sexta-feira, maio 24, 2013

Opinião: "A Europa não resolve os nossos problemas"



"O comunicado que faz o resumo do último Conselho de Estado é um documento perigoso. Primeiro, porque já se percebeu que conta apenas uma parte da história.
Por imposição do Presidente da República, não descreve o debate entre os conselheiros sobre a crise social e política, nomeadamente a fragilidade do Governo e que opções de estabilidade política podem estar em cima da mesa. Segundo, e mais importante, porque só fala da Europa. Quem lê os cinco pontos do comunicado, retira a conclusão de que todas as soluções para os problemas de Portugal depois da ‘troika' estão na União Europeia.
O texto fala do "quadro de uma União Económica e Monetária efectiva e aprofundada", "da criação da União Bancária", "do reforço da coordenação das políticas económicas e da criação de um instrumento financeiro de solidariedade destinado a apoiar as reformas estruturais dos Estados-membros" e ainda de "um adequado equilíbrio entre disciplina financeira, solidariedade e estímulo à actividade económica". Estas expressões politicamente correctas são um vácuo mas transmitem a ideia de que Portugal já não tem que fazer mais nada. A salvação chegará da Europa.
Este acto de fé é partilhado por grande parte da esquerda, nomeadamente o PS, mas infelizmente não é verdadeiro. O fracasso da economia nacional continua a centrar-se na falta de competitividade externa devido a um problema de produtividade. Esta questão apenas poderá ser resolvida pelos portugueses e depende de várias reformas. A primeira de todas, uma mudança de mentalidades perante o trabalho e a gestão do tempo e dos recursos. Há que perceber que são escassos e, portanto, deve-se fazer o máximo com menos. Depois, apostar na educação de empresários e trabalhadores para melhorar os níveis de gestão e a qualidade das empresas. Terceiro, como reclama a ‘troika', estimular a concorrência nos diferentes mercados. Por fim, acabar com o nacional porreirismo nas empresas e na função pública e avançar com verdadeiros sistemas de avaliação que permitam instituir a meritocracia.
São estas mudanças que garantem o regresso do crescimento económico sustentado e dependem muito pouco da Europa. É verdade que outra União Europeia facilitaria a vida a Portugal. As exportações teriam outro espaço para crescer, a União Bancária poderia trazer financiamento mais barato e a política orçamental europeia poderia reforçar o investimento estrangeiro na economia nacional. Mas é pouco provável que venha a acontecer.
A leitura da entrevista de Eduardo Lourenço, ao "Público", é boa para perceber a profundidade da crise europeia. O ensaísta conclui que "não há uma ideia europeia". As identidades nacionais continuam a impor-se a um projecto de centralidade europeia. Não há uma identidade europeia porque os países têm séculos de História e culturas muito diversas. Os ganhos económicos são insuficientes para apagar a História. Assim, mais do que confiarem numa grande solução europeia, os portugueses devem focar-se em resolver os problemas complicados que têm pela frente. Apostar tudo na Europa é o mesmo que apostar num cavalo coxo" (texto de Bruno Proença, Económico, com a devida vénia)