sexta-feira, setembro 29, 2023

O último orçamento dos Açores vai ser o mais difícil, mas o PAN também pode ser a solução

Negociações arrancam em novembro. Governo precisa de três votos, mas está mais distante dos parceiros. Aumento da dívida pública durante atual legislatura é um dos temas-chave. Há uma certeza: os Açores vão a votos no próximo ano. A dúvida é se as eleições serão no fim da legislatura, em outubro, ou antecipadas devido a uma eventual queda do Governo, que não tem condições de garantir, para já, a aprovação do orçamento regional. Num impasse parlamentar desde março, altura em que Iniciativa Liberal e o deputado único independente (que saiu do Chega) rasgaram os acordos que davam maioria garantida ao Governo de coligação PSD-CDS-PPM, as forças políticas do arquipélago preparam-se para negociar o último orçamento regional da legislatura. As negociações à direita não serão tão fáceis como no passado – e à semelhança do que aconteceu na Madeira, o PAN pode ser decisivo.

A anteproposta do orçamento regional para 2024 será entregue este domingo, e em novembro arrancam as negociações parlamentares. Tal como nos últimos três orçamentos, o Executivo de José Manuel Bolieiro precisa de garantir três assentos além dos que formam a maioria governamental PSD-CDS-PPM: há quatro “parceiros para o diálogo” – Iniciativa Liberal, que em março deu por terminado o acordo com o PSD-A, o deputado do Chega, o deputado único que saiu do Chega, e o deputado do PAN – mas todas as decisões serão tomadas “medida a medida”.

“Aconteceu na Madeira o que aconteceu nos Açores em 2019: dispersão de votos, e por isso a necessidade de encontrar uma maioria estável”, analisa fonte do Governo açoriano. “Se o Orçamento passar, as eleições serão em outubro [como previsto]. Se não passar, serão um bocadinho antes”, acrescenta. A desdramatização do cenário de chumbo é corroborada por Artur Lima, líder do CDS-PP no arquipélago e vice-presidente do Governo. “Só nos preocupa a coesão territorial e social dos Açores. Vamos negociar como fizemos até agora, mas não vamos fazer cedências. Quem quiser votar contra vota, quem quiser votar a favor vota”, diz ao Expresso.

A possibilidade de Bolieiro querer imitar Costa em 2019 – forçar eleições antecipadas, ganhar votos aos parceiros, conquistar uma maioria absoluta – é real, diz Vasco Cordeiro, líder do Executivo socialista entre 2012 e 2020. “Há uma crescente hostilidade entre os partidos do Governo e os antigos parceiros”, afirma. Na sua leitura, é o PSD, CDS-PP e PPM que “estão interessados em romper o clima de entendimento” dos últimos três anos.

“Não vou fazer exigências”, diz por sua vez Carlos Furtado, deputado independente que abandonou o Chega em 2021. “Vou apresentar iniciativas e espero que sejam aprovadas. Devido à fragilidade parlamentar que existe neste momento, movimentações de gabinetes não seriam benéficas”, adverte. “Temos negociado proposta a proposta [com o Governo regional] e vamos continuar a fazer isso para 2024”, diz José Pacheco, agora deputado único do Chega.

António Lima, deputado regional do Bloco de Esquerda (BE), corrobora esta ideia: “Houve uma mudança de atitude nas últimas semanas entre o Governo e as restantes forças da direita”, diz, apontando para uma “diminuição da influência” dos pequenos partidos e do deputado ex-Chega. E lança uma farpa: “O PAN absteve-se no primeiro orçamento e votou a favor nos outros dois. Se há lição [a triar do acordo da Madeira], é que o PAN está disponível sempre que a direita precisa.”

“O orçamento [regional] está a ser negociado pelo [deputado] eleito do PAN e a respetiva estrutura. Em breve, a direção nacional irá reunir-se com os responsáveis [dos Açores] para conhecer o ponto de situação”, afirma ao Expresso fonte oficial da direção de Inês Sousa Real, ainda a lidar com os estilhaços internos provocados pela decisão na Madeira.

DÍVIDA PÚBLICA A SUBIR, RSI A DESCER

A “fragilidade” política é adensada pelo facto de a dívida pública da região ter aumentado cerca de 30% desde o início da atual legislatura: o Executivo de Bolieiro acena com o “Acordo de Parceria estratégica 2023-28”, assinado recentemente com parceiros do setor empresarial e UGT e que estabelece o objetivo de “inverter a trajetória de aumento da dívida pública regional”. Além disso, lembra a “pesada herança socialista” – incluindo a resolução em curso de dossiers como a privatização da SATA – para justificar os problemas nas contas.

“É uma desculpa que já não cola”, contrapõe um responsável da IL, lembrando que o orçamento deste ano foi desenhado para ser de endividamento zero – e com três meses do final do ano, “dificilmente” esse objetivo será atingido. “As contas fazem-se no final do ano”, contrapõe Artur Lima. Há a possibilidade de o Governo regional voltar a propor um orçamento de endividamento zero para 2024, mas “ainda não há uma decisão política” sobre o assunto.

Neste clima de incerteza, o Executivo tem um trunfo para seduzir os partidos à direita: desde o início da atual legislatura, em novembro de 2020, o número de famílias que recebem o Rendimento Social de Inserção (RSI) nos Açores caiu quase 37% – o que corresponde a uma descida de 40% no número de cidadãos. Após as eleições de 2019, a “redução significativa da subsidiodependência” foi uma das metas exigidas pelo Chega e pela Iniciativa Liberal nos acordos (separados) que firmaram com o Governo PSD-CDS-PPM (Expresso, texto do jornalista Tiago Soares)

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