sábado, agosto 26, 2023

Santa Casa: Depois da pandemia, o regresso aos lucros em 2022

As contas de 2021 e 2022 estão a ser revisitadas a pedido do Governo que também solicitou uma auditoria à empresa recente Santa Casa Global- As contas da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) estão debaixo de fogo e motivaram a ida, em abril, da ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho, ao Parlamento, a pedido do PSD, para esclarecer por que razão os resultados de 2021 não foram ainda homologados. A ministra garantiu que os órgãos deliberativos da SCML “estão em plenas funções”, recusando as acusações de vários deputados da oposição de que a SCML estaria em “gestão corrente”. Sobre as contas, avançou que a instituição terá regressado a terreno positivo em 2022, com um lucro de €10,9 milhões, indicando que em 2020 e em 2021 os prejuízos somaram €52 milhões e €20,1 milhões, respetivamente. “O efeito da pandemia fez-se sentir nas contas da SCML porque teve um impacto grande no aumento das despesas, fruto dos casos a que teve de acudir”, explicou Ana Mendes Godinho, sublinhando que, “além disso, as contas refletem também uma redução da receita dos jogos sociais”.


O regresso aos lucros decorreu, disse a governante, apesar de uma redução das receitas de 17,4% face a 2019, sinalizando que, por sua vez, os gastos subiram 10,7%, face ao ano anterior à pandemia. A covid-19, reiterou a governante, foi um fator de grande pressão sobre as contas porque fez subir os custos com as respostas sociais enquanto caíram de forma abrupta as receitas com os jogos. Sobre a despesa, Ana Mendes Godinho frisou que era fruto do assumir pela Santa Casa de novas responsabilidades, com impacto também ao nível dos gastos com pessoal que subiram 14,4%, por comparação com 2019.

Em 2019, antes da pandemia, as receitas correntes da SCML ascenderam a €268,4 milhões, num acréscimo de 5,8% face ao exercício anterior, graças sobretudo ao aumento em €11 milhões da distribuição de resultados dos jogos sociais (que nesse ano representaram 84% da receita corrente). No Relatório de Gestão e Contas de 2019 é ainda revelado que a SCML registou um resultado líquido positivo no valor de €37,5 milhões, “o segundo melhor dos últimos anos, apenas ultrapassado pelo ano de 2017”. Ora, o cenário mudou de forma dramática nos anos que se seguiram.

Mas a pandemia não explica tudo e é apontado o dedo a vários investimentos e projetos da SCML que não estarão a dar retorno, que consomem um elevado volume de recursos (como o Hospital da Cruz Vermelha portuguesa cuja sociedade de gestão passou a ser controlada pela SCML em finais de 2020) ou que demoraram muito tempo a ser desenvolvidos (como a criação de uma unidade de cuidados continuados no antigo Hospital Militar da Estrela ou a reconversão da fábrica da Nestlé, em Monsanto, em unidade residencial para idosos). E há o problema da Santa Casa Global, o braço para a internacionalização da SCML, que foi criada em 2021 para gerir lotarias e jogos de apostas no mercado externo e que está a ser alvo de uma auditoria, a pedido do Governo. Essa tarefa está a cargo da empresa BDO.

INVESTIGAÇÃO E AVALIAÇÃO

Também corre uma investigação do Ministério Público a contratações externas de funcionários na SCML, após uma queixa de que estaria a entrar pessoal para o índice remuneratório mais alto, quando permanecem congelados os salários e as progressões na carreira na instituição.

No que respeita à demora da homologação das contas, Ana Mendes Godinho disse que tinha pedido uma “avaliação aprofundada” das várias rubricas face “a disparidade de resultados entre exercícios” e dada a necessidade de acautelar “a sustentabilidade financeira” futura da instituição. Em causa está a informação financeira de 2021 e de 2022.

O modelo de financiamento da SCML foi, aliás, questionado por alguns deputados, nomeadamente por Carla Castro, da Iniciativa Liberal, e Isabel Pires, do Bloco de Esquerda, que mencionaram o problema da “adição” de pessoas mais vulneráveis, como os idosos, a jogos da Santa Casa como a raspadinha. Por sua vez, Ana Mendes Godinho frisou que, em oito anos, a SCML disponibilizou €1400 milhões para diversas respostas de ação social, nomeadamente no Programa de Alargamento dos Equipamentos Sociais, no Fundo de Socorro Social, em subsídios às famílias e na rede de cuidados continuados. A grande rubrica de despesa da SCML é a ação social que consumiu €141,23 milhões em 2020 e, em segundo lugar, surge a área da saúde, com uma despesa corrente de €60 milhões.

Questionado pelo Expresso, o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social aponta que aguarda pela entrega das conclusões da avaliação externa e independente à Santa Casa Global e da reavaliação dos Relatórios de Gestão e Contas da SCML dos anos de 2021 e de 2022. Nada é dito sobre mudanças no modelo de gestão da instituição ou sobre a necessidade de diversificação de receitas (Expresso, texto das jornalistas ANA SOFIA SANTOS e ISABEL VICENTE)

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