sábado, novembro 16, 2019

Novo Banco: Injeção do Estado pode ser feita de uma só vez

O dinheiro que o Fundo de Resolução ainda tem para injetar no Novo Banco, que pode ir até €2 mil milhões, pode ser antecipado e colocado de uma só vez no banco, segundo apurou o Expresso junto de fontes próximas do processo. Os acionistas do banco, a Lone Star e o próprio fundo, que é uma entidade pública cujas despesas entram no défice orçamental, estão a estudar essa possibilidade. O Governo está a acompanhar cenário. A ideia é fazer uma injeção única, libertando assim o Fundo de Resolução de transferências futuras que, de acordo com o Mecanismo de Capitalização Contingente acordado na venda do banco em 2017, podem ser de mais €2 mil milhões.
Os envolvidos estão a medir os prós e contras. Do lado do Fundo de Resolução, a vantagem seria não utilizar a totalidade do montante do mecanismo de capitalização. Para a Lone Star, poderá ainda fazer mais sentido, já que que a limpeza dos ativos tóxicos é uma prioridade da gestão do banco, liderada por António Ramalho, e implica perdas que são cobertas por estas transferências.

O Governo não se compromete. Fonte oficial do Ministério das Finanças diz não ter recebido “qualquer proposta da Lone Star sobre esta matéria”. O Expresso sabe que, ainda que informalmente, o cenário foi colocado em cima da mesa e estão a ser abordados todos os contornos. Dentro do Governo há olhares distintos sobre o assunto: em S. Bento há uma posição mais favorável, havendo maiores reticências nas Finanças. Estão a ser feitas contas e é nos detalhes que reside o sucesso ou insucesso desta solução. Para o Governo, só será confortável se o Fundo tiver poupanças.
O tema é sensível e nenhuma das partes quer assumir a abordagem do mesmo, pois está tudo ainda em aberto e não há qualquer decisão tomada. Mas é certo que esta poderá ajudar em termos reputacionais: a injeção não é repetida, e, portanto, limita os efeitos mediáticos de colocações sucessivas e anuais. Mesmo em termos orçamentais, pode prejudicar num só ano, sem penalizar todos os outros. Além disso, seria necessário que o montante total a canalizar para o ex-BES ficasse abaixo do patamar dos €3,89 mil milhões (até aqui, foram já postos, em dois anos, €1,9 mil milhões). O ponto de partida é este, o ponto final dependerá de um acordo favorável e financeiramente racional para todas as partes envolvidas.
Estão a ser feitas contas e é nos detalhes e no montante a antecipar que reside o sucesso ou insucesso desta solução
O Expresso questionou o Banco de Portugal sobre esta solução, mas o banco central não quis comentar. Já as Finanças, além de dizerem não ter recebido uma proposta da Lone Star, acrescentam que “o Governo continuará a cumprir os termos do contrato de financiamento com o Fundo de Resolução”. Também a Lone Star, acionista maioritária com 75% do banco, não quis fazer qualquer comentário.
Um eventual acordo não garante, por si só, o sucesso desta solução. A acontecer terá de ser levado à Direção-Geral da Concorrência da Comissão Europeia (DGComp), que, sabe o Expresso, terá uma palavra a dizer. Bruxelas acompanhou todo o processo de venda e validou as suas condições. O assunto está a ser tratado com pinças.
Em cima da mesa há conversas. Na prática, há ainda que delinear uma proposta formal por parte dos acionistas — ou melhor, do Fundo de Resolução (financiado com contribuições da banca mas que tem sobrevivido com empréstimos estatais). E existem detalhes que podem fazer toda a diferença e que residem não só no montante acordado a pagar como também nas contrapartidas que haveria para o Estado.
O Governo deverá querer um desconto sobre o que falta pagar e a Lone Star poderá aceitar desde que chegue à conclusão de que não precisa de utilizar todo este dinheiro. O fundo americano tem pressa em limpar o balanço do Novo Banco e, assim, ficar mais livre para uma possível venda. E não só: a entrada do capital poderá ser anterior à divulgação de conclusões da auditoria que a Deloitte irá realizar à origem dos créditos tóxicos e também à sua venda. É neste tabuleiro — ganhos e perdas — que a Lone Star, as Finanças e o Fundo de Resolução estão a trabalhar. Tudo está em aberto.
P&R
Porque tem o Fundo de Resolução de capitalizar o banco?
Na venda do Novo Banco, foi criado o Mecanismo de Capitalização Contingente, que prevê que o Fundo de Resolução (que ficou com 25% do capital) assuma perdas numa carteira de ativos até um total de €3,89 mil milhões. Em dois anos, foram utilizados €1,94 mil milhões.
O pagamento pode ser antecipado?
É o cenário que está em cima da mesa. O Governo terá uma palavra a dizer, porque as transferências do Fundo, que é uma entidade pública, entram no défice orçamental. Além disso, o Tesouro empresta normalmente dinheiro ao Fundo para realizar estas operações, num máximo de €850 milhões anuais.
Qual o papel da Comissão Europeia?
A Direção-Geral da Concorrência da Comissão Europeia (DGComp) tem de validar as condições da utilização de dinheiro estatal. E a sua luz verde foi dada para a venda do banco em 2017. Agora terá de se pronunciar caso haja alterações dos pressupostos (Expresso, texto dos jornalistas Diogo Cavaleiro, Isabel Vicente e João Vieira Pereira)

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