Nos últimos 10 anos, o nível de investimento público de Portugal foi de apenas 2,1% do PIB por ano, figurando no topo do ranking dos países europeus com o mais baixo nível de investimento público. Em 2023, o investimento público contabilizou cerca de 6,7 mil milhões de euros, o equivalente a apenas 2,5% do PIB. Entre os 20 países da Zona Euro e os 27 Estados-membros da União Europeia, só a Irlanda teve um nível de formação bruta de capital fixo das administrações públicas mais baixo que Portugal no ano passado. Este quadro não é propriamente novo. Ao longo da última década, Portugal figura constantemente no topo da tabela dos países europeus com o menor nível de investimento público no quadro europeu.
“É o efeito do ‘sucesso’ que tem sido a nossa política de ajustamento”, ironiza João Duque, professor catedrático de Finanças e presidente do ISEG, referindo-se ao processo de ajustamento orçamental que Portugal tem desenvolvido desde a crise de dívida soberana da Zona Euro, que tem sido fortemente garantido, por vários governos, à custa do congelamento do investimento público. Segundo dados do Eurostat, tanto nos últimos três como nos últimos cinco anos, o nível médio de formação bruta de capital fixo das administrações públicas fixou-se em 2,5% e 2,32% do PIB, respetivamente, ficando apenas acima dos 2,2% do PIB registados pela Irlanda e ficando longe do rácio de 3,2% da média dos países da Zona Euro nestes períodos.
Porém, alargando o horizonte de análise até 2014 (10 anos), ninguém bate Portugal com o nível de formação bruta de capital fixo das administrações públicas mais baixo da União Europeia. Desde 2014, o nível de investimento público de Portugal foi de apenas 2,1% do PIB por ano, menos de um terço da média dos 27 Estados-membros do espaço europeu.
“Os números de Portugal não me surpreendem, mas o ranking surpreende. Achava que havia mais países piores que nós”, refere António Nogueira Leite, professor da Nova SBE e ex-secretário de Estado do Tesouro e Finanças. A falta de investimento público adequado é uma ameaça latente à sustentabilidade das finanças públicas e à qualidade de vida dos portugueses. Sem uma infraestrutura robusta e contemporânea, Portugal arrisca-se a perder relevância no contexto económico internacional.
Os constantes baixos números do investimento público de Portugal ao longo da última década têm-se traduzido, por exemplo, em reduzidos níveis de investimento na construção e manutenção de infraestruturas essenciais para o país, como vias férreas, aeroportos, escolas, hospitais e tantas outras que desempenham um papel crucial na função de produção da economia.
“E depois ficamos surpreendidos com sermos ultrapassados por outros países”, destaca João Duque, notando que ao longo da última década Portugal apresentou níveis de investimento público comparáveis apenas com os países mais ricos da União Europeia, “não estamos com o mesmo nível de desenvolvimento desses países.”
Isso faz com que a degradação ou obsolescência deste capital, sem os necessários investimentos para sua renovação ou expansão, comprometa a eficiência com que o país pode operar e competir globalmente. E isso é particularmente alarmante quando todos estes números apontam justamente para que o investimento público em Portugal não tem acompanhado a taxa de depreciação deste capital.
“Isto significa que o investimento público terá de ser maior para a frente para não arriscarmos ficar ainda mais para trás do comboio europeu, mas também que saibamos investir melhor“, ressalva António Nogueira Leite. A teoria económica mostra que a baixa aposta no investimento público não só limita a capacidade de resposta do Estado perante crises, como restringe o potencial de crescimento económico do país. A persistência desta tendência poderá resultar numa deterioração significativa das capacidades produtivas e competitivas de Portugal. “Um ano de baixo investimento implica uma perda de stock potencial cujos efeitos na produtividade serão sentidos durante cerca de duas décadas. Uma década de baixo investimento implica, portanto, uma perda de stock potencial cujos efeitos poderão ser sentidos durante mais de um século“, refere Miguel de Faria e Castro, economista e investigador na Fed de St. Louis, num ensaio escrito no ECO há dois anos.
A falta de investimento público adequado é uma ameaça latente à sustentabilidade das finanças públicas e à qualidade de vida dos portugueses. Sem uma infraestrutura robusta e contemporânea, Portugal arrisca-se a perder relevância no contexto económico internacional e a ver comprometida a sua capacidade de atrair investimento estrangeiro direto, essencial para a inovação e criação de emprego. E isso é algo que o país tem sentido desde 2021, com o investimento direto estrangeiro no país a registar uma contração média anual de 11,6% desde 2019, segundo dados do Banco de Portugal (ECO online, texto do jornalista Luís Leitão)
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