Indecisos voltam a
subir e superam largamente os das legislativas de 2022. 61% dos inquiridos da
sondagem ICS/ISCTE dizem que é “altura de mudar”. Mas 40% dos que escolhem o BE
admitem mudar de voto e 31% dos que escolhem a IL também. Serão estas as eleições
mais imprevisíveis de sempre? No arranque na campanha eleitoral, quando
terminou o trabalho de campo da sondagem do ICS/ISCTE, havia ainda 18% de
indecisos — um número que cresceu dois pontos face a janeiro, apesar dos 32
debates entre os candidatos e dos três meses de pré-campanha. Trata-se do valor
mais alto desde o início da crise política, largamente superior à intenção de
voto direta do Chega e não muito longe da que obtêm AD e PS. Mais significativo
ainda, trata-se de um número largamente superior ao que apontava a última sondagem
antes das legislativas de há dois anos: naquela altura eram 11,5% apenas, um
número que desceu lentamente nos três meses anteriores à eleição.
Mas há dois dados adicionais a contribuir para a elevada imprevisibilidade desta eleição. O primeiro: um em cada quatro (24%) dos inquiridos não deu a “certeza de ir votar” — incluindo aqueles eleitores que já indicaram um sentido de voto, de 6% e 26% consoante cada um dos partidos. O segundo dado relevante é que 22% dos eleitores que já escolheram o seu voto admitem que a sua escolha não é ainda “definitiva”. São mais de um em cada cinco eleitores, embora sejam diferentes consoante o partido em causa (já vamos a esse ponto).
Retenha este dado:
nas legislativas de 2022, 24% dos eleitores decidiram o seu sentido de voto nos
últimos dias de campanha eleitoral, o suficiente para que as eleições
terminassem com uma surpreendente maioria do PS. Os dados desta sondagem
indicam que podemos estar perante uma eleição tão ou mais imprevisível do que a
anterior.
A PENSAR NO VOTO
ÚTIL?
Estando muitos
votos em aberto, o que o estudo do ICS/ISCTE demonstra é que há partidos que
correm mais riscos, os partidos mais pequenos, em particular o BE e a IL. Nesta
sondagem, depois dos inquiridos terem posto uma cruz no boletim de voto, os
entrevistadores perguntaram-lhes se a sua escolha “já é definitiva ou ainda
pode mudar até ao dia da eleição”. Na resposta, 40% dos eleitores do BE
responderam que “ainda pode mudar”. É o número mais alto, mas o da IL anda
perto: 31% dos seus potenciais votos estão condicionados. Os do Chega também
não parecem imunes — 27% (quase um em cada três) estão em dúvida —, e o
indicador avançado disso pode ser a descida de quatro pontos do Chega nesta
sondagem, com uma subida igual da votação na AD.
A possibilidade de uma deslocação de eleitores para o voto útil parece confirmada quando se olha para as respostas de quem diz votar nos dois principais partidos: PS e AD têm os valores mais altos de voto consolidado, 82%. Em consequência disto, têm também o valor mais baixo de voto em dúvida: ‘apenas’ 17%, menos de um em cada cinco. Estes dados são confirmados pela questão feita aos inquiridos antes de lhes ser entregue o boletim para indicação de voto: 88% dos eleitores potenciais da AD dão a “certeza de ir votar” no dia 10 de março, 87% dos eleitores do PS também. Ao passo que no BE são 80% e na IL 74%.
É ALTURA DE MUDAR
PARA 61%
Mas o histórico de
oito anos no Governo traz dificuldades adicionais a Pedro Nuno Santos. Quando o
inquérito questiona se “Portugal tem estado a ir pelo caminho certo”, a
resposta é inegavelmente negativa: 71% dizem que não (incluindo mais de metade
dos eleitores de esquerda e 72% dos que se localizam ao centro), contra apenas
20% que apontam o “caminho certo”. Quando a pergunta incide em particular sobre
os Governos socialistas, 56% dos inquiridos consideram que o PS tem feito um
“mau trabalho” (sendo 39% deles de esquerda e 55% do centro), contra 35% de
opinião contrária. E, por fim, quando se pergunta sobre se esta “é altura de
mudar”, 61% dizem que sim e só 30% respondem que “ainda não”.
