Tudo indica - depois dos ajustamentos feitos pelas televisões privadas, que reduziram os seus quadros e despesas, sem que muita gente tivesse dado por isso - que a comunicação social, infelizmente, continua mergulhada numa espécie de pesadelo que parece estar destinado a ceifar a imprensa, o elo mais fraco, ou pelo menos a causar problemas complicados à imprensa, aparentemente dos três - rádio, televisão e imprensa - aquela que continua a sofrer mais com o prolongamento de uma crise de receitas que começa a não ter já muito a ver com a crise económica e financeira europeia, mas antes com novos hábitos de leitura e de acesso à informação.
Aliás, continuo a pensar que as edições online, devidamente actualizadas, que os jornais colocam, e bem, ao dispor das pessoas, trazem problemas novos, por exemplo a dúvida sobre quais as motivações que podem levar os leitores a comprarem no dia seguinte o jornal cujas notícias foram acompanhando no próprio dia, mesmo que em versão mais reduzindo, nos respectivos sites.
Continuo a ter, sempre tive, muitas dúvidas sobre se, ao contrário da rádio e televisão, o desenvolvimento de sites online com conteúdos actualizados por vezes quase ao minuto são mais ou menos-valias no caso dos jornais. Não tenho resposta porque não realizei nenhum estudo nem sei quem é que me possa ceder dados concretos sobre este tema.
Não me espanta por isso a sucessão de notícias recentes confirmando a existência de complicações no sector.
O Sol e o Jornal I despediram 100 jornalistas, vão reduzir despesas e provavelmente optarão por um modelo empresarial que deixará pelo caminho, mais tarde ou mais cedo, mais pessoas e um dos títulos. Há uma desproporção entre os meios de comunicação social escritos disponíveis e o universo da população leitora.
O Publico mantém até início de 2016 um programa de negociação de rescisões amigáveis dada a necessidade de reduzir os quadros e as despesas, algo que tem vindo a acontecer discretamente ao longo dos últimos anos mas que dificilmente deixará de conhecer alguma notoriedade neste final de 2015, início de 2016. O Público está ligado a Belmiro de Azevedo.
O DN e o JN, foi noticiado, parecem estar a preparar-se para a saída de um dos investidores de referência, depois da instabilidade surgida há uns anos em torno da Controlinveste de Joaquim Oliveira. Não se sabe muito bem o que vai acontecer, mas a verdade é que as coisas não continuam muito famosas, pese o facto do JN continuar a ser o jornal mais lido no norte e o segundo em termos nacionais logo depois do Correio da Manhã. Fala-se na saída do investidor angolano António Mosquito que pretende abandonar os quase 28% que possui na Global Média, proprietária daqueles dois títulos, bem como da TSF, do Jogo e do Dinheiro Vivo. Mosquito é detentor de 27,5% da Global Média, o mesmo que Joaquim Oliveira. Luiz Montez, genro de Cavaco Silva e ligado ao grupo que comprou o Meo Arena, detém 30% da empresa, sendo os restantes 30% diluídos pelos bancos credores da Controlinveste, nomeadamente BCP e Novo Banco. No final de 2013 este grupo apresentava um défice de tesouraria de 12 milhões de euros que devido a uma série de medidas de forte austeridade e contenção permitirá que em finais de 2015 esse valor seja apenas de 1 milhão de euros. Mesmo assim Mosquito pretende sair e fala-se numa nova redução de custos no grupo que continua ligado a Joaquim Oliveira apesar deste ter perdido em 2012-2013 a sua posição de titular dos 100% da empresa.
O jornal Económico e respectiva TV Económico também foram apanhados neste turbilhão e apesar de existirem potencias interessados, há uma dívida bancária muito grande que parece condicionar decisões a serem tomadas com urgência que a situação requer.
No caso da Madeira, o DN-M também devido a várias medidas empresariais e de gestão, resolveu problemas financeiros complexos, sentidos sobretudo entre 2012 e 2014, tudo indicando que estabilizou a sua situação, embora desconheça dados mais concretos. Quanto ao JM a sua privatização em 2016 é anunciada pelo Governo Regional que tenta, e bem, passar para os privados uma publicação que, de acordo com o meu entendimento, dificilmente encontrará neste ambiente de contenção e de crise algum feedback. O problema do JM é sobretudo encontrar investidores que garantam a sua continuidade num mercado muito limitado, de leitores e de anunciantes, cada vez mais limitado, cenário que, depois de confirmada a saída do Governo Regional - detentor de 100% da empresa, depois das saída da Diocese - se agravará ainda mais pelo que não me parece plausível pensar numa solução de sucesso. Isto apesar dos ganhos obtidos em matéria de despesas.
O falhanço editorial do Notícias da Madeira, nas suas duas versões, seguido do falhanço do projecto Diário da Cidade, quer em papel e numa segunda fase, na versão digital, são exemplos concretos das especificidades do mercado e dos problemas que continuam a subsistir, já que o centenário DN tem a seu favor o facto de pertencer a uma família - Blandy - que não acredito que deixe de fazer o esforço financeiro adequado, tal como já o fez no passado recente, para garantir a continuidade da publicação evitando medidas mais radicais que colocassem em causa a capacidade de resposta e a estrutura jornalística do DN.
