terça-feira, maio 07, 2013

Opinião: "Vítor Gaspar inventou uma máquina que transforma o sofrimento em dinheiro"


"É ministro das Finanças a tempo inteiro, joga ténis ocasionalmente e nas horas vagas está a engendrar planos maquiavélicos para transformar o sofrimento dos portugueses em dinheiro. E nem Paulo Portas, que está sempre a esbracejar, ousa a mexer na engrenagem. Sempre que apresenta um pacote de austeridade cá dentro, Vítor Gaspar usa-o lá fora como  trunfo para abrir as portas dos mercados. Em Outubro de 2012, depois de apresentar um Orçamento de Estado com um aumento de impostos de que não há memória, Vítor Gaspar apressou-se a ir aos mercados numa operação de troca  de dívida que vencia em 2013  por outra que vence em 2015. No início deste ano, já depois de ter prometido à ‘troika' um astronómico plano de cortar a despesa em quatro mil milhões, Gaspar não perdeu tempo e avançou com uma emissão de dívida sindicada a cinco anos. Ontem, no primeiro dia útil após Passos Coelho ter apresentado um novo programa de austeridade, com mais impostos para os pensionistas e mais austeridade para a Função Pública, Vítor Gaspar voltou à carga e contratou seis bancos para ajudarem Portugal a vender dívida  no mercado com uma maturidade a dez anos. Ainda nem os funcionários públicos e pensionistas  tinham recuperado do susto,  e já Gaspar se alardeava lá fora com o novo plano para convencer os credores a comprar dívida  portuguesa. Já o chamaram de muita coisa: tecnocrata, ministro da ‘troika', ministro tóxico, incompetente, não acerta numa única previsão. E faz as delícias dos comentadores: Marques Mendes já o acusou de tratar os portugueses como "atrasados mentais" e Marcelo Rebelo de Sousa já disse que Gaspar  mais parece um astrólogo  do que um ministro das Finanças.
Goste-se ou não se goste, Vítor Gaspar veio para o Governo com uma missão: criar condições para que Portugal regresse aos mercados. E vai consegui-lo. E caso  a emissão de dívida a dez anos corra bem, Gaspar ganha ainda  mais peso dentro do Governo, o que não é necessariamente bom. O ministro das Finanças não está preocupado com sua popularidade cá dentro, o que não é necessariamente mau. Gaspar prefere um bom elogio de um tecnocrata nos corredores de Bruxelas ou umas palmadinhas nas costas de Wolfgang Schaeuble do que os aplausos de dez milhões de portugueses. Aliás, a frase que disse  na semana passada a Ana Drago no Parlamento - "Eu não fui eleito coisíssima nenhuma" - diz tudo. Vítor Gaspar não foi eleito. Mas sente-se um eleito. E tem uma missão, que se tornou numa obsessão: o regresso aos mercados. O ministro das Finanças não gosta de jogos políticos. Mas já se percebeu que detesta perder. E por isso é ele que define as próprias regras do jogo. Para Gaspar a vitória é o regresso aos mercados. O resto são danos colaterais. Numa altura em que o discurso  do crescimento faz caminho  na Europa, Vítor Gaspar continua  a jogar o jogo da austeridade.  E tal como um autómato, só vai parar quando Passos Coelho ou Schaeuble lhe desligarem o botão da austeridade. Conseguido  o regresso aos mercados, é altura de Passos Coelho mandar  a máquina de Gaspar para  a sucata. Tem um defeito  de fabrico: produz austeridade, mas não gera crescimento" (texto de Pedro Sousa Carvalho, Económico com a devida vénia)