sábado, junho 11, 2022

Expresso: PS testa posicionamento de Montenegro

 

Socialistas queriam saber se Montenegro se afastaria do PS nos grandes dossiês de Estado e, para já, a leitura foi de que nem aí haverá caminho. As respostas de vários deputados e governantes socialistas saíram quase a papel químico: “O PS vai manter-se onde sempre esteve.” O que isto quer dizer é que, para já, os socialistas não se vão adaptar ao novo ciclo no PSD e esperam sinais do líder eleito, Luís Montenegro, de que, em grandes matérias, estará disposto a consensualizar posições. “O Governo deu sinais no Orçamento do Estado da sua disponibilidade para falar com todos os partidos exceto com um. Agora, o sinal é dado de parte a parte, não é só o Governo que toma a iniciativa”, respondeu em entrevista ao Expresso Duarte Cordeiro, ministro do Ambiente e Alterações Climáticas e membro do núcleo duro do Executivo. A espera não se fez, no entanto, sem “testes” a Montenegro.

As palavras de António Costa a dizer que ia esperar pelo novo líder do PSD para avançar com a proposta definitiva para o novo aeroporto de Lisboa funcionou assim como uma espécie de “teste do algodão” ao diálogo do novo líder social-democrata. Os socialistas queriam saber se Montenegro se afastaria também do PS nos grandes dossiês de Estado, que sempre implicaram diálogo entre os dois grandes partidos e, para já, a leitura foi de que nem aí haverá caminho. “Basicamente, Luís Montenegro começa o seu mandato como líder do PSD demitindo-se do diálogo em torno de uma das grandes decisões estruturantes do nosso país”, diz ao Expresso um dirigente da bancada socialista.

Depois da frase de António Costa, a dizer que iria “esperar” pela tomada de posse do novo líder do PSD para saber se o “acordo” sobre a localização do novo aeroporto se mantinha, Montenegro disse que responderia a seu tempo, mas que registava a “confissão de incompetência” do primeiro-ministro. “Este tom é provocador e desagradável” e pode haver o risco de “o debate ir parar ao chão”, responde um governante. “É de quem não quer discutir os temas.” “Acha que é ocupando o espaço da extrema-direita que o conquista, mas só o amplia. Viu-se o mesmo no Reino Unido”, acrescenta outro parlamentar.

Este é um ponto essencial na leitura dos socialistas, se Montenegro, que não afastou o diálogo com o Chega em caso de necessidade, o for concretizando, os socialistas veem ali uma porta fechada. “Não augura nada de positivo que Luís Montenegro queira colocar o PSD em diálogo com a extrema-direita”, diz um deputado. O mesmo pensa Duarte Cordeiro, que denotou, na mesma entrevista, que é importante perceber o que será a relação com o CH. Até agora, “não sei o que o PSD pensa em relação a esse partido”, disse.

O PS passa a ideia de que se manterá como até aqui: “O PS deverá estar onde sempre esteve. Firme nos seus valores, dialogante com as forças democráticas e, com o PSD, em particular, nas questões que assim o exigem pela sua natureza — de regime, de soberania, da estabilidade que implica”, diz ao Expresso Miguel Costa Matos, vice-presidente da bancada parlamentar e líder da JS.

ESQUERDA FORA, PS RECENTRA?

Eurico Brilhante Dias, líder parlamentar do PS, espera para saber qual o seu interlocutor, mas no Parlamento há vários dossiês que os socialistas gostavam de consensualizar com os sociais-democratas. “Temos a ideia que temos de manter o diálogo, não podemos ficar em tudo só com o PAN e o Livre”, diz um deputado.

O calendário do PSD dificulta as negociações, mas tudo depende do que Montenegro fizer neste mês até ao congresso. Certo é que se o PSD não se definir, algumas propostas avançarão na mesma. Na calha há vários temas, como a Agenda do Trabalho Digno, a proposta da regulação das ordens profissionais, a lei das comunicações móveis, a resposta ao acórdão dos metadados ou ainda as alterações às normas da Autoridade da Concorrência. Se algumas destas matérias ainda podem passar para a próxima sessão legislativa, há outras que têm de ser aprovadas rapidamente, uma vez que são metas que têm de ser cumpridas ao abrigo do Plano de Recuperação e Resiliência.

Mais fruto da maioria absoluta do que do novo ciclo no PSD, a esquerda, no entanto, queixa-se de recuos do PS em medidas antes acordadas, como na Agenda do Trabalho Digno. Ainda esta quarta-feira, o “Jornal de Negócios” dava conta de retrocessos na regulação dos contratos dos trabalhadores das plataformas digitais, como a Uber ou a Glovo. Uma matéria que foi negociada à esquerda, sobretudo com o Bloco, e que é vista também dentro do PS como um sinal de “centramento” de algumas políticas (Expresso, texto da jornalista Liliana Valente)

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