Temo por isso que o sector da imprensa continue a ser o mais sacrificado tal como duvido que a situação se normalize dentro de um período de tempo muito curto. O mercado publicitário continua longe dos valores de outrora, as compras dos jornais apesar das tiragens, baixaram muito, as opções pela internet e por outros meios de comunicação portáteis têm vindo a crescer podendo estar a dificultar essa recuperação, pelo que continuo com muitas dúvidas quanto ao futuro do sector na RAM.
Este ano tivemos um primeiro sinal de que 2016 será decisivo para as rádios locais. O Governo Regional reduziu os valores dos contratos-programas assinados com as rádios locais, cerca de uma dezena, pelo que essa redução de recursos financeiros concedidos por via da compra de espaço publicitário - redução que numa fase inicial teria sido maior, algo que foi travado graças a pressões e a influências que se moveram nos bastidores e que impediram medidas ainda mais gravosas - vai colocar a prazo, bastante curto, problemas complexos, com impacto na redução de pessoal e na capacidade de realização própria, já diminuta ou pelo menos bastante reduzida, das referidas rádios.
Resta a RTP e RDP da Madeira, acreditando eu que com um governo do PS apoiado pela esquerda, a ideia de privatização, pelo menos no imediato, deverá ser abandonada. Isso faz com que em cima da mesa se coloquem de novo projectos para a dinamização do grupo estatal, não estranhando nada que progressivamente, em 2016, possam ocorrer mudanças significativas, quer em termos de estrutura de pessoas, de conteúdos e mesmo de gastos orçamentais. Não me parece que a proposta do governo do PSD-CDS para os centros regionais da Madeira e dos Açores se mantenha, e não me espantaria nada que em torno deste tema fosse surgindo uma certa partidarização do debate, relativamente ao qual os decisores precisam de passar ao lado. Julgo que a RTP-RDP na Madeira terão passado, há uns anos, de um orçamento da ordem dos 12 a 13 milhões de euros anuais - ou um pouco mais - para valores que serão agora da ordem dos 7 a 9 milhões de euros. Obviamente que o debate sobre o futuro da RTP e da RDP na Madeira terá que ser feito com uma forte componente política mas por quem seja capaz de impor ideias concretas em Lisboa.
Ora tudo isto causa-me um problema, porque sendo eu um homem de imprensa, qualquer dificuldade no sector é como se me dessem um soco no estômago. Lamento pela perda de títulos, lamento pelos problemas sociais causados a muitas pessoas, lamento pela marginalização da imprensa no combate que mantém com rádio e televisão que deixaram de ser concorrentes tão distantes como foram no passado. Enfim, há uma nova realidade que provavelmente não foi bem antecipada, não foi devidamente estudada e tende a criar-nos a todos problemas complexos imprevisíveis. Oxalá que tudo se recomponha, mas sinceramente tenho muitas dúvidas, sobretudo relativamente a alguns projectos optimistas, demasiado optimistas, que por aí deambulam sem um plano B que me parece obrigatório e recomendável.
Um programa (de Lisboa) sem grandes novidade se apenas com generalidades
O programa do Governo do PS de António Costa - por sinal um dos políticos que mais conhece a comunicação social, que melhor se movimenta e que provavelmente mais consegue "jogar" com ela - assenta em generalidades. Muita teoria, coisas vagas, não havendo um conjunto de medidas concretas, sobretudo para os meios de comunicação social do estado, concretamente a RTP/RDP e a Lusa cuja continuidade e importância, no caso desta, nem se questiona ou discute. Resta saber se a Lusa terá meios para responder ao aumento das solicitações dado que uma crise na imprensa, na rádio ou na televisão, particularmente na imprensa, coloca-a ainda mais dependente dos serviços de informação disponibilizados pela agência de notícias.
Eis o que diz o programa de governo aprovado na Assembleia da República sobre comunicação social, independentemente de referências isoladas feitas a alguns deles nos diferentes itens do programa:
"Assegurar as liberdades de expressão e informação e dos órgãos da comunicação social
No quadro das liberdades e garantias fundamentais que compete ao Estado assegurar, será dada especial atenção a domínios críticos como a oferta da televisão digital terrestre, a concentração e à transparência da propriedade e a política de incentivos aos órgãos de comunicação social. Assim, o governo irá:
• Alargar a oferta de serviços de programas através da Televisão Digital Terrestre, bem como acelerar o processo de modificação da rede de distribuição por forma a garantir elementares condições técnicas de recepção dos sinais de rádio, televisão e Internet. Proceder-se-á igualmente à reavaliação do preço imposto aos operadores de televisão pelo custo de distribuição do sinal televisivo;
• Reforçar o regime jurídico relativo à transparência e à concentração da propriedade, que não deverá por em causa a capacidade competitiva dos grupos de média portugueses. O regime da transparência deverá permitir a identificação de toda a cadeia de entidades detentoras de participações qualificadas nos órgãos de comunicação social e determinar uma efetiva obrigação de prestação de contas que evidencie o movimento dos capitais de todos os grupos de média a operar em Portugal;
• Assegurar que os apoios ao setor privilegiem a qualificação das empresas e a sua sustentabilidade, nomeadamente promovendo a criação de novos modelos de distribuição, a produção de conteúdos versáteis e verdadeiramente inovadores e a empregabilidade dos jornalistas;
• Rever o modelo de financiamento da ERC, garantindo a sua independência face ao poder político e assegurar uma maior articulação com as entidades reguladoras das comunicações e da concorrência"
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