"Os empresários
andam entretidos a discutir as políticas mais ou menos conservadoras dos bancos
na concessão de crédito, como se a o principal problema do país fosse a falta
de crédito na última década, mas ainda não perceberam que os níveis de
exigência e de gestão de risco vão ainda aumentar por causa do novo modelo de
resgate dos bancos europeus. E bem.
A economia
portuguesa, é certo, tem hoje um problema de acesso a financiamento, demasiado
caro quando comparado com o de outros países europeus, e isso torna difícil uma
reorientação do financiamento dos bancos, que deixaram de emprestar a quem não
deviam mas ainda não estão a financiar o que deveria ser financiado. Logo, a
reestruturação da própria economia será necessariamente mais lenta, quando
todos pedem urgência. É, claro, o preço que estamos, colectivamente, a pagar
por uma economia que viveu, mas não cresceu, à custa do crédito, sem avaliação
de risco, sem critério. A história do passado recente do país é conhecida, mas
os empresários - e muitos políticos - continuam a promover a discussão no mesmo
enquadramento, como se nada tivesse mudado. E mudou, como os cipriotas já perceberam,
à sua própria custa.
Todos -
empresários incluídos - pedem a união bancária como se fosse a solução de todos
os problemas, como se, a partir desse momento, a banca pudesse emprestar como o
fazia antes da crise de 2008/2009. Não é verdade, em nenhum dos casos. E ainda
bem. A saída para a crise, para as empresas, para o investimento, tem de passar
por outras coisas, desde logo, gestão.
A união
bancária visa separar o que se considera o risco dos bancos do risco dos
países, peça essencial em particular para países intervencionados como
Portugal, porque permitirá que os bancos tenham acesso a financiamento a um
preço competitivo, independentemente da situação económica e financeira do
próprio país. Isto não será, nunca, assim, porque um banco exposto a uma
economia não pode, como é evidente, separar o seu risco do risco país. Mas,
dando esta questão de barato, há outra dimensão que vai mudar as práticas de
gestão bancária, e torná-las mais exigentes: a união bancária, a criação de um fundo
de garantia europeu de depósitos e de um fundo de resolução, é a peça que falta
para mudar o modelo de resgate dos bancos, que tem sido, basicamente, suportado
pelos contribuintes.
O regime de intervenção já deveria ter mudado, os contribuintes
já deveriam ser os últimos a pagar a salvação dos bancos, os accionistas,
claro, têm de ser os primeiros, mas, logo a seguir, vêm os depositantes acima
dos 100 mil euros, como determina a lei europeia. E bem. Ora, este risco, isto
é, a partilha de custos de uma salvação de um banco por accionistas e
depositantes só pode ser gerido com uma gestão mais prudencial, mais exigente.
A pressão sobre os banqueiros vai aumentar, não só dos accionistas, porque essa
já existe, mas, novidade, dos depositantes. E isso vai ter uma consequência:
mesmo com um acesso a financiamento mais acessível, a avaliação de risco das
empresas vai mudar, vai ser mais restritiva, e as diferenças de ‘pricing' vão
reflectir isso mesmo. Porque o dinheiro que um banco tem à sua guarda - e que é
a principal fonte de ‘funding' para financiar quem precisa de dinheiro - é dos
clientes, é de quem confia na responsabilidade de gestores (texto
de António Costa, Económico, com a devida vénia)