"Em
factos, a austeridade é fatal há dois anos. Mas faltava uma voz insuspeita e
prudente que dissesse que não podemos continuar assim. Os factos é que nos
determinam, mas as vozes é que nos mudam. Antes, perante a crise financeira
mundial, que vinha de 2008, era preciso um sobressalto nacional em busca de uma
solução que tinha de ser comum - esses, os factos - mas, apesar disso, nem o
PS, entorpecido pelo cerco, nem o PSD e CDS, encandeados pelo pote próximo,
souberam encontrar vozes lúcidas e unificadoras. Na crise das últimas
legislativas (2011), o País dividiu-se entre uns e outros, sem pontos de
contacto. Um país, dois mundos. Dois mundos e duas explicações, e assim ficámos
- apesar de a realidade evidenciar que não era esse o caminho. Faltou uma voz.
O que se seguiu, o gasparismo - uma não-política (porque política são
compromissos) só possível pelo sectarismo atrás descrito -, também parecia ir
beneficiar das claques separadas por trincheiras: os seus, a favor, os outros,
contra. Ora, na semana passada, ergueu-se uma voz contra entre os que, até
aqui, eram por. António Lobo Xavier, insuspeito de ser da oposição e prudente
por natureza, fez uma crítica radical: o apelo à troika de 2011 podia não ter
existido. Disse ele: se não fosse a sofreguidão pelo pote, estaríamos como
Espanha, combatendo a crise sem perder a soberania. Pronto, houve voz. Mudem-se
os factos. O que já não é possível com este Governo" (texto de Ferreira
Fernandes, DN de Lisboa, com a devida vénia)