A um mês de eleições regionais, a habitação, as desigualdades e as divergências internas em vários partidos têm marcado uma pré-campanha ainda amena. Final do dia, hora de ponta. Numa das laterais da Praça da Autonomia, no centro do Funchal, ilha da Madeira, Carlos Melino aguarda na paragem de autocarros. Está de frente para os cartazes de diferentes forças políticas, que por esta altura preenchem as artérias da cidade. As eleições regionais são daqui a pouco menos de um mês, a 24 de Setembro, mas o homem de 64 anos “não quer ouvir falar de política”. “Eu não sei se vou votar. Nem sei onde vou morar. Não acredito no que dizem”, começa por dizer ao PÚBLICO, enquanto aponta para as figuras dos candidatos. Carlos Melino vai ter de abandonar o local onde vive há três anos porque a proprietária, que vive fora da Madeira, vendeu o edifício. Já começou a transportar os pertences para casa de um amigo, enquanto aguarda pela acção de despejo. “Ando aí à procura de casa, mas as casas que estão a aparecer aqui na Madeira é só para quem tem dinheiro.”
Foi emigrante na Inglaterra durante 17 anos, voltou com a intenção de morar na zona velha do Funchal, onde nasceu, mas aquela “zona agora é só negócios”. “Eu sou doente, a minha mulher é doente. Estão quatro pessoas na casa e agora vão ter de sair não se sabe para onde”, explica, adiantando que procurou saber junto dos poderes públicos se poderia ter direito a uma habitação. “Seja qual for o partido, só querem saber das pessoas perto das eleições. Só dão casa a quem tem negócios.”
O relato na primeira pessoa espelha o desencantamento de uma parte da população com a classe política, um desafio das democracias contemporâneas, particularmente evidente nos períodos eleitorais. Na Madeira, o valor mediano do preço da casa por metro quadrado é de 1697 euros, superior à média nacional (1565 euros), figurando o arquipélago entre as quatro regiões com os preços de habitação mais altos do país – juntamente com Algarve e as áreas metropolitanas de Lisboa e Porto (segundo dados do Instituto Nacional de Estatística referentes ao primeiro trimestre).
A habitação tem sido um dos temas da pré-campanha eleitoral. Na quarta-feira, o líder do PS-Madeira, Sérgio Gonçalves, prometeu construir casas a preços acessíveis em todos os concelhos e criticou o governo regional por preferir “gastar 150 milhões de euros no prolongamento do molhe da Pontinha”, no porto do Funchal, “em vez de construir mais casas”.
A resposta veio no dia seguinte, com a coligação Somos Madeira, que junta PSD e CDS-PP (partidos que governam a região), a visitar um empreendimento habitacional em construção, em Santo António. Esta semana, Miguel Albuquerque, que por estes dias tem vestido mais o fato de presidente do executivo regional do que o de candidato, prometeu investir 6,3 milhões de euros para 30 fogos com rendas acessíveis.