaga de fundo' que se começa a
criar entre barões tem em grande parte origem nisto mesmo. "Está tudo
errado desde o início. Passos quis fazer uma revolução, quis um plano
ultraliberal para o país", critica Pacheco Pereira. O distanciamento de
Passos face ao PSD, a falta de diálogo com as bases (distritais estão cada vez
mais descontentes), a inabilidade na comunicação das medidas ao país e a
austeridade excessiva sem haver cortes nas despesas e estímulos à economia são
outros focos de tensão. Os barões não concordam com as estratégias seguidas.
Santana Lopes disse recentemente numa entrevista à ETV que há outros caminhos
que Passos podia escolher.
Manuela
Ferreira Leite (que ganhou o primeiro combate com Passos) tem sido uma das
principais vozes críticas deste Governo. Já acusou Passos de estar a
"destruir" o país, já o acusou de se calar perante a ‘troika' e de
impor demasiada austeridade. Marcelo Rebelo de Sousa disse que o Executivo
estava "fraquinho, fraquinho" e Marques Mendes avisou que Passos está
"paralisado". Rui Rio, desde sempre apontado como o
"desejável" sucessor, já disse que Passos tem que "dar mais
provas" no corte da despesa.
Quatro
perguntas a...António
Costa pinto - Politólogo
"Passos
começa a sofrer no interior do partido"
Professor
de Ciência Política, António Costa Pinto reconhece que os efeitos do programa
de assistência começam a pesar na popularidade de Passos Coelho dentro do
partido. Mas mais do que isso, Passos começa a gerar desagrado por se ter
afastado da matriz social-democrata, tentando ir além do memorando da ‘troika'.
Costa Pinto não acredita que se dê uma revolta no partido mas avisa que o PSD
tem a capacidade de gerar alternativas rápidas.
Eduardo
Catroga juntou a sua voz aos críticos dentro do PSD. Passos está mais isolado?
O
processo de ajustamento é muito duro em termos de consequências eleitorais para
o PSD. O que pode estar a falhar é a relação entre o primeiro-ministro e o
partido, porque o PSD tem a tendência para a governamentalização do partido.
Isto vem desde o tempo de Cavaco Silva, não é novo. Tendo em conta os
resultados do programa de assistência e a ausência de um projecto reformista,
Passos começa agora a sofrer mesmo no interior do partido. Mas o facto de
muitos notáveis se estarem a distanciar pode ser bom para o PSD, embora seja
mau para Passos Coelho.
Porquê?
Se
por um lado é mau para Passos Coelho porque a sua popularidade no interior do
partido começa a ser complicada, por outro o PSD sempre nos habituou a mudanças
rápidas de liderança, isto é, a ter sempre uma alternativa pensada.
E
isso já está a acontecer?
Parece-me
que neste momento uma revolta no partido seria complexo porque poria em causa o
próprio Governo. As autárquicas podem ser um teste, mas penso que só serão
feitas leituras nacionais se o desaire for muito grande, porque estas eleições
autárquicas acabam por ser muitas eleições locais.
A
agenda própria de Passos, que alguns social democratas dizem ser muito liberal,
é um factor de distanciamento de barões?
Passos
Coelho assumiu um modelo mais liberal do que era a característica do PSD. É
provável que haja uma reacção dos históricos do partido a isso. Mas também
considero que seja provável que nesta segunda fase Passos Coelho comece a fazer
um discurso em que vá diminuindo essa convicção de um projecto liberalizador
efectivo. Ele tentou de facto impor uma agenda mais liberal, para lá do
memorando da ‘troika' e o partido está a manifestar o seu desagrado porque quer
regressar à sua matriz social-democrata. Pelo menos, alguns dos sectores do
partido querem"