"Um pormenor
muito significativo da forma amadora e preguiçosa como se faz política em
Portugal é-nos dado por uma nota do Editorial da edição de ontem do Expresso.
Essa nota reafirma que certas conclusões do jornal são obtidas por trabalho
próprio e não através de fontes.
Em
causa está a notícia principal do semanário na passada semana: "Governo
corta 4% nos salários da Função Pública". Essa peça ocupando toda a
página 3 era assinada por dois jornalistas: João Silvestre e Rosa Pedroso Lima.
Curiosamente,
nesse sábado, partidos de oposição e centrais sindicais acusaram o Governo
de "plantar" notícias para aterrorizar os portugueses e para
testar as suas próprias políticas. E todo o debate se fez à volta desta
pretensa malfeitoria do Governo.
Qual
é a verdade? A verdade é que, sendo certo que muitas notícias já foram
"plantadas" por este e outros Governos, foi um jornalista (João
Silvestre) que chegou àquela conclusão. E chegou, porque sendo licenciado
em Economia, sabendo fazer contas e tendo acesso a todos os documentos que
todos os partidos e centrais tinham, porque eram públicos, fez o seu trabalho.
E concluiu que o corte é de 4%. Ou seja, o jornalista fez o trabalho que
partidos e sindicatos poderiam e deveriam ter feito e não fizeram.
Mas
o lado do Governo também tem que se lhe diga. O mesmo jornalista, na mesma
página, chega à conclusão que os cortes nas pensões anteriores a 2005 na Caixa
Geral de Aposentações serão de 11,1%. Este dado foi desmentido pelo
Governo, mas a verdade é que resulta de contas tão limpas como as outras.
Qual
a conclusão? A nossa política baseia-se em blá blá blá e muito pouco, ou
nenhum, trabalho concreto. Esta recusa de se partir de pressupostos reais,
prejudica qualquer debate sério e privilegia o achologismo. Em caso de dúvida,
tratam jornais e jornalistas como meros moços de recados (que também os
há, sublinho que não faço defesas corporativas) e quando surgem, contas feitas,
resultados concretos, todos preferem fingir que o não são, para continuar a
debater com base em ideias gerais e não em dados concreto.
Chega
a ser ridículo que um jornalista sozinho faça o que as máquinas dos partidos
e dos Governos deviam fazer e não fazem, mas acima de tudo é triste" (texto
de Henrique Monteiro, Expresso com a devida vénia)