quarta-feira, novembro 21, 2012

Opinião pessoal: " A Farsa (II)"

"Dou-vos quatro exemplos da farsa deste Orçamento de Estado: a redução da taxa do IRS de 4% para 3,5%, o aumento do IRS sobre os subsídios de refeição, a redução de 30% para 50% das transferências para as fundações, o pagamento do IMI em três prestações em vez das duas, quando ultrapasse os 500 euros e a redução dos cortes no ensino superior. Por que razão esperou o governo de coligação por propostas dos deputados da maioria e não introduziu essas mudanças na versão original já aprovada pelo parlamento na generalidade? Encenação política previamente montada e concertada? Embuste? Medo do aumento da contestação social? Receio de uma intervenção do Presidente da República e do Tribunal Constitucional? Penso que tudo isso junto. Mas essencialmente o fracasso e o medo. O fracasso de todas as previsões anteriores, o medo da contestação social e da violência, até porque não é por acaso que Passos tem hoje um dispositivo de segurança pessoal superior ao que Cavaco Silva tem. Este governo de coligação mentiroso, ladrão e ilegítimo tem medo das pessoas, foge delas, rodeia-se de segurança, mergulha no submundo, não enfrenta os portugueses, não os ouve, impõe medidas sem negociação, sem atender à realidade do país que de facto somos, exerce pressão política mesmo no seio da área política preenchida pela atual maioria, opta pela descarada chantagem e pela ameaça - sei do que estou a falar! - não sai à rua. Esconde-se. Teme a revolta que ele próprio alimenta e instiga.
Vamos aos exemplos que anteriormente referi:
a) redução da taxa do IRS de 4% para 3,5%. Ficamos entretanto a saber que a redução da sobretaxa de IRS de 4% para 3,5% terá um efeito ligeiro no imposto a pagar pelos contribuintes. Simulações feitas por uma empresa da especialidade a pedido da agência Lusa mostram que "a diminuição de 0,5 pontos percentuais na sobretaxa extraordinária leva a um ligeiro decréscimo do valor anual de imposto a pagar na generalidade dos níveis de rendimentos". De acordo com as simulações, a poupança dos contribuintes com esta redução variará entre pouco mais de 20 euros e pouco mais de 240 euros por ano, consoante os níveis de rendimento e situação familiar do agregado. Por exemplo, no caso de um casal com dois filhos em que ambos os cônjuges trabalhem no sector público e cada um receba um salário bruto mensal de cerca de mil euros, a redução do imposto a pagar por via do corte da sobretaxa será apenas de 22,26 euros no final do ano. Mas no caso de um casal com dois filhos, em que ambos os cônjuges trabalhem no sector privado e que recebam um salário mensal bruto de cerca de 2500 euros, situação em que a poupança de IRS por via da alteração na sobretaxa será de 241,06 euros no final do ano. Estamos claramente perante uma aldrabice, pois a esmagadora maioria das pessoas beneficiará de montantes insignificantes decorrentes desta redução, mas que rapidamente serão roubados por este governo noutras áreas – não acreditem em cedências nem em favores por parte da dupla Passos-Gaspar. O que se trata é de uma habilidade para neutralizar o descontentamento popular crescente. Estamos a falar de um governo pouco sério, cego, pau-mandado de estrangeiros e que não hesita em aumentar o desemprego para pagar a banca e facilitar o capital.
b) aumento do IRS sobre os subsídios de refeição – basicamente trata-se de uma situação que demonstra o embuste presente em todas estas propostas cozinhadas pelos deputados da maioria. Ao mesmo tempo que reduziram a taxa sobre o IRS, resolveram propor o aumento da carga tributária que incidirá sobre os subsídios de refeição. Em 2013 os subsídios pagos em dinheiro e superiores a 4,27 euros passam a pagar IRS e contribuições para a segurança social. Até agora estavam isentos de IRS e segurança Social os valores diários até 5,12 euros, mas a partir do próximo ano a referência diminui quase um euro. É, como diz o povo, tirar com uma mão para roubar com a outra…
c) redução de 30% para 50% das transferências para as fundações – não se percebe esta encenação. Afinal houve ou não um grupo de trabalho opara inventariação das fundações e propor medidas concretas, quer de extinção de algumas, quer de redução da s transferências do Estado? É ou não um facto que o governo de coligação já anunciara reduções da ordem dos cerca de 30% para as fundações? Por que razão esse aumento dos cortes não foi superior na versão original do orçamento? Para que existisse uma margem, de manobra para esta farsa dos deputados da maioria? Esta redução de 50% representa uma poupança de quanto relativamente aos anteriores 30% previstos? Quais as fundações que serão afetadas por esta medida?
d) pagamento do IMI em três prestações em vez das duas, quando ultrapasse os 500 euros – o problema não reside apenas no modelo de pagamento. O que está em causa é o impacto da avaliação das casas e as consequências do agravamento do IMI para milhares de famílias. Há especialistas que alertam para valorizações intoleráveis e para o risco de amentarem as famílias sem possibilidades de assumirem esse pagamento, apesar da manutenção da cláusula de salvaguarda que o governo inicialmente retirou mas depois voltou a reintroduzir. Qual será a resposta do governo? Vai penhorar as casas? Vão desalojar famílias por causa do IMI? Vai o governo ser confrontado com uma onda de suicídios como os que ocorreram em Espanha e que obrigaram governo e oposição a concertarem esforços para imporem regras aos bancos que nunca as aceitaram, no que aos despejos diz respeito? O que está em causa, mesmo com esta distribuição do pagamento valor do IMI por três prestações em vez das atuais duas, não é esta questão em concreto mas aquilatar o impacto social que o aumento do IMI terá nos orçamentos já sem margem de manobra dos portugueses e a revolta que esta situação vai gerar a quem já paga com grande dificuldade os empréstimos bancários contraídos para a compra da sua casa.
e) redução dos cortes no ensino superior. Trata-se de mais uma vergonha ao que tudo indica. Apesar do espalhafato feito pelo ministro Crato e pela propaganda oficial, cada vez mais desacreditada e incompetente, em torno deste assunto, ficou-se a saber – e várias organizações já protestaram contra este malabarismo – que a necessária redução dos cortes ao ensino superior (apesar da reforma profunda que este carece, a começar pela coerência e pela lógica da oferta curricular universitária) que ameaçavam as universidades e determinaram um inédito protesto dos reitores (que obviamente seria secundado pelos estudantes e professores) foi feita à custa da transferência de verbas pertencentes a fundos que estavam destinados ao Ensino Básico e Secundário, situação que foi deliberadamente escondida pelo governo de coligação e pelos deputados da maioria. Uma vergonha!" (JM)