Sendo a vontade de
mudança clara neste estudo, os pormenores das respostas mostram um cenário mais
complexo, já que a palavra “mudar” pode indiciar vontades diferentes consoante
os inquiridos. É que entre aqueles que pedem mudança, 16% assumem que votam nos
partidos à esquerda (podendo, por exemplo, estar a pedir uma nova ‘geringonça’)
e 46% localizam-se à direita no espectro político.
Essa vontade de virar a página é menor nos eleitores que (até janeiro) mostravam preferir os socialistas — sobretudo os mais velhos e os que têm menos estudos. Mas é grande entre os indecisos: 58% esperam mudança, 24% nem por isso. Onde se percebe que estas eleições estão mesmo em aberto é quando se olha para os indecisos: estes são 17% do total de eleitores que desejam uma mudança, só abaixo dos que escolhem a AD, mas também 14% dos que dizem que “não é altura”. Curiosamente, a diferença é ainda maior nos eleitores que dizem que não vão votar: 65% queriam mudar, 16% não.
QUEM SÃO ESTES
INDECISOS?
O retrato dos que ainda não decidiram em quem votar mostra que são em maioria mulheres (56%) e têm 51 anos — mais velhos, em média, do que os que não tencionam votar. Ideologicamente, a maioria (38%) localiza-se ao centro, sendo 22% de direita e 17% de esquerda. Há ainda 23% que não se posicionam politicamente. Aliás, segundo o relatório desta sondagem, e em comparação com a distribuição da amostra em geral, os indecisos mostram “uma propensão inferior para escolherem posições quer à esquerda, quer à direita e, pelo contrário, uma maior tendência para recusarem ou não saberem como se posicionar desta forma”. Os inquiridos que ainda não sabem como votar são mais velhos do que os que declaram desde já que não tencionam votar. No entanto, estes dois grupos são também mais jovens do que os que indicaram tencionar votar no PS ou na AD.
FICHA TÉCNICA
Sondagem cujo
trabalho de campo decorreu entre os dias 17 e 25 de fevereiro de 2024. Foi
coordenada por uma equipa do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de
Lisboa (ICS-ULisboa) e do ISCTE — Instituto Universitário de Lisboa
(ISCTE-IUL), tendo o trabalho de campo sido realizado pela GfK Metris. O
universo da sondagem é constituído pelos indivíduos com idade igual ou superior
a 18 anos e capacidade eleitoral ativa, residentes em Portugal Continental. Os
respondentes foram selecionados através do método de quotas, com base numa
matriz que cruza as variáveis Sexo, Idade (4 grupos), Instrução (3 grupos),
Região
(5 Regiões NUTII) e Habitat/Dimensão dos agregados populacionais (5 grupos). A
partir de uma matriz inicial de Região e Habitat, foram selecionados
aleatoriamente 102 pontos de amostragem onde foram realizadas as entrevistas,
de acordo com as quotas acima referidas. A informação foi recolhida através de
entrevista direta e pessoal na residência dos inquiridos, em sistema CAPI, e a
intenção de voto em eleições legislativas recolhida através de simulação de
voto em urna. Foram contactados 2972 lares elegíveis (com membros do agregado
pertencentes ao universo) e obtidas 907 entrevistas válidas (taxa de resposta
de 31%, taxa de cooperação de 45%). O trabalho de campo foi realizado por 46
entrevistadores, que receberam formação adequada às especificidades do estudo.
Todos os resultados foram sujeitos a ponderação por pós-estratificação de
acordo com a frequência de prática religiosa e a pertença a sindicatos ou
associações profissionais dos cidadãos portugueses com 18 ou mais anos
residentes no Continente, a partir dos dados da vaga mais recente do European
Social Survey (Ronda 10). A margem de erro máxima associada a uma amostra
aleatória simples de 803 inquiridos é de +/- 3,25%, com um nível de confiança
de 95%. Todas as percentagens são arredondadas à unidade, podendo a sua soma
ser diferente de 100% (Expresso, texto e grafismo dos jornalistas David Dinis e
Sofia Miguel Rosa)
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