Confesso que não consigo perceber a dificuldade em encarar o dossier ferry por parte de alguns protagonistas políticos. Reconheço que, por algum motivo, tem sido o JPP quem mais tem insistido no assunto.
O ferry, para as
ligações marítimas entre a Madeira e o Continente, ter sido um processo
complicado, porque são várias as versões e várias as acusações cruzadas entre várias entidades e protagonistas políticos. Muitas delas
contando meias histórias ou suprimindo alguns factos que não podem ser
escamoteados.
Vamos a factos.
O ferry para ligar
a Madeira ao Continente - no caso dos Açores acho que também não existe nenhuma
ligação - só poderá concretizar-se, segundo dizem, com um acordo entre os
Governo da República e da Região. Ninguém ainda explicou quanto custa ter um
ferry todo o ano, ninguém ainda disse explicou se será ou não necessário pagar
indemnizações compensatórias ao operador, ninguém consegue dizer se o
ferry continuaria a utilizar o porto de Portimão como escala
nesta operação (cerca de 2h e 30m de Lisboa) - o que por si só retira
atractividade aos potenciais interessados e a quem esteja disposto a trocar uma
viagem de avião para Lisboa que demora 1h e 30m (cerca de 2horas para o Porto)
custa menos de 90 euros devido ao subsídio de mobilidade - ninguém ainda explicou
se existe algum estudo de viabilidade económica associado a esta operação
marítima - uma viagem de barco.
Para além de
passageiros e de eventual transporte de viaturas sobretudo no verão ou noutras
épocas do ano em que os madeirenses optassem por fazer férias no Continente, o
item dos transportes era valorizado pelos adeptos desta solução. Contudo, e sem
que saiba os encargos da solução, a utilização de um avião cargueiro entre
Lisboa e o Funchal, resolve alguns problemas imediatos mas não resolve todos.
Acresce que não tenho elementos concretos - embora tenha as minha opinião
pessoal - sobre qual seria a reacção dos actuais operadores da linha marítima
Continente-Madeira-Continente (transporte de viaturas, mercadorias e
contentores) caso existisse uma alternativa assente num ferry. Alguns dos
protagonistas deste debate insinuam, especulativamente ou não, porque não podem
ter certezas, que esse será um dos obstáculos à concretização deste desiderato.
Admito apenas que, caso se confirmasse a ligação ferry, a reacção
corporativista seria factual.
Miguel Albuquerque
tem repetidamente afirmado que não há condições para termos um ferry,
permanentemente, na linha, não só porque Lisboa não faz acordo com a Região sobre
esta matéria, mas porque ao contrário do que alguns levianamente têm sugerido,
a Europa não disponibiliza recursos financeiros muito menos nesta conjuntura em
que as prioridade de Bruxelas estão todas condicionadas e dependentes da evolução e dos enormes
custos da guerra na Ucrânia.
O que eu gostava
mesmo de saber, até para que se acabasse com alguma demagogia, especulação e potencial
mentira - porque tudo isso existe - é que custos estariam associados a esta
ligação, quais os resultados de um eventual estudo sobre a viabilidade econômica da linha, incluindo uma previsão de passageiros utilizadores, nos
dois sentidos, quer madeirenses, quer continentais ou estrangeiros, qual o
volume de carga a transportar nos dois sentidos, qual o impacto dessa embarcação
na alegada redução do preço dos bens de consumo disponibilizados na Madeira, em
vários domínios que não apenas o alimentar, e se um ferry na linha Madeira-Continente
acabava de imediato com as operações do avião-cargueiro que demora cerca de 2
horas a ligar o Continente à Madeira, etc.
Como escrevia há quatro anos o Público, "se fôssemos de barco, perderíamos logo à partida dois dias de férias. Mas o cenário voltou a ganhar força, é bem visto por alguns madeirenses mas há muitos outros que não estão dispostos a trocar o avião pelo barco, especialmente pela duração da viagem (quase um dia) e pelo facto de o Algarve ser o ponto de partida previsto para o ferry". Em 2017 chegou a realizar-se um concurso para a exploração da ligação semanal por ferry entre a Madeira e o continente tendo sido registado o interesse de 13 armadores mas destes, por razões que nunca foram clarificadas, apenas um terá sobrevivido a esse processo de consulta. Mas desse processo nada resultou porque dos 13 interessados, ao que consta, 12 não terão formalizado nenhuma candidatura concreta, apenas manifestaram interesse em recolher informações e dados. Supostamente as indefinição sobre as indemnizações compensatórias – dada a previsão de elevados prejuízos na exploração da linha - terá afastado potenciais interessados. Mas reconheço que não estou na posse de todas a informação, nomeadamente aquela que nunca se publica de forma pormenorizada. E sim, recuso alinhar num debate partidarizado em torno de um tema que devia ser discutido de forma séria e pragmática e sobre o qual devia ser tomada uma decisão que acabasse com a especulação que reconhecidamente existe sobre este item.
