sexta-feira, julho 15, 2022

Descodificador: Ex-Banif paga ao Totta e diminui risco do Estado

A Oitante, veículo que ficou com ativos problemáticos do Banif que não foram para o Santander, cumpriu uma primeira missão: devolveu os €746 milhões de financiamento contragarantido pelo Estado. Devolverá mais?

1 - Que devolução é esta?

A Oitante foi criada em dezembro de 2015 para ficar com os ativos (algumas participadas, imóveis, fundos, créditos) que o Santander não quis adquirir na resolução aplicada pelo Banco de Portugal ao Banif. Em contrapartida dos ativos que recebeu naquele montante, a Oitante, que tem o Fundo de Resolução como acionista, teve de emitir obrigações de €746 milhões, cuja subscrição foi assegurada pelo Santander (na prática, o banco de capitais espanhóis que ficara com o Banif financiou também o veículo com os ativos que não quis). Ao longo dos anos, este veículo gerido por Miguel Barbosa tem vindo a proceder a devoluções, sendo que, no fim de junho, pagou a última fatia: €18 milhões. Concluiu, assim, o reembolso dos €746 milhões ao Santander Totta, libertando o risco sobre o Fundo de Resolução e o Estado, que eram garantes da operação — se a Oitante não pagasse, teriam de suportar eles o encargo.

2 - Que poupança foi conseguida?

Era por 10 anos que se estendia a maturidade das obrigações da Oitante subscritas pelo Santander, ou seja, a devolução podia acontecer até ao fim de 2025. Porém, este veículo já tinha assumido que era sua intenção antecipar esse reembolso, conseguindo as verbas com as vendas ou liquidações dos ativos que tinha em carteira. Devolvendo as obrigações, deixa de ter de pagar juros. Desde a emissão, a Oitante tinha suportado juros de €62 milhões. Pagaria mais €110 milhões se os títulos fossem mantidos até ao vencimento, pelo que há uma poupança deste valor em juros. Também o Fundo de Resolução vai poupar com esta decisão. Enquanto garante da emissão obrigacionista, este veículo pediu uma contragarantia ao Estado, pelo que pagava comissões. O Fundo pagou um total de €20 milhões em comissões, sendo que o custo teria sido superior em €40 milhões caso a liquidação da operação fosse apenas na maturidade.

3 - A resolução dará ganhos?

Não. Este financiamento através da emissão de obrigações não foi o único auxílio estatal concedido por conta da queda do Banif, em 2015. Houve uma injeção de €489 milhões por parte do Fundo de Resolução, a somar aos €1,7 mil milhões colocados diretamente pelo Estado no banco resolvido para a limpeza antes da venda ao Santander. Com esta recuperação feita pela Oitante, criam-se condições para que esta possa vir a pagar mais dividendos ao seu acionista. Em 2020, já deu €15 milhões em dividendos, e é intenção do veículo fazer futuramente novas remunerações acionistas. O Banco de Portugal acredita que com este passo da Oitante “faz perspetivar a recuperação de uma parte significativa dos €489 milhões desembolsados pelo Fundo de Resolução, em 2015, no financiamento da resolução do Banif”. Já dos €1,7 mil milhões diretamente injetados pelo Estado não há perspetivas de recuperação.

4 - E o que há pela frente?

No caso da Oitante, o presidente do veículo declarou há meses, em entrevista ao Expresso, que há margem para uma vida futura que não esteja confinada apenas à gestão de ativos que já tem em carteira do ex-Banif, podendo ficar com outros portefólios. Mas, por agora, o trabalho continua, com ativos herdados do banco para vender e para liquidar. Disso lembrou o Fundo de Resolução, que declarou, em comunicado, que esta devolução total do financiamento “não esgota a missão da sociedade”. “A Oitante mantém um património sob sua responsabilidade, continuando a caber-lhe a gestão e a recuperação dos ativos que lhe estão confiados, com vista à maximização do seu valor”, indicou. Já no Banif ficaram passivos, como os detentores de dívida subordinada e os acionistas, cujas perspetivas de recuperação são bastante limitadas no âmbito do processo de liquidação, que se vai ainda demorar na Justiça portuguesa (Expresso, texto do jornalista DIOGO CAVALEIRO)

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