sábado, abril 20, 2024

Sondagem Expresso/SIC: 34% preferem “líder forte” (e sem eleições). Colonialismo reúne visão favorável

Sondagem do Expresso e SIC mostra que, cinco décadas depois de Abril, a tecnocracia ainda colhe simpatia — e a ideia de um “líder forte” não eleito é defendida por 34%. Mais consensual é, porém, uma visão favorável da colonização. Falar de antifascismo em Portugal é coisa do passado? Cinco décadas depois da deposição do antigo regime, as opiniões dividem-se: 36% “concordam” ou “concordam totalmente” com a ideia de que é “uma coisa ultrapassada”, 35% “discordam” ou “discordam completamente” desta afirmação, e 23% “não concordam nem discordam”. Contudo, sinalizam os investigadores, cinco décadas volvidas desde a Revolução dos Cravos, “a rejeição explícita de formas de Governo incompatíveis com a democracia representativa é minoritária neste inquérito”. Conclui a sondagem — feita pelo ICS/ISCTE para Expresso e SIC — que embora a maioria (43%) negue que era “preferível que tivéssemos um líder forte que não tivesse de se preocupar com o Parlamento nem com eleições”, há um terço dos inquiridos favorável à ideia. Mais acentuada é a maioria (45%) que acredita que “as decisões mais importantes devem ser tomadas por especialistas e não por políticos”, contra 23% que discordam — o que desvenda algum ceticismo sobre o sistema político democrático assente em partidos.

Mas estes serão os dados mais dissonantes deste estudo sobre “Os portugueses e o 25 de Abril”. Por exemplo, a ideia de que “até 1974, Portugal estava melhor porque se apoiava numa identidade nacional defensora de valores tradicionais” é rejeitada por 43% e apoiada por 29%. Com ainda maior taxa de rejeição (54%) surge a tese de que “Portugal conquistaria a sua grandeza” se “os políticos portugueses seguissem os ideais de Salazar” — ainda que um quinto dos inquiridos afirme concordar com esta afirmação.

UM COLONIALISMO SOFT?

Se o estudo assinala que existem “variações importantes” quando se tenta estudar as atitudes políticas, o colonialismo português surge como o tema que reúne um consenso mais alargado — bastante imune às polémicas pontuais da discussão política ou às críticas veementes feitas sobretudo pelos partidos mais à esquerda. Assim, segundo este estudo de opinião, mais de metade dos inquiridos (56%) acreditam que os portugueses tiveram a capacidade de se “misturarem com os povos colonizados”. Apenas 16% dos inquiridos discordam desta visão da história colonial nacional. Mais, a maioria (52%) concorda também que “o colonialismo português foi fundamental para o desenvolvimento” dos povos colonizados. A rejeição a esta visão é ligeiramente maior, mas ainda assim nos 19%.

Esta perceção do “excecionalismo” português não é nova, tendo sido promovida como um dos pilares da identidade nacional pelo Antigo Regime. Para defender a manutenção das colónias — mesmo num período em que outros impérios coloniais tinham já chegado ao fim —, o regime alinhou na defesa de um “lusotropicalismo”, na identificação de “um conjunto de fenómenos e características específicas que teriam marcado o modelo colonial aplicado pelos portugueses nas regiões tropicais (...), tornando-o distinto das restantes experiências de colonização levadas a cabo por povos europeus”.

Na Academia — e no espaço político — esta perceção de “excecionalismo” é contestada, mas até entre os críticos há quem acredite na sua predominância na sociedade portuguesa. A sondagem parece assim apontar nessa mesma direção. Mais um exemplo aponta no mesmo sentido: em 2024, quase três em cada cinco inquiridos (58%) concordam que as “tensões e conflitos entre os portugueses e pessoas de outras origens que vivem em Portugal são menores” do que noutros países europeus. Apenas 14% discordam desta visão e 21% assumem uma posição neutra.

FICHA TÉCNICA

Sondagem cujo trabalho de campo decorreu entre os dias 20 de março e 4 de abril de 2024, resultando de uma parceria entre o Expresso e a SIC e a Comissão Comemorativa dos 50 Anos do 25 de abril. Foi coordenada por uma equipa do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (ICS-ULisboa) e do Iscte — Instituto Universitário de Lisboa (Iscte-IUL), tendo o trabalho de campo sido realizado pela GfK Metris. O universo da sondagem é constituído pelos indivíduos com idade igual ou superior a 18 anos e capacidade eleitoral ativa, residentes em Portugal continental. Os respondentes foram selecionados através do método de quotas, com base numa matriz que cruza as variáveis sexo, idade (4 grupos), instrução (3 grupos), região (5 regiões NUTII) e habitat/dimensão dos agregados populacionais (5 grupos). A partir de uma matriz inicial de região e habitat, foram selecionados aleatoriamente 145 pontos de amostragem, onde foram realizadas as entrevistas, de acordo com as quotas acima referidas. A informação foi recolhida através de entrevista direta e pessoal na residência dos inquiridos, em sistema CAPI (Computer Assisted Personal Interviewing). Foram contactados 4239 lares elegíveis (com membros do agregado pertencentes ao universo) e obtidas 1206 entrevistas válidas (taxa de resposta de 28%, taxa de cooperação de 41%). O trabalho de campo foi realizado por 47 entrevistadores, que receberam formação adequada às especificidades do estudo. Todos os resultados foram sujeitos a ponderação por pós-estratificação, de acordo com a frequência de prática religiosa e a pertença a sindicatos ou associações profissionais dos cidadãos portugueses com 18 ou mais anos residentes no Continente, a partir dos dados da vaga mais recente do European Social Survey (Ronda 10). A margem de erro máxima associada a uma amostra aleatória simples de 1206 inquiridos é de +/- 2,8%, com um nível de confiança de 95%. A maior parte das questões deste inquérito reproduz integralmente as de dois estudos anteriores, realizados em 2004 e 2014. O estudo de 2004 (“30 anos depois do 25 de Abril”) foi realizado pelo Centro de Estudos e Sondagens de Opinião da Universidade Católica Portuguesa para a RTP e o jornal “Público” e tinha uma amostra de 1214 inquiridos. O estudo de 2014 foi realizado pela GfK Metris para o ICS/ULisboa, o Expresso e a SIC e tinha uma amostra de 1254 inquiridos. Por sua vez, os questionários destes inquéritos foram parcialmente adaptados de um estudo do Centro de Investigaciones Sociológicas de Espanha (“Estudio 2401, 25 años después”, dezembro de 2000) sobre as atitudes da população espanhola em relação à transição para a democracia. Todas as percentagens são arredondadas à unidade, podendo a sua soma ser diferente de 100% (Expresso, texto dos jornalistas Cláudia Monarca Almeida e David Dinis e da jornalista infográfica Sofia Miguel Rosa)

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