Os resultados das provas feitas em maio e junho e só agora divulgadas dão resultados negativos na maioria das disciplinas e níveis avaliados. As únicas notas positivas registaram-se em Educação Artística e Educação Física.
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Resultados são "desastrosos"
Professores falam
em "descalabro" e dizem que os fracos resultados não se podem
atribuir à pandemia ou à instabilidade nas escolas. Diretores escolares
lamentam a demora na divulgação, importante para preparar estratégias
pedagógicas. Há conteúdos com menos de 3% de positivas. Foi nos meses de maio e
junho do ano letivo 2022-2023 que os alunos do 2.º, 5.º e 8.º anos fizeram
provas de aferição, pela primeira vez em formato digital. As notas, a que o DN
teve acesso, chegaram às escolas no passado dia 15. Timing criticado pelos
diretores escolares que foram agora confrontados com resultados, numa primeira
análise, considerados "desastrosos".
"As provas são importantes para aferir as aprendizagens e fazer reajustes dos planos para os alunos. Entendo o atraso por ter havido greves à correção, mas o ideal era as escolas terem começado a trabalhar os resultados, pelo menos, em setembro. Com certeza teríamos apontado estratégias desde essa altura", sublinha Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP).
E é este atraso
que não permitiu uma análise mais profunda por parte das escolas, algo que
deverá acontecer no início de 2024, nas reuniões de Conselho Pedagógico dos
estabelecimentos escolares. "A divulgação dos resultados coincidiu com a
altura em que se realizam as reuniões de avaliação nas escolas. Por isso, só os
podemos trabalhar a partir de janeiro. O ideal era terem sido divulgados em
julho, dando margem para programar o ano letivo seguinte. Assim, vamos ter de
fazer ajustes a meio do ano letivo", explica.
Arlindo Ferreira,
diretor do agrupamento de Escolas Cego do Maio e autor do blogue ArLindo (um
dos mais lidos no setor da Educação) partilha a mesma opinião. "É
demasiado tarde tendo em conta que as aprendizagens deviam ser preparadas no
início no ano", afirma.
Paulo Guinote,
professor de História e Geografia de Portugal (HGP), de 2.º ciclo (uma das
disciplinas sujeitas a exame) considera os resultados "desastrosos sob
qualquer perspetiva". "Não existe outra forma de os apresentar ou
analisar, por muito que se venham a tentar retorcer as evidências",
afirma. Para o docente "as razões para o descalabro não podem atribuir-se
aos suspeitos do costume para o Ministério da Educação: a pandemia ou a
instabilidade nas escolas". "No caso da pandemia, não é possível
atribuir-lhe grande quota de responsabilidade se os conhecimentos aferidos
reportam a conteúdos do próprio ano de escolaridade, como no caso de História e
Geografia de Portugal, ou a anos imediatamente anteriores, como em Ciências
Naturais e Físico-Química. Talvez em Português ou Matemática se possa falar no
aspeto mais cumulativo das competências, mas isso não pode explicar tudo.
Quanto à instabilidade nas escolas, o ministro repetiu, ainda há um mês, que as
greves tiveram um impacto residual", explica.
Paulo Guinote
atribuiu os fracos resultados a nível nacional ao facto de os alunos já
conhecerem "os vícios do modelo". "Desde logo, sabem que estas
provas não servem para absolutamente nada no seu trajeto escolar e o seu
empenho é muito baixo, algo que observei de forma direta (e me foi relatado por
muitos colegas) ao fazer vigilância de uma das provas do 8.º ano, durante a
qual metade dos alunos pouco mais fez do que assinar o nome. Este modelo de
aferição das aprendizagens é inconsequente, apenas fazendo perder tempo e
recursos", alerta. O docente entende ainda que o corte de tempos letivos
às disciplinas consideradas "tradicionais", levou a uma lógica
"minimalista na abordagem dos conteúdos", tornando a lecionação dos
conteúdos de uma forma mais consistente e coerente "muito
complicada". Exemplificando com a disciplina de HGP, que perdeu dois
tempos semanais, Paulo Guinote explica que implica uma abordagem mais
superficial das matérias. "O resultado é termos entre 5% e 15% de alunos a
conseguir responder seja ao que for nas provas de aferição", conclui. O
docente critica ainda a aplicação das provas em formato digital "quando os
meios não são os indispensáveis para a sua realização de uma forma tranquila
para, em primeiro lugar, os alunos". Recorda, também, problemas nos dias
da realização das provas, como a fraca ligação à rede e o tempo para a
ambientação aos cenários, que "estiveram muito longe de ser os minimamente
necessários". Olhando para os resultados do exame de Tecnologias de
Informação e Comunicação, Paulo Guinote considera ser "mesmo muito
mau", que "apenas cerca de 20% de alunos tenha conseguido desempenhar
tarefas como investigar e pesquisar".
