A queda de preços das casas é sobretudo sentida, na Alemanha, o maior mercado europeu, e nos países escandinavos. Lituânia e Croácia estão no polo oposto: é onde os preços mais crescem. Países como a Alemanha, Suécia, Dinamarca e Finlândia estão a refletir o aumento das taxas de juro e a registar as quebras de preços das casas mais significativa na Europa, segundo o Eurostat. Até agora, Portugal tem escapado à tendência.
A subida da inflação e o aperto da política monetária por parte do Banco Central Europeu, Reserva Federal, entre outros bancos centrais, puseram fim a uma tendência de facilidade de acesso ao crédito hipotecário. O fim das taxas de juro próximas de zero levou a que os preços começassem a cair em muitos mercados imobiliários na Europa desde os primeiros meses do ano passado e a sua subida mais prolongada do que o esperado para combater a inflação está a agravar a situação em 2023. Além da contração do preço do imobiliário, a tendência reflete-se também no mercado bolsista europeu, em que as 32 empresas do imobiliário que fazem parte do STOXX 600, estão a cair desde fevereiro do ano passado. Um setor que esta sexta-feira caiu 1%, em reação ao pedido de proteção de credores apresentado pelo gigante chinês Evergrande nos EUA.
A par do repentino
aperto do crédito, há todo um contexto marcado pela guerra na Ucrânia, aumento
dos custos de construção e de retração de investimento que também afeta o
imobiliário. Ao arrepio do que se passa em grande parte da Europa, os preços
continuam a crescer em Portugal, embora de forma mais moderada, com os
analistas a afastarem, para já, uma crise profunda no setor.
O MAIOR MERCADO
EUROPEU
Na Europa, os
principais sinais de preocupação vêm sobretudo da Alemanha, o maior mercado
imobiliário europeu, ou mesmo da Suécia, países em que os preços do imobiliário
estão a cair desde o ano passado. O agravamento da tendência é também sentido
nos países nórdicos, mas a queda de preços é transversal a boa parte dos países
europeus.
Segundo os últimos
dados do Eurostat disponíveis, no 1.º trimestre de 2023 o índice de preços da
habitação na UE cresceu 0,4 %. Quando comparado com o mesmo período do ano
passado, em relação com o trimestre anterior “assistimos a um decréscimo no
valor deste índice em cerca de -0,9%, confirmando a desaceleração e baixa nos
preços que se verifica desde o início de 2022”, nota Gustavo Soares.
O administrador e
proprietário da Engel & Völkers Porto, salienta que a tendência tornou-se
negativa a partir de meados do ano passado, quando os bancos centrais começaram
a apertar mais a “torneira” do crédito, com os dois últimos trimestres do ano a
recuarem, segundo o Eurostat, 1,7% e 0,9%.
Em termos
homólogos, os “países no vermelho” são a Suécia, Alemanha, Dinamarca e
Finlândia, com variações negativas de 6,9%; 6,8%; 6,2% e 5,1%, respetivamente.
Gustavo Soares salienta que no caso da Suécia e Alemanha, os preços estão a
cair há 3 trimestres consecutivos. Em contraste, Gustavo Soares, salienta que
as evoluções mais positivas foram registadas em países como a Croácia e a
Lituânia, mercados muito pequenos a crescerem nos primeiros três meses deste
ano a taxas homólogas de 14% e 13,1% respetivamente e, na Bulgária, cresceram
8,7%; 8,8% e 9,5% respetivamente”.
MAIS SINAIS DE
ALERTA NA ALEMANHA
Os últimos
indicadores revelados pela Federação alemã do imobiliário, citados pelas
agências internacionais dão conta que a construção nova nos primeiros seis
meses de 2023 caiu 47% em relação à média dos dois anos anteriores. O gabinete
de estatísticas alemão divulgou esta sexta-feira uma queda de 27% nas licenças
de construção nos primeiros seis meses de 2023, o que confirma a quebra da
procura que afeta o setor imobiliário.
Há duas semanas, a
Reuters dava conta que o maior grupo de construção imobiliário alemão, Vonovia,
registou um prejuízo de 2 mil milhões de euros e reviu em baixa o valor dos
seus ativos em 3 mil milhões. Para 5 de setembro, está prevista uma reunião
entre as associações do setor com o Governo, para discutir novas ajudas à
construção. A quebra de 6,8% nos preços no primeiro trimestre foi a maior
quebra trimestral desde 2020. Isto, num país em que a maior fatia de crédito
hipotecário é a taxa fixa. Para os analistas, só em setembro, com a publicação
de novas estatísticas do Eurostat e alemãs, é que se saberá se a tendência de
crise continuará a agravar-se.
Fora da UE, o
Reino Unido, onde o grosso do crédito hipotecário é a taxa variável, não escapa
à tendência de quebra. A Nationwide Building Society, uma instituição
mutualista britânica e a maior sociedade de construtores do país, acaba de
revelar que os preços das casas caíram 3,8% em julho em termos homólogos.
MERCADO BOLSISTA
REFLETE CRISE
O índice do setor
imobiliário do Stoxx 600 tem caído nas duas últimas semanas, aproximando-se dos
mínimos verificados em junho, em março e em outubro do ano passado. Para Paulo
Rosa, economista sénior do Banco Carregosa, a robusta subida das taxas de juro
no último ano e meio, na tentativa de travar a mais elevada inflação dos
últimos 40 anos, “ameaça penalizar os preços das casas, as promotoras
imobiliárias e, consequentemente, as suas cotações em bolsa”.
Alemanha e países
nórdicos já sentem quebra dos preços do imobiliário
Para trás, fica o
período de uma descida acentuada de taxas de juro como resposta à crise
económica ditada pela pandemia de covid-19. Um período que também ficou marcado
pela procura de novas moradias em contexto pandémico e que impulsionou os
preços das casas e, desse modo, as cotações das empresas do setor imobiliário
europeu até junto dos máximos históricos em meados de 2021.
Paulo Rosa adianta
que, esta sexta-feira, “o setor imobiliário europeu tem intensificado as
perdas, desvalorizando mais de 1%, no seguimento da entrada com um pedido de
proteção contra falência do grupo Evergrande, gigante imobiliário chinês, num
tribunal dos EUA”.
PERIGO DE
CONTÁGIO?
O economista
sénior do Banco Carregosa salienta que desde quarta-feira o setor imobiliário
europeu acumula perdas em bolsa de quase 3%. “A notícia de proteção contra os
credores da Evergrande intensifica ainda mais os receios de que as dificuldades
no setor imobiliário da China possam espalhar-se a outras partes da economia
chinesa, penalizando não só o crescimento da segunda maior economia global, mas
também das restantes geografias, sendo também um alerta para um eventual
aumento dos já existentes problemas no setor imobiliário residencial europeu e
imobiliário comercial nos EUA”, afirma.
Resta agora esperar pela próxima reunião de política monetária do BCE que se realiza a 14 de setembro, para ficarmos a saber se a tendência para a subida das taxas de juro se irá manter ou se, por outro lado, poderá começar a haver algumas tréguas por parte do banco liderado por Christine Lagarde (Expresso, texto do jornalista Helder C. Martins e infografia de Jaime Figueiredo)
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