sexta-feira, novembro 27, 2020

Pico de casos da segunda onda foi ultrapassado esta semana

 


Número de novas infeções diárias continua muito elevado. Pressão nos hospitais ainda vai acentuar-se. As projeções estimavam que o número máximo de infeções devido ao novo coronavírus ocorresse no final deste mês e a análise dos especialistas da Faculdade de Ciência das Universidade de Lisboa (FCUL) confirma que o pico desta segunda onda em Portugal foi ultrapassado esta semana. Falta ainda saber com que velocidade se inicia a descida, uma vez que ter seis mil novos casos diários continua a representar um enorme risco.

“Será que agora se forma um planalto ou conseguimos manter a pressão e fazer o Rt [número médio de pessoas que cada infetado contagia] passar para menos de 1 de forma sustentada? É altamente importante que isto aconteça porque não é sustentável permanecer com um nível tão alto de incidência durante muitos dias”, avisa Manuel Carmo Gomes, professor de Epidemiologia na FCUL, e um dos autores das projeções apresentadas ao Governo na última reunião no Infarmed. “A mobilidade, fruto das restrições em vigor, reduziu-se muito lentamente em Portugal, abaixo do que aconteceu em países como a Irlanda. Se agora a descida de casos diários acontecer a uma taxa média de -2%, levamos 34 dias para passar dos atuais 6 mil para 3 mil casos. Se a descida for de -7%, teremos no fim de dezembro pouco mais de mil infeções por dia. Isto ilustra a dificuldade em chegar ao Natal com uma baixa taxa de incidência. É possível mas depende muito de todos nós.”

11 concelhos no Norte ainda têm mais de 1920 novos casos por 100 mil habitantes, o dobro do nível de risco extremo

Apesar de ter sido ultrapassado o pico de infeções, a pressão nos hospitais ainda vai aumentar. As projeções da FCUL apontam para o máximo de internamentos “na transição de novembro para dezembro”. Quanto à mortalidade, as perspetivas “melhoraram” e o pico deverá chegar até à primeira semana de dezembro, “com uma média diária de 80 mortes”, diz Carmo Gomes. “Esperamos atingir cerca de 6400 mortes covid acumuladas até ao fim do ano. É muito importante ter em mente que, se não fossem as medidas de contenção da epidemia, a fatura de óbitos covid seria imensamente mais elevada.” Portugal já passou as 4 mil mortes e mais de metade ocorreram nos últimos três meses.

O QUE ACONTECEU AO NORTE?

O Norte do país, a região mais afetada nesta segunda onda, também atingiu recentemente o pico de infeções. Embora isso se traduza já em sinais positivos de abrandamento de novos casos em muitos concelhos, a região continua a ter uma situação de enorme gravidade. Quase todos os 47 concelhos do país com risco extremamente elevado de infeção (acima de 960 novos casos por 100 mil habitantes) são nesta região. E entre eles, segundo os dados da ARS Norte, há 11 com mais de 1920 novos casos por 100 mil habitantes, o dobro do que já é considerado um risco extremo. “Concelhos com este nível de incidência afetam os que estão ao lado. Mesmo com as medidas em vigor, um concelho com incidência baixa acaba por subir quando está ao lado de um que tenha um nível muito alto”, explica Óscar Felgueiras, matemático e professor da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto.

Esse ‘contágio geográfico’ conta a história recente do Norte do país: os três concelhos do Vale de Sousa Norte (Paços de Ferreira, Lousada e Felgueiras), que chegaram a ter uma média de 3500 novos casos por 100 mil habitantes, funcionaram como “foco disseminador” do vírus, que se alastrou com muita intensidade aos municípios vizinhos. Primeiro a Paredes ou Penafiel e depois a outros locais do distrito do Porto, como Póvoa de Varzim e Vila de Conde, ambos em situações preocupantes neste momento, além de locais no distrito de Braga, como Guimarães.

“Os concelhos de elevada incidência tendem a gerar à sua volta uma mancha mais carregada”, aponta o matemático, considerando “essencial” não levantar restrições onde há menos casos. “Os locais com incidência baixa estão em maior risco de subir do que os que estão no topo. Esses já estão a descer devagar, mas podem levar mais de um mês para terem menos de 960 novos casos. As medidas estão a ter efeito, mas qualquer relaxamento pode travar o ritmo de descida.”

A maioria dos concelhos onde os novos casos mais do que duplicaram em duas semanas está agora no Centro e Alentejo, onde o cuidado deverá ser redobrado para evitar uma escalada da epidemia. Só assim será possível que a seguir ao pico registado esta semana venha a descida desejada no número de novas infeções diárias (Expresso, texto da jornalista RAQUEL ALBUQUERQUE e INFOGRAFIA CARLOS ESTEVES)

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