sábado, maio 25, 2024

Taxa de risco de pobreza aumentou para 17% no ano passado e afecta mais estes grupos específicos

A taxa de risco de pobreza diminuiu em 2022 para 16,4% e subiu para 17% em 2023. A incidência da pobreza é maior entre os desempregados (41,3%), famílias monoparentais (29,9%) e indivíduos menos escolarizados (21,9%). Os dados são do relatório “Portugal, Balanço Social 2023” da Fundação “la Caixa”, BPI e Nova SBE. Também a taxa de risco de pobreza das mulheres é mais alta do que a os homens (16,8% vs. 15,9%); e os trabalhadores com contratos temporários enfrentam um risco de pobreza três vezes superior ao dos trabalhadores com contratos permanentes (20,6% e 7,4%, respectivamente). Em 2023, a taxa de risco de pobreza (17%) voltou a aumentar, atingindo assim mais de 1,8 milhões de pessoas, ou seja, um acréscimo de 60 mil pessoas em situação de pobreza. Embora o aumento na prevalência da pobreza se reflicta em todos os grupos etários, é mais pronunciado nas crianças, cuja taxa de risco de pobreza aumentou 2,2 pontos percentuais face a 2022. Os desempregados continuam com uma taxa de risco de pobreza mais de quatro vezes superior (46,4%) à das pessoas empregadas (10,0%).

O documento, da autoria de Susana Peralta, Bruno P. Carvalho e Miguel Fonseca, que integram o Nova SBE Economics for Policy Knowledge Center, analisa a situação socioeconómica das famílias em Portugal a partir do rendimento, da privação material, das condições de habitação, do acesso à educação e saúde e estabelece relações entre pobreza, situação laboral e nível de educação. A quarta edição do balanço dedica um capítulo à saúde mental e bem-estar e um capítulo às percepções, expectativas e confiança nas Instituições.

Privação

Em 2022, a taxa de privação material e social diminuiu: 12% das pessoas encontravam-se em situação de privação material e social e 5,3% em situação de privação material e social severa. A população pobre reporta mais doenças crónicas e prolongadas (50,6% vs. 43,5% para a população não pobre) e maior privação nos cuidados de medicina dentária (39,3% vs. 13,7%). Na habitação são reveladas carências muito significativas: 20,5% das famílias pobres viviam em alojamentos sobrelotados (face a 7,2% da população não pobre) e mais de 33% dos agregados pobres em Portugal têm encargos com a habitação que excedem 40% do rendimento do agregado (face a 6,6% da população não pobre).

Impacto da inflação nas condições de vida

O aumento da inflação teve um impacto significativo nas condições de vida em Portugal, ao longo dos anos de 2022 e 2023, com especial impacto na população pobre. Verifica-se um aumento na insatisfação económica e nas dificuldades para chegar ao fim do mês da população pobre e da população não pobre, bem como um aumento da prevalência de sobre-endividamento entre os não pobres. A insatisfação económica é especialmente frequente na população pobre, afectando quase dois terços dos indivíduos.

A percentagem de pessoas pobres que enfrentam privações aumentou entre 2021 e 2022 (revelando dificuldades no cumprimento de despesas essenciais como o aquecimento da casa, a alimentação adequada e o acesso a serviços médicos) contrariamente à população não pobre em que se verificou a uma diminuição geral da privação.

Diferenças regionais

A prevalência da pobreza é maior nas Regiões Autónomas. A taxa de risco de pobreza é a mais elevada na Madeira, com 10 pontos percentuais acima da média nacional, seguida dos Açores (com nove pontos percentuais acima da média nacional). A taxa de privação material e social severa desceu em todas as regiões de Portugal entre 2021 e 2022, com a excepção dos Açores, que também é a região onde o nível de desigualdade mais aumentou.

Em 2023, a taxa de risco de pobreza diminuiu ligeiramente em todas as regiões, excepto em Lisboa (onde se registou um acréscimo de 4,3 pontos percentuais) e na região autónoma dos Açores. O Algarve, apesar da redução de 2,4 pontos percentuais face a 2022, continua a ser a região continental com a maior taxa de risco de pobreza (19,7%).

Grupos etários

Embora a taxa de risco de pobreza entre as crianças tenha diminuído entre 2021 e 2022 (de 20,4% para 18,5%), este grupo continua a ser um dos mais vulneráveis a situações de pobreza e exclusão social. Em 2022 há mais de 302 mil menores pobres em Portugal. A taxa de risco de pobreza entre as pessoas com 65 ou mais anos também diminuiu neste período, mas há ainda 416 mil pessoas pobres neste grupo etário.

Saúde mental e bem-estar

Quase 60% da população em risco de pobreza não faz exercício físico frequentemente (mais 11 pontos percentuais do que a população não pobre). Identifica-se ainda o consumo de fruta e/ou legumes e saladas pouco frequente (6% e 7%, respectivamente) e consumos mais elevados de tabaco (16,4% vs. 15% para a população não pobre) e bebidas alcoólicas (38,7% vs. 32,4% para a população não pobre).

No dia-a-dia, a população pobre demonstra maiores dificuldades quotidianas: 29% reportam dificuldades de visão (+10 pontos percentuais do que a população não pobre), 24% reportam dificuldades de memória ou concentração (+6,7 pontos percentuais do que a população não pobre), e quase 15% reportam dificuldades em ouvir ou caminhar.

Quase 16% das pessoas em risco de pobreza afirmam que raramente ou quase nunca se sentiram felizes (mais do dobro do que a população não pobre). No que toca à satisfação com as relações pessoais, 5,4% dos pobres reporta um nível baixo de satisfação (um valor mais de 3 vezes superior ao dos não pobres).

A população em risco de pobreza é mais susceptível ao isolamento social. Entre os pobres, 12,9% reportam ter-se sentido só, e 8,3% ter-se sentido excluídos – mais do dobro das proporções entre os não pobres, em ambos os casos. A população em risco de pobreza indica também mais frequentemente não ter participado em actividades lúdicas (quase 6%), e ter poucos encontros com familiares (11%) e com amigos (15%).

Percepções, expectativas e confiança nas Instituições

O descontentamento das pessoas que têm dificuldades económicas é muito elevado e atinge mais de 90% com a situação actual de Portugal, da economia portuguesa e do mercado de trabalho português, em 2023. A inflação é apontada com o problema mais relevante em Portugal, seguindo-se da saúde e da situação económica.

As pessoas com dificuldades financeiras revelam falta de confiança nas instituições: 97% não confia nos partidos políticos, 82,5% na justiça e cerca de 66% no Governo ou nas Câmaras Municipais, o que compara com 75%, 46% e 56%, respectivamente, para as pessoas sem dificuldades financeiras. As pessoas que têm dificuldades para pagar as contas declaram menor satisfação com a democracia do que as que vivem numa situação económica mais confortável (56,4% vs. 30,8%, respectivamente) (HR Portugal, texto da jornalista Margarida Lopes)

Sem comentários: