quarta-feira, junho 22, 2022

Eurostat: Poder de compra dos portugueses afunda

Se em 2021 o poder de compra dos portugueses já estava a cair, em 2022 não será diferente e o aumento da inflação só vem piorar as perspetivas. Produtos estão cada vez mais caros. Em Portugal, o consumo individual real (AIC, na sigla em inglês) per capita – um indicador que avalia o bem-estar material das famílias – ficou 17% abaixo da média da União Europeia (UE) no ano passado, um valor que representa um agravamento de dois pontos percentuais face a 2020. Os dados, avançados esta segunda-feira pelo Eurostat, mostra então que a capacidade de compra dos portugueses caiu para os 83% em 2021. Feitas as contas, o consumo individual real per capita expresso em padrões de poder de compra (PPS) variou de 63% a 146% da média da UE nos 27 Estados-Membros. Nesse mesmo período em análise, nove Estados-Membros registaram AIC per capita acima da média da UE. O Luxemburgo (46%) foi o único Estado-Membro que registou uma AIC per capita 25% ou mais acima da média da UE. Na Dinamarca, Alemanha, Holanda, Bélgica, Áustria, Suécia, Finlândia e França, os níveis estavam 10% ou mais acima da média da UE. 

Os dados do gabinete de estatística europeu mostram ainda que, em treze Estados-Membros, a AIC per capita situava-se entre a média da UE e 25% abaixo. Nesta categoria, registaram-se diferenças significativas entre os Estados-Membros: em Itália, Lituânia, Chipre e Irlanda, os níveis situaram-se 10% ou menos abaixo da média da UE, enquanto Eslovénia, Espanha, República Checa, Polónia, Portugal, Malta e Roménia situaram-se entre 11% e 20% abaixo. A Estónia e a Grécia ficaram 21% e 23% abaixo da média da UE, respetivamente. 

Há ainda cinco Estados-Membros que registaram uma AIC per capita 25% ou mais abaixo da média da UE. Croácia, Letónia, Hungria e Eslováquia ficaram entre 27% e 30% abaixo, enquanto a Bulgária registou AIC per capita 37% abaixo da média da UE. E o PIB? Já o produto interno bruto (PIB) per capita em 2021 também registou diferenças substanciais entre os Estados-membros, variando entre os 55% da média da UE na Bulgária e 277% no Luxemburgo. De acordo com o gabinete de estatísticas europeu, o valor elevado verificado no Luxemburgo “deve-se em parte à grande percentagem de trabalhadores transfronteiriços no emprego total do país” que, “embora contribuam para o PIB, não são considerados como parte da população residente que é usada para calcular o PIB per capita“.

Entre os dez países da UE que registaram um PIB per capita acima da média, além do Luxemburgo, o destaque vai para Irlanda, cujo elevado nível “pode ser parcialmente explicado pela presença de grandes empresas multinacionais detentoras de propriedade intelectual”. E acrescenta que o fabrico por contrato associado a estes ativos contribui para o PIB, enquanto uma grande parte do rendimento ganho com esta produção é devolvida aos proprietários finais das empresas no estrangeiro. Em Portugal, o valor do PIB per capita foi de 74% da média da União Europeia.

Inflação vs poder de compra E se em 2021 já se notava o aumento de preços – o que reduz o poder de compra – este ano a inflação continua a atingir máximos históricos. Ao i, Henrique Tomé, analista da XTB, chegou a chamar a atenção para o aumento da inflação. “A inflação continua a ser um grande problema para Portugal”, começou por dizer o analista. E acrescentou: “A verdade é que as famílias portuguesas estão cada vez mais a perder poder de compra e poderá ter um impacto mais severo na economia a médio prazo”. Para Henrique Tomé não há dúvidas que “este é o grande desafio para Portugal, conseguir manter o crescimento da economia enquanto a inflação permanece elevada. Assim que a economia portuguesa começar a dar sinais de abrandamento, e se a inflação permanecer elevada, então vamos ser severamente afetados economicamente”.

Não muito diferente é a opinião de Paulo Rosa, economista do Banco Carregosa. Numa altura em que o Banco de Portugal estima que a inflação seja de 5,9% este ano, o economista lembra que a inflação no nosso país “é maioritariamente do lado da oferta, penalizada sobretudo pela alta dos combustíveis fósseis e pela subida dos alimentos, nomeadamente dos cereais e da carne”. Esta subida de preços, no seu entender, “tende a penalizar o rendimento disponível das famílias, a diminuir a procura e a reduzir as margens das empresas”.

E, perante este contexto, “aumenta a probabilidade de um cenário de estagflação, estagnação económica associada a elevada inflação, e esta probabilidade será tanto maior, quanto mais duradoura e grave for a guerra na Ucrânia e a subida dos preços dos combustíveis fósseis, que intensificará o aumento da inflação e desacelerará o crescimento económico”.

Recorde-se que também o economista Eugénio Rosa tinha alertado para a pobreza no país e para as consequências da inflação. “A inflação prejudica quem tem rendimentos fixos, como salários, pensões, etc., uma vez que, não aumentam com a rapidez e com a dimensão que se verifica nos preços, que podem aumentar todas as semanas, causando perdas de poder de compra”, ao mesmo tempo que “beneficia os detentores de rendimentos variáveis, pois estes podem aumentar os preços quando querem”, disse.

O economista garante ainda que a escalada de preços “está a causar uma profunda degradação das condições de vida, nomeadamente dos trabalhadores e pensionistas e a corroer as poupanças”. E os preços podem vir a aumentar. A presidente do Banco Central Europeu, antecipou uma “inflação indesejavelmente elevada” na zona euro nos próximos meses, assim como uma recuperação no setor dos serviços, devido ao turismo, a suportar o crescimento económico. Preços dos alimentares crescem Quem vai ao supermercado regularmente já percebeu que os preços têm aumentado e as análises da Deco Proteste não deixam margem para dúvidas: o grupo de alimentos que a Deco monitoriza semanalmente está agora quase 20 euros mais caro do que no final de fevereiro, antes da invasão russa na Ucrânia.

Feitas as contas, o preço do cabaz de bens alimentares essenciais registou uma subida de 0,95% (mais 1,91 euros) entre 8 e 15 de junho, passando a custar 203,20 euros. Mais de cem dias depois do início da guerra na Ucrânia (24 de fevereiro), data em que que a Deco deu início a esta análise, comprar o mesmo cabaz de produtos alimentares sai 19,57 euros (mais 10,66%) mais caro. Mas de que produtos estamos a falar? O cabaz analisa um total de 63 produtos alimentares essenciais como é o caso do peru, frango, pescada, carapau, cebola, batata, cenoura, banana, maçã, laranja, arroz, esparguete, açúcar, fiambre, leite, queijo ou manteiga.

Nesta semana em análise, os dez produtos onde a Deco encontrou maiores crescimentos nos preços foram a pescada fresca (17%), o arroz carolino (9%), as ervilhas ultracongeladas (8%), o robalo (6%), o peixe-espada-preto (6%), os medalhões de pescada (6%), a dourada (4%), a batata vermelha (4%), os douradinhos de peixe (4%) e a curgete (3%).  Mas, analisando apenas as categorias de produto com maiores subidas de preços, entre 23 de fevereiro e 15 de junho, o óleo alimentar é o que mais se destaca, com um incremento percentual de 50% (Jornal i, texto da jornalista Daniela Soares Ferreira)

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