quarta-feira, agosto 23, 2023

José Berardo fica com as 214 obras que comprou a meias com o Estado

O protocolo atribui ao coleccionador, ou a quem este indicar, a opção de compra, que já terá sido accionada, deste conjunto de obras adquiridas nos primeiros anos do Museu Berardo. As 214 obras de arte compradas para o Museu Berardo a partir de 2007, com verbas de um fundo de aquisições co-financiado pelo empresário e pelo Estado, deverão ficar na posse do coleccionador, a quem o protocolo firmado em 2006 oferece opção de compra deste conjunto, que inclui diversos artistas estrangeiros, mas sobretudo muitos artistas portugueses, de Cabrita Reis e Rui Chafes a Jorge Molder ou João Tabarra.

Uma fonte assegurou ao PÚBLICO que a opção de compra foi já accionada, mas não foi possível confirmar essa informação nem com o Ministério da Cultura nem com José Berardo. Nem é claro se as obras vão ser compradas pelo próprio empresário ou se este transferiu para um terceiro essa prerrogativa prevista no protocolo firmado em 2006 com o Estado, e que esteve na base da criação, no ano seguinte, do Museu Berardo no CCB.

No artigo 30.º do protocolo, relativo ao cenário de dissolução da Fundação de Arte Moderna e Contemporânea – Colecção Berardo (FAMC-CB), o terceiro e último ponto estipula que “as obras de arte compradas com recurso ao fundo de aquisições podem ser adquiridas por José Manuel Rodrigues Berardo ou por quem ele venha a indicar, pelo respectivo preço de aquisição, sendo deduzida a parte do preço que constituiu a sua participação”.

Ou seja, Berardo poderá comprar estas obras, muitas delas de artistas então emergentes, ao preço a que custaram há cerca de 15 anos, desembolsando agora apenas a parte que então foi paga pelo Estado. E se o processo que enfrenta na justiça tornaria pelo menos plausível que estas obras viessem também a ser arrestadas, o facto de o protocolo prever que o empresário possa designar outro comprador parece fornecer um modo de afastar essa eventualidade.

Nos termos do protocolo, o Museu disporia de um milhão de euros anual para estas aquisições, devendo o empresário contribuir com 500 mil euros e o Estado com outro tanto. No entanto, ambas as partes deixaram rapidamente de cumprir essa obrigação, pelo que a generalidade destas obras foi adquirida ainda na vigência do primeiro director artístico do Museu Berardo, o francês Jean-François Chougnet.

Pedro Lapa, que lhe sucedeu em 2011, permanecendo no cargo até 2017, explicou ao PÚBLICO que algumas aquisições visaram “complementar ou actualizar a Colecção Berardo” – dá como exemplo obras de Willem de Kooning ou Daniel Buren –, mas que “não é isso que caracteriza” o conjunto.

“Com algumas excepções, é uma colecção feita maioritariamente de jovens artistas emergentes naqueles anos”, descreve, atribuindo-lhe mesmo “um papel relevante no quadro nacional de aquisições aos artistas portugueses”.

Para Lapa, “o que deve considerar-se lamentável é que a construção desta colecção só tenha durado dois anos, deixando o museu sem novas aquisições durante toda a restante duração do protocolo” (Publico, texto do jornalista Luís Miguel Queirós)

Sem comentários: