terça-feira, maio 21, 2013

Opinião: "Portugal depois da ‘troika’: a crise ainda cá estará"



"O Presidente da República reúne hoje os conselheiros de Estado para debater o País depois da ‘troika'. A ideia parece estranha. O Governo está mergulhado numa crise com dirigentes do CDS a fazerem ameaças diárias nos jornais de rompimento da coligação.
O Presidente da República reúne hoje os conselheiros de Estado para debater o País depois da ‘troika'. A ideia parece estranha. O Governo está mergulhado numa crise com dirigentes do CDS a fazerem ameaças diárias nos jornais de rompimento da coligação. A sétima avaliação da ‘troika' foi um longo pesadelo que permitiu perceber que os tempos do bom aluno acabaram.
Os credores exigem cortes cada vez mais duros mas os portugueses estão cansados de austeridade e a força política de Pedro Passos Coelho está a esgotar-se. Resumindo, querer debater o País depois do Verão de 2014 parece um deliro de Cavaco Silva quando todos temos a sensação de que a situação social e política pode rebentar a qualquer momento. Há cada vez mais dúvidas de que o Governo resista ao Verão quente de contestação social - os professores são os primeiros a irem para a rua - e à aprovação do Orçamento do Estado para 2014.
Paradoxalmente, é por isto mesmo que o Presidente da República tem de se preparar para a crise que aí vem. Desde logo, Cavaco Silva não podia colocar na ordem de trabalhos deste Conselho de Estado a crise política que marca a actualidade. Seria lançar petróleo para a fogueira. Seria reconhecer que poderia detonar a bomba atómica e fazer cair o Governo. Por isto, prefere ouvir a opinião dos conselheiros de Estado sobre como estará o País daqui a um ano. Na verdade, o debate é basicamente o mesmo. O Executivo de Pedro Passos Coelho dificilmente resistirá à saída da ‘troika'. A crise económica e política continuará por cá. O Presidente da República terá que conhecer as opções em cima da mesa.
A ‘troika' tem todo o interesse em ir embora no Verão de 2014. As próximas avaliações serão difíceis porque a consolidação orçamental não está assegurada mas a Comissão Europeia, FMI e BCE necessitam de casos de sucesso para provarem que as suas políticas fazem sentido. Por isso, vão querer concluir o plano de intervenção. Até porque não querem um segundo resgate que significaria mais dinheiro para a economia nacional.
Isto não significa que Portugal recuperará totalmente a sua independência financeira. É difícil de acreditar que os mercados vão financiar os mais de 15 mil milhões de euros de dívida anual de médio e longo prazo que a economia continuará a necessitar a uma taxa de juro comportável para o País. Assim, continuaremos a necessitar de apoio externo. O Governo já percebeu isso e está a fazer o caminho, emitindo dívida pública a prazos mais longos, para recorrer ao mecanismo que está a ser criado pelo Banco Central Europeu. Porém, isso terá uma factura. O BCE continuará a exigir medidas detalhadas que garantam a consolidação orçamental e a redução da dívida pública. Conclusão, Portugal continuará debaixo de um plano de intervenção. Embora, publicamente tenha uma aparência mais ‘light'.
A este contexto de pressão externa soma-se uma economia europeia que continuará depressiva. A recuperação económica estará mais no campo das palavras e dos desejos. O desemprego tenderá a subir bem para lá da barreira do milhão de pessoas, bem como o descontentamento e a contestação social. Como se vê, o Portugal depois da ‘troika' não estará melhor do que hoje. O País não se transformará num paraíso de um momento para o outro. 
Neste cenário, o Governo de Passos Coelho e Portas e Gaspar estará ainda mais esgotado mas sem a pressão da ‘troika' que tem garantido os últimos entendimentos - "a bem ou a mal" - para cumprir as obrigações internacionais. Na altura, o País estará a exigir outra solução governativa com mais crédito para negociar com o BCE e com novas ideias para tentar relançar a economia. Por isto, Cavaco Silva tem razão quando quer começar a perceber hoje que Governo poderá ter na altura: um saído de eleições antecipadas ou um bloco central com o PS mas sem Passos e Gaspar?" (texto de Bruno Proença, Económico com a devida vénia)