segunda-feira, abril 21, 2025

Uma experiência alemã e um rendimento básico universal sem compromisso


Uma experiência alemã revelou que é provável que as pessoas continuem a trabalhar a tempo inteiro, mesmo que recebam um rendimento básico universal sem compromissos. O rendimento básico universal, também conhecido como rendimento garantido, é a ideia de dar dinheiro a toda a gente, independentemente de quanto já ganham – para lhes dar a liberdade de se deslocarem entre empregos, formarem-se para novos cargos, prestarem cuidados ou dedicarem-se a atividades criativas.

Entre os proponentes contam-se nomes como Elon Musk, que afirmou em 2018 que “o rendimento universal será necessário ao longo do tempo se a Inteligência Artificial (IA) assumir a maioria dos empregos humanos”. O candidato presidencial democrata dos EUA, Andrew Yang, candidatou-se em 2020 com uma plataforma que pretendia dar aos americanos 1.000 dólares (cerca de 884 euros) por mês, chamando a ideia de uma “viragem no jogo”.

Mein Grundeinkommen (Minha Renda Básica), a organização sem fins lucrativos com sede em Berlim que realizou o estudo alemão, acompanhou 122 pessoas por três anos. De junho de 2021 a maio de 2024, este grupo recebeu um montante incondicional de 1.200 euros por mês. O estudo centrou-se em pessoas com idades entre os 21 e os 40 anos que viviam sozinhas e já ganhavam entre 1.100 euros e 2.600 euros por mês. As pessoas eram livres para utilizar o dinheiro extra do estudo em tudo o que quisessem.

Ao longo de um período de três anos, a única condição era que eles tinham de preencher um questionário a cada seis meses que perguntava sobre diferentes áreas das suas vidas, incluindo a sua situação financeira, padrões de trabalho, bem-estar mental e envolvimento social.

Houve experiências semelhantes que testaram a viabilidade do rendimento básico universal, como uma que começou em Stockton, na Califórnia, em 2019, que distribuiu pagamentos de 500 dólares (cerca de 442 euros) por mês. Na altura, os investigadores disseram que poderia ter um impacto “profundo” na saúde pública. Na Europa, a ideia ganhou força durante a pandemia de Covid-19, com um estudo da Universidade de Oxford a concluir que 71% dos europeus em 2020 eram a favor da introdução de um rendimento básico universal.

Uma das preocupações manifestadas pelos críticos é que o facto de receberem um rendimento básico poderia tornar as pessoas menos inclinadas para o trabalho. Mas o estudo Grundeinkommen sugere que pode não ser esse o caso. O estudo concluiu que o facto de se receber um rendimento básico não foi motivo para as pessoas abandonarem os seus empregos. Em média, os participantes no estudo trabalharam 40 horas por semana e mantiveram o emprego – idêntico ao grupo de controlo do estudo, que não recebeu qualquer pagamento.

“Não encontramos provas de que as pessoas gostem de não fazer nada”, diz no site do estudo Susann Fiedler, professora da Universidade de Economia e Negócios de Viena, na Áustria, que esteve envolvida na investigação.

Ao contrário do grupo de controlo, as pessoas que recebiam um rendimento básico tinham mais probabilidades de mudar de emprego ou de se inscrever num curso superior. Registaram uma maior satisfação na sua vida profissional – e estavam “significativamente” mais satisfeitas com o seu rendimento.

Matthew Johnson, professor de políticas públicas na Universidade de Northumbria, no Reino Unido, que trabalha com o rendimento básico e é autor de um livro sobre o tema, considera os resultados “pouco surpreendentes”.

“Este estudo confirma as provas crescentes que nós e outros temos vindo a apresentar há muito tempo: não há provas de que o Rendimento Básico reduza a atividade económica e do mercado de trabalho”, afirma à CNN. “Pelo contrário, dá aos trabalhadores a segurança económica que lhes permite correr bons riscos e evitar os maus riscos na sua vida profissional.”

E será que mais dinheiro pode comprar a felicidade? De acordo com o estudo, os beneficiários de um rendimento básico afirmaram sentir que as suas vidas eram “mais valiosas e significativas” e sentiram uma clara melhoria na sua saúde mental.

Também pode comprar liberdade – ou, pelo menos, mais liberdade. Os beneficiários, especialmente as mulheres, referiram sentir uma maior autonomia nas suas vidas. Apesar de trabalharem as mesmas horas que antes, sentiam que tinham mais tempo para atividades como dormir, fazer voluntariado e passar tempo com os seus entes queridos.

“Sabemos que o aumento do montante, da segurança e da previsibilidade do rendimento melhora os resultados fundamentais em termos de saúde, atividade, espírito empresarial, educação e quase todas as outras áreas da vida”, aponta Johnson.

O seu colega Elliott Johnson, um investigador da Northumbria que estuda a forma como os sistemas de segurança social afetam a saúde e se o rendimento básico pode resolver os problemas existentes, diz que o estudo demonstra por que razão as pessoas precisam de apoio incondicional.

“Reduzir a condicionalidade e garantir que as pessoas têm dinheiro suficiente para o básico melhora a saúde e elimina os desincentivos perversos à participação no trabalho, bem como à atividade física e social”, afirma à CNN, salientando as necessidades das pessoas com deficiência.

“Os governos fariam bem em encará-lo como um investimento na saúde da população a longo prazo”, acrescenta Johnson. Mais de 2 milhões de pessoas candidataram-se a participar no estudo, que foi inteiramente financiado por doadores privados.

A organização, que distribui rendimentos básicos há mais de 10 anos, num esforço para compreender as aplicações reais do conceito, afirma que mais de 200 mil pessoas apoiaram o seu trabalho através de donativos mensais.

“O rendimento básico incondicional não é um conceito estático, mas sim um conceito que precisa de ser experimentado e discutido”, afirma no seu website. As pessoas participam em sorteios para terem a oportunidade de receber o rendimento básico, que é pago através de donativos financiados por crowdfunding.

Agora que a experiência deu à organização uma ideia de como um rendimento básico pode funcionar a nível individual, a organização espera incluir grupos mais representativos da sociedade como um todo. Olhando para o futuro, a Mein Grundeinkommen diz que os desafios da crise climática, as mudanças demográficas e a tecnologia colocarão questões importantes sobre o papel do estado social – e o lugar do rendimento básico universal dentro dele (CNN-Internacional, texto da jornalista Rosa Rahimi)

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