quinta-feira, maio 16, 2013

Opinião: "O fim da linha para Gaspar"


"Conta-se que Henry Kissinger só lia a terceira versão dos relatórios enviados pelos seus colaboradores.Nas primeiras versões, escrevia na primeira página: "É capaz de fazer melhor". E mandava devolver. O Documento de Estratégia Orçamental (DEO), divulgado pelo Governo na terça-feira ao fim do dia, merecia tratamento semelhante. Vítor Gaspar é capaz de melhor. O propósito do DEO é apresentar a estratégia de consolidação das contas públicas para os próximos quatro anos, neste caso, até 2017. Tendo em conta que neste momento o défice e a dívida pública são dos problemas mais graves da economia nacional, este documento tinha uma importância reforçada. Para mais quando o Governo já prometeu várias vezes apresentar as medidas que concretizam a reforma do Estado. Pois bem, nada disso. Num documento de 45 páginas, o capítulo reservado às "Perspectivas de Médio Prazo para as Finanças Públicas 2013-2017" tem três páginas, tantas como o índice.  
O documento avança com um conjunto alargado de números, previsões e projecções mas não explica como se vão concretizar. Ou seja, esquece-se de apresentar as medidas para transformar as previsões em realidade. Fala em descida do défice e da dívida pública, em recuperação da economia, em agravamento de austeridade, que atingirá agora 6,5 mil milhões de euros entre este ano e 2017, explicando quase nada. Desta forma, o DEO é mais um conjunto de palpites do que uma estratégia consistente de consolidação orçamental. 
É verdade que tem indicações importantes: mais de metade da redução da despesa pública será conseguida com cortes nas despesas com funcionários públicos e nas prestações sociais. Os famosos consumos intermédios continuam a resistir e são a rubrica que menos cai até 2017. Ou seja, antecipam-se más notícias para funcionários públicos e pensionistas mas será necessário esperar mais alguns dias para conhecer as novas medidas de austeridade. O DEO não diz nada. 
O que falta em respostas às dúvidas dos portugueses, sobra em considerações políticas. Vítor Gaspar decidiu usar o DEO para explicar qual é o seu entendimento sobre o papel do ministro das Finanças e enviou recados para os colegas do Executivo. "A especificação das medidas necessárias para alcançar o esforço [da reforma do Estado] é uma responsabilidade do Governo como um todo". Há muito que Vítor Gaspar está isolado no Executivo. A sua visão financeira não é partilhada pela maioria dos outros ministros do CDS e PSD. A divisão é cada vez mais profunda e está a bloquear o Governo, com os Conselhos de Ministros a transformarem-se em maratonas improdutivas. Por isto, Gaspar manda recados para os seus colegas, pedindo coesão.
O ministro não compreende que provoca mais discórdia do que entendimentos. Gaspar teve um papel importante no relacionamento com a ‘troika'. Essa função esgotou-se. Este ministro das Finanças chegou ao fim da linha. Agora faz parte do problema e não da solução. Reitero o que já escrevi: Passos Coelho tem que remodelar Vítor Gaspar se quiser salvar o Governo" (texto de Bruno Proença, Económico, com a devida vénia)