Alguns (poucos) factos
É um facto, repito
e recordo, que o Governo Regional da Madeira abriu há uns anos um concurso
público para a "concessão de serviços de transporte marítimo regular
através de navio ferry entre a região e o continente português", iniciativa
que foi publicada no Diário da República
O concurso público
tinha um valor de 18 milhões de euros e visava a "concessão de serviços de
transporte marítimo regular através de navio ferry (transporte de passageiros e
carga rodada) entre a Madeira e o continente português".
De acordo com o
concurso, a adjudicação teria uma validade de seis anos, estando orçamentada,
por parte do governo regional, uma verba de 9 milhões de euros para fazer face
"aos encargos orçamentais relativos à concessão de serviços de transporte
marítimo regular através de navio ferry", entre a Região Autónoma da
Madeira e o continente, conforme publicação feita no Jornal Oficial. O mesmo
documento que revelava que estes nove milhões de euros seriam repartidos entre
2018 e 2021.
Na apresentação do
relatório da auscultação a transportadoras sobre esta linha, o secretário
regional da Economia declarou então que o restabelecimento da ligação por ferry
entre a Madeira e o continente português só era viável com indemnizações
compensatórias ao armador pelo Estado. A 15 de março de 2016, após uma
resolução publicada em Diário da República, aprovada pela Assembleia
Legislativa da Madeira, era reconhecido o interesse público da linha de ferry e
recomendado o lançamento do concurso internacional para a ligação.
O documento pedia
ao governo central o lançamento de um concurso público internacional para a
efetivação da linha marítima, "assegurando as compensações financeiras
necessárias a viabilizar a operação". A 27 de junho, o presidente do
Governo Regional, Miguel Albuquerque (PSD), manifestou satisfação pelo facto de
a Comissão Europeia dar luz verde à possibilidade de o Governo Regional
subsidiar a ligação marítima entre a Madeira e o continente.
"A resposta
veio positiva de Bruxelas, estou muito satisfeito com essa posição e vamos
partir, agora, para a abertura do caderno de encargos", anunciou.
A 14 de junho de
2008, o armador espanhol "Naviera Armas" inaugurou a linha
Canárias/Madeira/Portimão - após 23 anos de ausência de ligações de passageiros
com o continente português - mas o percurso foi interrompido em janeiro de
2012. Na altura foi revelado que os elevados custos das taxas portuárias
praticadas na Madeira foram a justificada dada para essa decisão.
Neste concurso foi
revelado na altura que a Empresa de Navegação Madeirense (ENM) foi a única empresa
“que apresentou uma proposta ao concurso público internacional para o
transporte marítimo de passageiros e veículos entre a Madeira e o continente”.
Em Maio de 2018 foi
noticiado que apenas quatro entidades levantaram o caderno de encargos, mas só
três eram concorrentes a sério e, desses três, um é que apresentou uma proposta
formal". O caderno de encargos foi levantado pela ENM, pela Vieira &
Silveira - Transportes Marítimos S.A, pela Tecnovia Madeira - Sociedade de
Empreitadas S.A e por Charl Rafael Macedo da Silva (do partido JPP -- Juntos
pelo Povo).
A
operacionalização da linha, num total de 36 viagens em três anos (12 por ano,
entre ida e volta, a serem efetuadas entre junho e setembro), receberia uma
indemnização compensatória do Orçamento Regional no valor total de 9 milhões de
euros (3 milhões de euros/ano). A ENM do grupo Sousa foi a única que apresentou
proposta à linha de ferry Funchal-Portimão.
Lembro que o Grupo
Sousa interpôs, em 2017, uma ação contra o Governo Regional a pedir a anulação
da resolução que revoga o regime de licenciamento de exploração dos portos da
Madeira, passando para o regime de concessão mediante concurso público
internacional.
Confesso que
gostava de saber o que falhou e porque motivo o concurso lançado não foi concretizado
(LFM)
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