terça-feira, outubro 13, 2015

Cavaco, a revisão constitucional e os Representantes da República

"Num domínio que não se relaciona diretamente com o Presidente da República, mas que, por opção constitucional, acaba por ter incidência no exercício das suas funções, importaria igualmente ter em conta a experiência política dos últimos anos.
Refiro-me, neste particular, à figura dos Representantes da República para as Regiões Autónomas. O desenho institucional deste cargo, a par das competências que é chamado a exercer, tornam de todo em todo desaconselhável a consagração de um só representante da República para ambas as regiões, tal como já chegou a ser sugerido.
Na verdade, e até para a defesa dos interesses próprios de cada uma das regiões insulares no quadro de um Estado unitário, a existência de dois representantes da República é a solução que inequivocamente se afigura mais adequada.
Pelo contrário, a existir apenas um representante da República para ambas as regiões, este perderá a sua relação de proximidade e de conhecimento das especificidades políticas, económicas e sociais de cada uma. Ora, esse conhecimento é essencial, designadamente, para o exercício da competência de assinatura, veto e iniciativa de fiscalização da constitucionalidade dos diplomas regionais – competência que deve ser mantida. Sendo que, noutros casos, a existência de um só Representante da República para ambas as regiões impossibilitaria mesmo o desempenho das suas funções; por exemplo, no âmbito dos processos eleitorais ou na gestão de situações de emergência. Aquilo que fundamenta a opção histórica de 1976, que levou à consagração das autonomias regionais dos Açores e da Madeira, é também o motivo que justifica a existência de um representante da República para cada região autónoma.
Ainda no que se refere à ação dos Representantes da República, creio que se deveria reequacionar o modelo em que se previa a sua presença no Conselho de Ministros.
O que posso concluir, da minha experiência pessoal, é que a ausência dos representantes da República das reuniões do Conselho de Ministros dificulta, de forma muito gravosa quer para as regiões autónomas, quer para o Governo da República, uma comunicação ágil e eficiente entre o poder central e os órgãos regionais.
Os Representantes da República, no âmbito das suas competências próprias, poderiam atuar na intermediação entre ambos os poderes, evitando preventivamente o surgimento de potenciais conflitos e transmitindo de forma expedita as pretensões dos órgãos regionais ao poder central. Estou certo de que desse modo se aprofundaria a autonomia regional e a defesa dos interesses das populações insulares e, em simultâneo, se garantiria o necessário respeito pelo princípio constitucional da unidade do Estado.
Uma parcela significativa das tensões e problemas que no passado se fizeram sentir entre os órgãos de governo próprio das regiões e o poder central, conforme tive oportunidade de testemunhar, seria substancialmente reduzida através de uma interação mais próxima, a ser exercida pelos Representantes da República para os Açores e para a Madeira" (excerto da intervenção de Cavaco Silva feita na Sessão Solene de Abertura do Ano Judicial, 8 de Outubro)

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