segunda-feira, novembro 12, 2012

FALSA EVIDÊNCIA: A CRISE GREGA PERMITIU QUE FINALMENTE SE AVANÇASSE PARA UM GOVERNO ECONÓMICO E UMA VERDADEIRA SOLIDARIEDADE EUROPEIA

"A partir de meados de 2009, os mercados financeiros começaram a especular sobre as dívidas dos países europeus. Globalmente, o forte aumento das dívidas e dos deficits públicos à escala mundial (ainda) não acarretou a alta das taxas de juro de longo prazo: os operadores financeiros pensam que os bancos centrais manterão bastante tempo as taxas de juro reais a um nível próximo de zero e que não há risco de inflação ou de incumprimento ("défaut") por parte de um grande país. Mas os especuladores perceberam as falhas da organização da zona euro. Enquanto os governos dos outros países desenvolvidos podem sempre ser financiados pelos seus respectivos bancos centrais, os países da zona euro renunciaram a essa possibilidade, e dependem totalmente dos mercados financeiros para o financiamento dos seus deficits. Em consequência, a especulação pôde desencadear-se sobre os países mais frágeis da zona euro: a Grécia, a Espanha, a Irlanda. As instâncias europeias e os governos tardaram em reagir, não querendo dar a impressão de que os países membros tinham direito a um apoio sem limite por parte dos seus parceiros e querendo sancionar a Grécia, culpada de haver mascarado – com a ajuda da Goldman Sachs – a dimensão dos seus deficits. Todavia, em Maio de 2010, o BCE e os países membros tiveram que criar, com urgência, um Fundo de estabilização para indicar aos mercados que aportariam um apoio sem limite aos países ameaçados. Em contrapartida, estes países foram obrigados a anunciar programas de austeridade orçamental sem precedentes, que irão condená-los a um longo período de recessão. Sob pressão do F.M.I. e da Comissão Europeia, a Grécia teve que privatizar os seus serviços públicos e a Espanha que flexibilizar o seu mercado de trabalho. Mesmo a França e a Alemanha, que não estão sob a ameaça da especulação, anunciaram medidas restritivas. No entanto, globalmente, a procura não é de modo algum excessiva na Europa. A situação das finanças públicas é melhor do que a dos Estados Unidos ou da Grã-Bretanha, permitindo uma ampla margem de manobra orçamental. É preciso reabsorver os desequilíbrios de um modo coordenado: os países excedentários do Norte e do Centro da Europa devem levar a cabo políticas expansionistas – alta dos salários e das despesas sociais – para compensar as políticas restritivas dos países do Sul. Globalmente, a política orçamental não deve ser restritiva na zona euro, enquanto a economia europeia não se aproxime do pleno emprego a uma velocidade satisfatória. Mas os partidários das políticas orçamentais automáticas e restritivas na Europa estão hoje, infelizmente, numa posição reforçada. A crise grega permite fazer esquecer as origens da crise financeira. Aqueles que aceitaram apoiar financeiramente os países do Sul querem impor, em contrapartida, um endurecimento do Pacto de estabilidade. A Comissão e a Alemanha querem impor a todos os países membros a inscrição do objectivo do equilíbrio orçamental nas suas constituições e exercer uma vigilância da política orçamental por comités de peritos independentes. A Comissão quer impor a todos os países uma longa cura de austeridade para regressarem a uma dívida pública inferior a 60 % do PIB. Se há um avanço no sentido de um governo económico europeu é um avanço para um governo que, em vez de desapertar o garrote da finança, quer impor a austeridade e aprofundar as "reformas" estruturais em detrimento das solidariedades sociais em cada país e entre todos.
A crise oferece às elites financeiras e às tecnocracias europeias a tentação de por em prática a "estratégia de choque", aproveitando a crise para radicalizar a agenda neo-liberal. Mas esta política tem muito poucas possibilidades de êxito:
- A diminuição das despesas públicas vai comprometer o esforço necessário, à escala europeia, para sustentar as despesas de futuro (investigação, educação, política familiar), para ajudar a indústria europeia a manter-se e a investir nos sectores de futuro (economia verde).
- A crise vai permitir a imposição de fortes reduções das despesas sociais, objectivo incansavelmente prosseguido pelos defensores do neo-liberalismo, com o risco de comprometer a coesão social, reduzir a procura efectiva, levar as famílias a poupar mais - para a sua reforma e a sua saúde - junto de instituições financeiras responsáveis pela crise.
- Os governos e as instâncias europeias recusam-se a realizar a harmonização fiscal que permitiria a necessária elevação dos impostos sobre o sector financeiro, sobre os patrimónios importantes e os rendimentos elevados.
- Os países europeus estão em vias de instaurar duradoiramente políticas orçamentais restritivas que irão pesar enormemente sobre o crescimento. As receitas fiscais vão cair. Assim, os deficits públicos não irão melhorar, os rácios da dívida degradar-se-ão, os mercados não vão acalmar.
- Os países europeus, dada a diversidade das suas culturas políticas e sociais, não têm que vergar-se, na sua totalidade, à disciplina férrea imposta pelo Tratado de Maastricht; também não se vergarão todos ao reforço que pretende organizar-se actualmente. O perigo de desencadear uma dinâmica de recolhimento identitário generalizado é real" (fonte: Manifesto dos economistas aterrados)