quinta-feira, maio 16, 2013

Opinião: "O que os empresários ainda não perceberam"



"Os empresários andam entretidos a discutir as políticas mais ou menos conservadoras dos bancos na concessão de crédito, como se a o principal problema do país fosse a falta de crédito na última década, mas ainda não perceberam que os níveis de exigência e de gestão de risco vão ainda aumentar por causa do novo modelo de resgate dos bancos europeus. E bem.
A economia portuguesa, é certo, tem hoje um problema de acesso a financiamento, demasiado caro quando comparado com o de outros países europeus, e isso torna difícil uma reorientação do financiamento dos bancos, que deixaram de emprestar a quem não deviam mas ainda não estão a financiar o que deveria ser financiado. Logo, a reestruturação da própria economia será necessariamente mais lenta, quando todos pedem urgência. É, claro, o preço que estamos, colectivamente, a pagar por uma economia que viveu, mas não cresceu, à custa do crédito, sem avaliação de risco, sem critério. A história do passado recente do país é conhecida, mas os empresários - e muitos políticos - continuam a promover a discussão no mesmo enquadramento, como se nada tivesse mudado. E mudou, como os cipriotas já perceberam, à sua própria custa.
Todos - empresários incluídos - pedem a união bancária como se fosse a solução de todos os problemas, como se, a partir desse momento, a banca pudesse emprestar como o fazia antes da crise de 2008/2009. Não é verdade, em nenhum dos casos. E ainda bem. A saída para a crise, para as empresas, para o investimento, tem de passar por outras coisas, desde logo, gestão.
A união bancária visa separar o que se considera o risco dos bancos do risco dos países, peça essencial em particular para países intervencionados como Portugal, porque permitirá que os bancos tenham acesso a financiamento a um preço competitivo, independentemente da situação económica e financeira do próprio país. Isto não será, nunca, assim, porque um banco exposto a uma economia não pode, como é evidente, separar o seu risco do risco país. Mas, dando esta questão de barato, há outra dimensão que vai mudar as práticas de gestão bancária, e torná-las mais exigentes: a união bancária, a criação de um fundo de garantia europeu de depósitos e de um fundo de resolução, é a peça que falta para mudar o modelo de resgate dos bancos, que tem sido, basicamente, suportado pelos contribuintes.
O regime de intervenção já deveria ter mudado, os contribuintes já deveriam ser os últimos a pagar a salvação dos bancos, os accionistas, claro, têm de ser os primeiros, mas, logo a seguir, vêm os depositantes acima dos 100 mil euros, como determina a lei europeia. E bem. Ora, este risco, isto é, a partilha de custos de uma salvação de um banco por accionistas e depositantes só pode ser gerido com uma gestão mais prudencial, mais exigente. A pressão sobre os banqueiros vai aumentar, não só dos accionistas, porque essa já existe, mas, novidade, dos depositantes. E isso vai ter uma consequência: mesmo com um acesso a financiamento mais acessível, a avaliação de risco das empresas vai mudar, vai ser mais restritiva, e as diferenças de ‘pricing' vão reflectir isso mesmo. Porque o dinheiro que um banco tem à sua guarda - e que é a principal fonte de ‘funding' para financiar quem precisa de dinheiro - é dos clientes, é de quem confia na responsabilidade de gestores (texto de António Costa, Económico, com a devida vénia)