terça-feira, maio 07, 2013

Opinião: "Quem poderemos culpar pela crise?"

"Um dos esforços mais notáveis a que muitos portugueses, sobretudo os ligados à política, se dedicam é ao de arranjar culpados. Passos, Gaspar, Sócrates, Barroso, Cavaco, Guterres, Soares e quem mais for, são nomes constantemente citados. Não pretendo que qualquer um deles esteja isento de culpas, mas não sou daqueles que pensa que tudo o que nos acontece tem um culpado definido.
Ontem, numa conferência sobre Futuro Sustentável, organizada pelo Expresso e pelo BES, ouvi o ministro espanhol da Agricultura e Ambiente, Miguel Arias Cañete, fornecer dados como este: se todos os sete mil milhões de pessoas no mundo tivesse o mesmo tipo de vida do que a população dos EUA (314 milhões) seriam necessários seis planetas para fornecer as suas necessidades. Se fosse o estilo de vida francês (61,5 milhões) seriam necessárias três terras. Calculo que se fosse o português seriam necessárias cerca de duas terras.
Outro dado: os maiores aumentos de consumo de alimentos têm sido de açúcar na Rússia, de leite no Brasil e de carne na China. Outro dado ainda: no mesmo período em que a população da terra aumentou 100% a área cultivável em todo o mundo só aumentou 10%.
Não quero ser depressivo, nem fazer como Thomas Malthus, no séc. XIX, que previa, erradamente (e somos a prova disso) que não haveria comida para todos dentro de um curto prazo, uma vez que o crescimento da população era muito superior ao do crescimento dos bens necessários à sua sobrevivência. Quero apenas que pensemos nestes dados e na sua relação com a enorme crise que os países desenvolvidos estão a passar - e continuarão a passar.
Embora boa parte das receitas dependa da vontade do homem, muitas premissas que nos trouxeram até aqui escapam completamente a qualquer engenharia humana. Os pobres comem melhor - açúcar, carne, leite. Os ocidentais vivem de modo não sustentável - se quisermos estender o nosso modo de vida a todos os seres humanos. O desafio é sempre o mesmo - produzir mais com os mesmos (ou com menos) recursos, de forma sustentada, com menos poluição, sem colocar em causa a biodiversidade, sem esgotar os recursos, os solos, as pescas, as florestas.
São questões como estas que me levam a pensar que os bons políticos não são os que querem responder à pergunta 'de quem é a culpa', mas sim à pergunta 'qual é a solução?'
Esses são os que escasseiam" " (texto de Henrique Monteiro, Expresso com a devida vénia)