quarta-feira, dezembro 02, 2015

Crise no jornalismo: Um soco no estômago

Dir-me-ão que são as regras do mercado. Dirão outros que é o mercado a impor as suas regras, a fazer opções, a proteger preferências. Tudo isso é correto, mas no caso do jornalismo, qualquer situação como esta é para mim um soco no estômago. Sempre me considerei um jornalista, sempre respeitei a linha vermelha que deve existir nesta profissão, que separa as nossas opiniões e opções da verdade, da isenção e da independência. Tenho de volta, desde que acabaram as incompatibilidades, a minha carteira profissional nº 318, um regresso às origens que tanto prezo.
Incomodam-me os despedimentos, incomoda-me ainda mais o encerramento de jornais ou de outros meios de comunicação social, porque isso significa que o sector fica mais frágil e vulnerável. Quanto menos meios de comunicação existirem - aceito que em Portugal vivemos ainda uma situação em que há um empolamento despropositado da dimensão que realmente tem o mercado da comunicação social em termos de oferta - mais restrito será o sector e maior concentração existirá incluindo a confluência de interesses económicos que subitamente passaram a ter pelos jornais e demais média.  E que lhes dá uma visão puramente empresarial, distorcida e, quanto muito, de posse de instrumentos de pressão sobre o poder político, os quais, que desde que bem utilizados podem condicionar o processo de decisão, seja ele qual for e propiciar resultados ao capital, a empresas e a empresários que apostam na comunicação social, alguns deles de forma surpreendente.
Ficamos a saber esta semana que a administração da Newshold revelou que no "Sol" e no "Jornal I"  vai despedir cerca de dois terços dos trabalhadores depois de ter sido confirmada a intenção da família Madaleno, de Álvaro Sobrinho, de deixar de ser accionista dos dois projectos. Sabe-se que a manutenção de ambos os títulos vai implicar uma forte reestruturação, a começar pelo despedimento de mais de 100 trabalhadores das actuais empresas do universo de media da Newshold, holding que mudará também de nome nesta nova fase. Além do despedimento de mais de 100 pessoas, a reestruturação nas empresas que produzem o "Sol" e o "i" vai ainda implicar cortes salariais nos trabalhadores que transitem para a próxima fase da empresa. No caso dos directores, esses cortes podem atingir 50% do vencimento actual. Regalias como os telemóveis até agora pagos pela empresa ou a carrinha que garantia a ligação gratuita entre Lisboa e a sede dos jornais (em Queijas) também serão cortadas. Diz o Expresso que na origem da decisão da família Madaleno de desinvestir na área dos media em Portugal terá estado a constatação de que dificilmente seria possível garantir a sustentabilidade financeira de dois jornais que no ano passado geraram um resultado negativo conjunto na ordem dos 8 milhões de euros.
O Jornal I foi lançado em maio de 2009 pelo grupo Lena, tendo tido desde então uma vida marcada por sucessivas mudanças de propriedade e de direcção editorial: em pouco mais de seis anos de vida, o jornal já teve quatro proprietários e sete direcções (fora as interinas). Menos de um ano após o lançamento, e numa altura em que o "i" vendia uma média de mais 9 mil exemplares por edição, o grupo Lena decidiu desinvestir na área dos media e colocar o diário à venda. Entre Janeiro e Agosto deste ano, o diário "i" teve uma média de circulação paga de cerca de 4.500 exemplares por edição, números que justificam os problemas surgidos.
Já o semanário "Sol" foi lançado em Setembro de 2006 por um conjunto de jornalistas que tinham deixado o Expresso cerca de um ano antes, liderados pelo ex-director do jornal da Impresa, José António Saraiva. O empresário Joaquim Coimbra, o BCP e a Imosider foram os accionistas que entraram com o capital para viabilizar o lançamento do projecto, com um investimento na ordem dos 5 milhões de euros no primeiro ano. O objectivo assumido desde o início era bater o Expresso em vendas e cimentar o "Sol" como líder de mercado no segmento de semanários. Mas essa meta ficou longe: no final de 2008, a média de vendas do "Sol" era de cerca de 50 mil exemplares, menos de metade do que então vendia o Expresso. Entre Janeiro e Agosto deste ano, o "Sol" vendeu uma média de circulação paga na ordem dos 20 mil exemplares semanais, contra 95 mil do Expresso. O Sol conheceu várias complicações financeiras, e em 2009, o BCP e a Imosider decidiram vender as suas participações no jornal à Newshold (LFM)

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