Na análise global
dos resultados das provas de 5.º e 8.º anos, o docente afirma serem ainda mais
preocupantes do que os do teste PISA. "O que os resultados globais desta
prova revelam - de forma mais dramática do que os testes PISA - é que os últimos
anos foram de construção retórica de uma Educação inclusiva, flexível,
equitativa que conduziu a generalidade dos alunos das escolas públicas para um
beco de onde é urgente que sejam retirados", conclui, acrescentando que
"este desempenho colide frontalmente com os resultados de
"sucesso" da avaliação interna".
Resultados fracos
no 2.º ano
Alberto Veronesi,
professor de 1.º ciclo, é perentório em afirmar: "Os resultados são
maus". "Os resultados das provas de aferição do 2.º ano, que foram
pela primeira vez realizados em formato digital, estão aí e não há surpresas.
São maus! Quando apenas na educação artística é que conseguimos encontrar
domínios onde a maioria dos alunos "Conseguiu", temos de admitir que
estamos mal", afirma.
Declarando-se
contra as provas de aferição, lamenta a divulgação tardia dos resultados, o que
tornou a sua análise "inviável". Mas a justificação para os
"maus resultados", não se cinge, na sua opinião, apenas no facto de
terem sido feitas em computador. "Prejudicou o desempenho, como aliás
vários professores tiveram oportunidade de o dizer, mas as principais causas
destes resultados são o baixar de fasquia nas avaliações internas, na passagem
quase obrigatória, saibam ou não, no caso do 2.º ano, até ler. Devíamos todos
ser mais exigentes, mesmo sabendo que a pressão da tutela para fazer transitar
todos os alunos é enorme", justifica. Alberto Verenosi lamenta o silêncio
por parte da Tutela sobre o tema e pede mudanças.
"Devemos
recentrar o pensamento e ir buscar inspiração nos fundamentos clássicos da
educação, defendendo o rigor, a exigência e a disciplina como alicerces
primordiais do sistema educativo e se quisermos regressar a patamares de
aprendizagem que nos orgulhem, é fundamental que retornemos ao cerne da
educação: o conhecimento. A escola deve ser um espaço onde o saber é
transmitido e avaliado de forma eficaz. Termos abandonado este propósito
tem-nos trazido maus resultados", conclui.
Contactado pelo
DN, o Ministério da Educação remeteu explicações para mais tarde. "O
relatório com os resultados globais será publicado brevemente", respondeu
a assessoria do ME.
Há disciplinas
onde mais de metade dos alunos teve negativa
2.º ano
Foram testados os
conhecimentos de Português, Matemática, Estudo do Meio, Educação Artística e
Educação Física. Apenas na Educação Artística os alunos atingiram os objetivos,
com a maioria dos parâmetros avaliados com "Conseguiu". A português, o
domínio da "Oralidade" é aquele que apresenta melhores resultados,
com 48,1% de alunos a conseguir realizar as tarefas. Nenhum outro parâmetro foi
além dos 20% de positivas. Na Gramática, 36,6% não conseguiu realizar as
tarefas. Na matemática o cenário é muito idêntico, em nenhum domínio os
resultados são positivos.
5.º ano
Na disciplina de
Português, apenas 14,2% dos alunos não revelaram dificuldades na
"Oralidade", na "Leitura" foram 5,2%, na
"Gramática" 8,7% e na Escrita, 17,4 %. Em HGP os resultados são mais
fracos. Foram avaliados três conteúdos e em nenhum a média foi positiva, com
percentagens de positivas inferiores a 3% a nível nacional. A título de
exemplo, nos conteúdos de Localização e Quadro Natural da Península Ibérica
(HGP), 66,6% dos estudantes não conseguiu responder corretamente às questões.
Educação Física é a única disciplina com resultados com notas positivas.
8.º ano
Os alunos de 8.º
ano realizaram provas de Matemática, Ciência Naturais, Físico-Química (FQ) e
TIC. O número de estudantes com dificuldades é superior a 50% em quase todos os
domínios avaliados de Ciências e FQ. Resultados semelhantes a Matemática, onde
apenas o parâmetro de "Organização e tratamento de dados" teve cerca
de 20% de positivas. Já em TIC, a percentagens de alunos que não conseguiu
atingir as metas pretendidas ou que revelou dificuldades é também elevada
(DN-Lisboa, texto da jornalista Cynthia Valente)
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