domingo, dezembro 12, 2021

TAP: Mais pequena, limitada e pouco pacificada



Ainda sem luz verde à vista e com muita incerteza no horizonte, um ano depois de ter entregado o plano de reestruturação à Comissão Europeia (CE), a TAP está mais pequena, mais limitada na estratégica e na tesouraria e pouco pacificada internamente. A lamber as feridas da saída de mais de três mil trabalhadores — alguns quadros experientes — e com a operação sensivelmente a metade no período pré-pandemia e receitas deprimidas, a TAP vive suspensa da decisão de Bruxelas, resposta que o Governo e a companhia esperam que chegue antes do Natal e que seja positiva. O que ainda não é certo que aconteça.

O tema que faltava resolver e o mais delicado — os slots (faixas horárias para aterrar e levantar voo) — estará já fechado. Há, sabe o Expresso, uma solução de compromisso que resultará numa redução de slots inferior à exigida inicialmente por Bruxelas, cujo impacto não colocará em causa os períodos horários essenciais à manutenção do hub em Lisboa. Aguarda-se agora a aprovação interna da Comissão, o que deverá levar duas a três semanas. É desta aprovação que depende a entrada nas contas da companhia ainda este ano de €150 milhões a €160 milhões, pedidos ao abrigo da compensação covid, que ainda não foram libertados e que fazem falta numa empresa exaurida, onde só o aluguer dos novos aviões custa mensalmente cerca de €17 milhões. Até agora, a TAP já recebeu de ajudas de Estado €1,662 mil milhões. As contas continuam no vermelho — os prejuízos ascendiam a €627,6 milhões em setembro — e de lá não irão sair tão cedo.

NÃO BAIXAR DOS 90 AVIÕES

Resta saber o que vem dentro do esperado presente de Natal em matéria de perda de slots e de dimensão da frota. Fontes sindicais defendem que abaixo de 90 a 94 aviões — entre aeronaves da TAP e da Portugália — a companhia não é viável. “No dia em que a TAP não puder ser uma companhia de longo curso, não tem razão de existência”, afirma Paulo Duarte, o próximo presidente da direção do Sindicato dos Trabalhadores da Aviação e Aeroportos (SITAVA). José de Sousa, o ainda líder, acrescenta: “A TAP não pode ir abaixo de determinada estrutura, senão não aguenta. Acreditamos que o número mínimo andará à volta de 90 aviões. Se vier abaixo deste valor, o hub corre risco e a companhia deixa de fazer sentido.” É na combinação do triângulo frota, rotas e slots — e do equilíbrio que entre eles se gera — que parte do futuro se decide.

O grupo TAP tem atualmente 96 aviões, 13 dos quais da Portugália. E nesse sentido a companhia encolheu, uma vez que tinha 108 aeronaves quando em março de 2020 chegou em força a covid-19, obrigando a transportadora a deixar os aviões em terra. E está à espera de receber mais aviões novos, que já estavam encomendados. Fontes da empresa admitem que a TAP tem uma frota maior do que devia face às necessidades e ao que se projeta para o médio prazo, sobretudo porque não conseguiu livrar-se dos aviões mais velhos por dificuldade de negociação com os locadores, que não estão a aceitar a devolução de aeronaves.

A impaciência é evidente, e o tema TAP é um enorme fardo político para o governo, que está a cessar funções, com eleições marcadas para 30 de janeiro

Além disso, como a procura ainda está longe dos níveis de 2019 — ronda os 50%, embora no verão e nas rotas mais desejadas haja picos para cima e por vezes com voos praticamente cheios —, há aviões que não estão a ser usados. Apesar de a procura nem sempre corresponder à expectativa, a TAP programou para este inverno uma operação a 80%, que tem vindo a ajustar — cortou 112 voos agora por causa da nova variante Ómicron. E em alguns momentos, por causa dos cortes decorrentes da reestruturação, viu-se com falta de trabalhadores, especialmente tripulações. É um nó difícil de desatar — foi preciso fazer cortes e há trabalhadores em lay-off e horário reduzido —, e a companhia já teve de cancelar voos por falta de tripulação de cabina. Em novembro, estimam fontes sindicais, para fazer todos os voos previstos no plano, ter-se-ia de contratar mais cerca de 400 tripulantes.

A questão da organização dos trabalhadores é um dos pontos fracos apontados ao desenho do plano de reestruturação, feito por Miguel Frasquilho e Ramiro Sequeira, então presidentes do Conselho de Administração e da Comissão Executiva. Há áreas da empresa que foram dizimadas. É, por exemplo, o caso do apoio aos clientes — os chamados call centers — e o apoio ao hub, onde chegou a haver cerca de 100 pessoas e se viu reduzido a 10.

Christine Ourmières-Widener, a atual presidente, está a contratar pessoas para a área de apoio ao cliente, nomeadamente o hub e os call centers — áreas sensíveis do ponto de vista comercial e onde a TAP tem sido alvo de fortes críticas, devido às dificuldades de comunicação e demora na resposta.

UMA BOMBA POLÍTICA

A impaciência é evidente, e o tema TAP — a empresa que mais concentra ajudas públicas — é um enorme fardo político para o Governo, que está a cessar funções, tem uma campanha eleitoral à porta e eleições marcadas para 30 de janeiro. Um chumbo do plano por Bruxelas seria uma bomba. A reputação do ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos — o rosto da intervenção na TAP, hoje quase 100% pública, e peça-chave na negociação com os sindicatos —, joga-se na sobrevivência da transportadora. A ausência de informação sobre as negociações com a CE é uma crítica recorrente: se a TAP é tão importante para o país e se é o seu futuro que está em causa nestas negociações, porque é que passado um ano ainda não foi explicado o que quer a CE para a empresa?, perguntam. Qual terá de ser a chamada contribuição própria da TAP, um sacrifício por estar a ser ajudada ao abrigo de artigo do resgate e reestruturação? Teremos uma ‘TAPzinha’ no final deste processo?

Enquanto isso, a Ryanair, um dos principais atores neste processo e cuja pressão foi essencial para que fosse aberta uma investigação aprofundada aos apoios do Estado à TAP, não desarma e ainda na semana passada veio dizer que a TAP devia libertar 250 slots por semana. Os slots são efetivamente um dos temas mais sensíveis em toda esta questão. Tal como a dimensão do financiamento da empresa nos mercados. Esta semana, o ministro das Finanças assegurou que as questões ainda em aberto, das quais depende a luz verde por parte de Bruxelas, estão resolvidas. Afastou o envolvimento dos obrigacionistas na ajuda à TAP, ou seja, não vai haver cortes a este nível. “A questão da fonte de financiamento alternativa além do Estado está resolvida e a questão dos slots de que a empresa tinha de abdicar com base nas orientações da Direção-Geral da Concorrência penso que também estará resolvida”, disse João Leão (Expresso, texto dos jornalistas Anabela Campos e Pedro Lima)

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