"O comunicado que faz o resumo do
último Conselho de Estado é um documento perigoso. Primeiro, porque já se
percebeu que conta apenas uma parte da história.
Por
imposição do Presidente da República, não descreve o debate entre os
conselheiros sobre a crise social e política, nomeadamente a fragilidade do
Governo e que opções de estabilidade política podem estar em cima da mesa.
Segundo, e mais importante, porque só fala da Europa. Quem lê os cinco pontos
do comunicado, retira a conclusão de que todas as soluções para os problemas de
Portugal depois da ‘troika' estão na União Europeia.
O
texto fala do "quadro de uma União Económica e Monetária efectiva e
aprofundada", "da criação da União Bancária", "do reforço
da coordenação das políticas económicas e da criação de um instrumento
financeiro de solidariedade destinado a apoiar as reformas estruturais dos
Estados-membros" e ainda de "um adequado equilíbrio entre disciplina
financeira, solidariedade e estímulo à actividade económica". Estas
expressões politicamente correctas são um vácuo mas transmitem a ideia de que
Portugal já não tem que fazer mais nada. A salvação chegará da Europa.
Este
acto de fé é partilhado por grande parte da esquerda, nomeadamente o PS, mas
infelizmente não é verdadeiro. O fracasso da economia nacional continua a
centrar-se na falta de competitividade externa devido a um problema de
produtividade. Esta questão apenas poderá ser resolvida pelos portugueses e
depende de várias reformas. A primeira de todas, uma mudança de mentalidades
perante o trabalho e a gestão do tempo e dos recursos. Há que perceber que são
escassos e, portanto, deve-se fazer o máximo com menos. Depois, apostar na
educação de empresários e trabalhadores para melhorar os níveis de gestão e a
qualidade das empresas. Terceiro, como reclama a ‘troika', estimular a
concorrência nos diferentes mercados. Por fim, acabar com o nacional
porreirismo nas empresas e na função pública e avançar com verdadeiros sistemas
de avaliação que permitam instituir a meritocracia.
São
estas mudanças que garantem o regresso do crescimento económico sustentado e
dependem muito pouco da Europa. É verdade que outra União Europeia facilitaria
a vida a Portugal. As exportações teriam outro espaço para crescer, a União
Bancária poderia trazer financiamento mais barato e a política orçamental
europeia poderia reforçar o investimento estrangeiro na economia nacional. Mas
é pouco provável que venha a acontecer.
A
leitura da entrevista de Eduardo Lourenço, ao "Público", é boa para
perceber a profundidade da crise europeia. O ensaísta conclui que "não há
uma ideia europeia". As identidades nacionais continuam a impor-se a um
projecto de centralidade europeia. Não há uma identidade europeia porque os
países têm séculos de História e culturas muito diversas. Os ganhos económicos
são insuficientes para apagar a História. Assim, mais do que confiarem numa
grande solução europeia, os portugueses devem focar-se em resolver os problemas
complicados que têm pela frente. Apostar tudo na Europa é o mesmo que apostar
num cavalo coxo" (texto de Bruno Proença, Económico,
com a devida vénia)