"No caso da Madeira, sujeita por um lado às
medidas nacionais e por outro aos efeitos do programa de ajustamento
financeiro, serão também as primeiras eleições depois das regionais de Outubro
de 2011 e da austeridade implementada a partir de Março de 2012, após a
assinatura do memorando de entendimento em Janeiro desse mesmo ano. Não vale a
pena andarmos a tentar ignorar esta realidade ou a assobiar para o lado, deixando
para depois das eleições o ajuste de contas interno (nos partidos) ou a
responsabilização pelo desaire, seja do que for e de quem for. É melhor assumir
a realidade, ser verdadeiro, ser honesto, ser sincero e enfrentar o eleitorado
desanimado, frustrado, desmotivado, deprimido, olhando-o de frente, olhos nos
olhos. A austeridade, qualquer que ela seja, o desemprego, que no caso da
Madeira é uma tremenda preocupação, terão sempre influência nas opções
eleitorais dos cidadãos, sobretudo no chamado eleitorado flutuante, que não se
vinca a partidos com carácter permanente antes decide como vota em cada
momento. A tudo isto junta-se o risco de uma abstenção mais elevada e que nas
eleições autárquicas foi sempre um dos principais problemas.
Mas há ainda um outro dilema, porventura o mais
complicado, e que tem a ver com, o facto de que os eleitores percebem que, ao
propiciarem uma vitória eleitoral aos dois partidos da coligação nacional que
responsabilizam pela presente situação, acabam indirectamente, por legitimar um
poder e uma actividade governativa absolutamente criminosa, abjecta e
desprezível que tanto contestam, que tantos protestos motiva, que tantos dramas
sociais, mormente em termos da proliferação da pobreza, da exclusão social e do
desemprego para níveis nunca antes vistos, originou e que se limita a acelerar
deliberadamente o empobrecimento do país e das famílias, retirando-lhes
qualquer rendimento disponível, por mais insignificante que seja.
Isto leva-me a reforçar a ideia de que a campanha
eleitoral - que este ano exige, mais do que nunca, verdade, pragmatismo e
humildade - tem que centrar-se nas prioridades da sociedade na presente
conjuntura de crise e austeridade, concretamente os problemas sociais
dramáticos e a necessidade das autarquias terem condições logísticas e recursos
financeiros para intervirem. Estamos a falar de uma campanha eleitoral, quiçá a
mais humanizada de todas, sem espalhafatos, que não se compatibiliza com gastos
elevados ou com encenações complementares que tendo feito sentido, e que
porventura fariam sentido numa outra conjuntura social, económica e política,
deixaram de o ter nos momento presente face aa dimensão dos dramas sociais. Uma
campanha na qual os candidatos, mais do que nunca terão que dar a cara, que se
mostrar, que ganhar respeitabilidade e gerar confiança, privilegiando o
contacto directo, o tal olhar olhos-nos-olhos com as pessoas de que falava
anteriormente.
Sabemos que o PSD nacional é hoje um partido sem
motivação, sem espaço, sem protagonismo, entregue a uma pequena
"elite" de medíocres, saloios e iluminados, que consegue manter
reféns as estruturas partidárias locais, ou por via da manipulação com as
candidaturas autárquicas, ou recorrendo à mentira, ao embuste - o maior deles
foi consubstanciado quando esta gentinha ganhou as directas - ou mesmo à
pressão e à ameaça. Estamos a falar de uma cambada de oportunistas que em
termos de ética, de rigor e de princípios e valores, é tão ou mais vazia que o
próprio vazio em si mesmo.
Mas o PSD tem outro problema adicional, que
hipocritamente desvaloriza, mas que será determinante para o seu futuro e desta
corja que nos governa. Problema que decorre do facto do PSD estar a perder uma
significativa parcela da sua base social e eleitoral de apoio, como consequência
das medidas de austeridade tomadas ao longo dos anos e que visaram muito
acentuadamente duas parcelas decisivas dessa sustentação eleitoral dos
social-democratas. Falo dos funcionários públicos e dos reformados e
pensionistas. Estamos a falar de um universo global da ordem, dos 3,5 a 4
milhões de pessoas, cerca de 50 por cento dos eleitores inscritos em cadernos
eleitorais.
Para além de todos estes obstáculos que se colocam à
maioria no poder, proliferam as chamadas candidaturas independentes, as quais,
em minha opinião, mais do que terem condições para ganhar, acabarão por
condicionar o apuramento de mandatos por via do método de Hondt, o que pode ser
problemático para PSD e CDS. Por falar em CDS, parece-me óbvio que Paulo Portas
e a nomenclatura dirigente dos centristas temem perder influência, a pouca
influência autárquica de hoje detêm, sendo por isso provável que a coligação
comece a tremer perigosa e gravemente, porque passamos a falar de um desaire
eleitoral que pode ter continuidade nas europeias de Maio de 2014, um mês antes
da tão desejada saída da tróica, eleições europeias que vão gerar uma inflexão
ideológica na Europa, da direita para o centro-esquerda, motivada e acelerada
pela crise social e económica no Velho Continente e pela incompetência e
incapacidade das instituições comunitárias e seus dirigentes em encontrarem o
antídoto para esta recessão e estagnação.
Portas teme que o CDS seja desvalorizado no quadro da
actual coligação e que o seu partido seja atirado para uma dramática luta pela
sua sobrevivência eleitoral e política que ainda por cima não será ajudada em
nada pelas europeias do próximo ano que poderiam compensar um desaire eleitoral
nas autárquicas. Sondagens recentes mostraram que o CDS está em queda livre,
sendo o último partido nas preferências dos portugueses o que certamente causou
alarme e fez trocar os sinais de emergência. Ao mesmo tempo essas sondagens dão
conta que Portas consegue, apesar de tudo, resistir ao desgaste pessoal dos
respectivos líderes partidários da coligação. Admito que foi esta constatação
aliada à percepção de que Portas pode ser a salvação de um anunciado desaire
eleitoral do CDS, que terá sido determinante para a posição de força adoptada
pelo líder centrista, e repetida por outras figuras do CDS, relativamente à
denominada TSU dos reformados e pensionistas. Portas sabe que se esta medida
for tomada o CDS provavelmente passará a ter que lutar pela sobrevivência
política enquanto partido. Estamos a falar do espectro plausível de uma
pulverização do CDS que não é ficção, pelo contrário. Por isso, e conhecendo a
maneira de ser de Portas, e a sua reconhecida habilidade política, sagacidade e
inteligência admito como perfeitamente normal e adquirida que o governo de
coligação, particularmente a dupla Coelho-cobrador de impostos tenham
dificuldades acrescidas na imposição da austeridade cega que os caracteriza.
Passos Coelho no PSD tenta desvalorizar o impacto
de uma derrota em Setembro - que estou certo vai gerar controvérsia e
contestação interna nos dois partidos da coligação, incluindo o questionamento
das respectivas lideranças - e contrariar o óbvio ao afirmar que "as
próximas eleições não vão ser aquilo que tanta gente gostaria que fosse, uma
espécie de pântano e de antecâmara do colapso nacional. Enquanto for
primeiro-ministro não há situações de pântano em Portugal". Coelho disse
ser sua obrigação, aconteça o que acontecer nas autárquicas, "governar e
trazer o PSD para um exercício de responsabilidade", o que é incompatível
com uma copiosa derrota eleitoral e com a consequente perda de legitimação do
poder e da coligação em Lisboa" (LFM-JM)