sexta-feira, setembro 25, 2015

Mania de escrever: as pessoas começam a escolher qual o medo em que vão votar

A escassas duas semanas das eleições legislativas de 4 de Outubro ninguém pode vaticinar qual será a taxa de participação e qual a potencial taxa de abstenção. Tudo depende de um factor político - entre outros, de natureza social, como a emigração - sobre o qual ninguém consegue saber antecipadamente que impacto terá, de facto, junto dos eleitores.
Falo da estratégia do medo. Tanto a coligação PSD-CDS como o PS estão a adoptar uma estratégia eleitoral assente no medo, opção que admito venha a ser reforçada nos últimos dias da campanha eleitoral.
Que raio de "estratégia do medo" é essa?
No caso do PSD ela decorre de um estudo prévio realidade ao "mercado eleitoral" e que pretendeu identificar numa espécie de "análise swot" eleitoral, os pontos fracos e os pontos fortes da campanha eleitoral e quais as fraquezas, ameaças e oportunidades da coligação no poder e dos socialistas aos olhos da opinião pública.
Basicamente o que se pretende com estes estudos é propiciar aos líderes dos partidos a identificação dos assuntos que devem ser preferencial e repetidamente privilegiados no discurso político, que devem ser usados até à exaustão, na expectativa de que dessa opção resultarão ganhos eleitorais que nem sempre se confirmam.  Ao invés o estudo identifica também os pontos fracos e as ameaças, os assuntos que, na lógica de uma coligação no poder, não podem (não devem) ser colocados em cima da mesa durante a campanha eleitoral, na medida em que devem ser mantidos no "esquecimento" porque se tratam de matérias complexas que penalizam eleitoralmente quer quem está no poder e que por isso pode ficar mais vulnerável ao ataque político concertado, quer quem está fragilizado na oposição como é o caso do PS O mesmo se passa, presumo eu, com o maior partido da oposição que logicamente pretende afirmar-se como alternativa e conquistar o poder, mas que precisa de saber antes disso quais os assuntos que deve desenvolver porque aparentemente são mais atractivos aos olhos dos eleitores e podem, por isso, render votos. Não tenho dados mas presumo que o PS - que no passado teve uma máquina logística de propaganda e para fins eleitorais eficaz e poderosa - fez rigorosamente a mesma coisa, sabendo António Costa - apesar das suas reconhecidas limitações políticas e enquanto orador, longe, muito longe, de construir a alternativa sustentada que porventura nesta altura todos pensavam que existisse - quais os assuntos que são mais do agrado dos eleitores, na lógica dos socialistas, e quais os itens que não podem, seja a que pretexto for, colocados na agenda política e mediática, porque potencialmente penalizadores.
O PS está angustiado e sente-se pressionado na medida em que fazendo fé nas sondagens - e só nelas, o que desde logo não e nada consistente - os socialistas esperariam estar hoje num patamar superior ao que na realidade ocupam, na esperança de que quatro anos de austeridade tivessem dado cabo da coligação, um cenário que em nada está dissipado.
Os socialistas reagem assim do discurso político do medo, usado pela coligação PSD-CDS, de um regresso ao passado (Sócrates, falência, troika, mais austeridade, mais dívida, etc) com a tentativa de comparar os resultados da governação 2011-2015 em termos de dívida pública, com o que registava em 2011, quando o governo socialista de Sócrates foi exonerado devido ao pedido de ajuda externa, à perda de eficácia da sua máquina de propaganda política, aos conflitos sucessivos com Cavaco Silva e à pressão externa e dos mercados.
Basicamente o que o PS quer, entre a tentativa de "esquecer" Sócrates e a desmistificação do "sucesso" reclamado pela coligação, é criar a ideia de que existem alternativas menos dolorosas, que a austeridade não pode ser uma sina, que o que se passou no passado não tem que se repetir e que este PS de Costa nada tem a ver com o PS de Sócrates tal como esta coligação PSD-CDS nada tem a ver com os 10 anos de cavaquismo que foram os piores para o endividamento do nosso país.
Tenho muitas dúvidas que Costa seja capaz de passar esta mensagem aos eleitores, porque o líder do PS tem revelado, para além de uma campanha deficiente, pouco agressiva, nada convincente, que em vez de certezas semeia a incerteza e a dúvida, não parece ter um perfil político de combate - é disso que falamos - capaz de travar uma coligação claramente em recuperação, segundo as sondagens, provavelmente porque as pessoas começam a escolher qual o medo que vão votar. Tudo isto depende do que acontecer até final da campanha, mas não acredito que a coligação esteja interessada em cometer erros agora, quando pode muito bem aproveitar o desnorte e a surpresa reinante entre os socialistas.
A coligação PSD-CDS, mais agressiva, usa repetidamente Sócrates, a falência do pais, o pedido de ajuda externa, a troika, como referências a não esquecer pelos eleitores, sublinhando os riscos de uma vitória eleitoral do PS num regresso a esse passado recente. Paulo Portas, mais do que Passos, tem sido o responsável por esse discurso político mais contundente, de ataque directo ao PS. Ora é mais do que óbvio que o que os portugueses menos desejam, passados estes quatro anos de privações, que persistem, era uma espécie de regresso ao passado. E quanto a isso Costa, que até fez parte de um dos governos de Sócrates é usado pela coligação PSD-CDS como uma potencial e mais óbvia ameaça, insistindo na ideia de que os portugueses devem escolher tudo, menos votar no PS.
Associado a esta estratégias temos a impossibilidade de prognosticar com antecedência valores da abstenção ou da taxa de participação.
Pessoalmente tenho uma leitura muito pragmática do tema: tudo depende do impacto, negativo ou positivo, dessa estratégia do medo junto dos eleitores.
Explicando: cada vez mais me parece que as pessoas estão a ser encaminhadas para uma escolha, entre um alegado regresso ao passado e a continuidade da linha que a coligação PSD-CDS diz que é de recuperação.
Recuperação como? Vejamos alguns títulos de notícias divulgadas esta semana:

- o défice devido ao "contributo" do ex-BES ultrapassou os 7%;
- a UTAO diz que mesmo sem considerar o impacto do ex-BES, a dimensão do desvio orçamental na primeira metade do ano coloca em risco a meta de 2,7% do PIB para o défice - e até o cumprimento dos limites de Bruxelas - e que nem o facto de o segundo semestre ser habitualmente melhor garante que o Governo consiga alcançar o objectivo fixado;
- 365 mil novos processos por incumprimento de crédito;
- Economia portuguesa volta a ter défice externo;
- As famílias portuguesas estão a cortar na poupança, que caiu para um dos níveis mais baixos de sempre, ao mesmo tempo que canalizam a esmagadora maioria do rendimento disponível para consumo (95,8%).

Sem comentários: