A Ryanair apresentou um recurso no Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) contra a decisão da Comissão Europeia de dar “luz verde” às ajudas públicas à TAP, com o objectivo de anular o que foi aprovado em Dezembro do ano passado. O recurso da decisão de Bruxelas, que envolve o apoio em curso no valor de 2,5 mil milhões de euros (a que se somam depois ajudas da covid-19 de cerca de 700 milhões, perfazendo 3,2 mil milhões), foi apresentado pela Ryanair no final do passado mês de Julho. Ao PÚBLICO, fonte oficial da Comissão Europeia, que é a entidade visada no processo, confirmou a existência do recurso, mas afirmou que, tal como sempre faz nestes casos, não se pronunciava antes da decisão do tribunal, e que não era possível antecipar quando é que esta será proferida.
A mesma fonte relembrou que os 2,5 mil milhões foram aprovados ao abrigo das regras europeias para as ajudas de Estado, de forma a permitir à TAP “regressar à viabilidade”. O PÚBLICO enviou questões ao Ministério das Infra-Estruturas, mas não teve resposta. De acordo com a documentação do processo que está disponível no TJUE, a companhia aérea irlandesa apresenta nove fundamentos para defender a anulação da decisão de Bruxelas.
Os nove argumentos da Ryanair
Para a Ryanair, não ficou demonstrado que “o plano de reestruturação é
realista, coerente e de grande envergadura e adequado para restabelecer a
viabilidade a longo prazo da TAP sem recorrer a novos auxílios estatais num
prazo razoável”.
Depois, a empresa defende que a elegibilidade da TAP para os apoios não
foi demonstrada. Diz que Bruxelas cometeu “um erro manifesto de apreciação no
que respeita à demonstração do risco de perturbação de um serviço importante e
do papel sistémico da TAP” e que não foram demonstrados nem a adequação nem a
proporcionalidade do auxílio. E que não foram analisados “de forma adequada os
efeitos negativos do auxílio”.
Além disso, a Ryanair refere que não foi demonstrada “a necessidade de
uma intervenção do Estado e o seu efeito de incentivo (i.e., não fornece uma
comparação com um cenário alternativo credível que não implique auxílios
estatais e não demonstra que a TAP esgotou todas as opções de mercado)”.
Por fim, argumenta que a Comissão Europeia não cumpriu o seu dever de
fundamentação, e que a decisão violou “disposições específicas” do tribunal
europeu e “os princípios gerais da não discriminação, da livre prestação de
serviços e da liberdade de estabelecimento”.
Os “remédios” de Bruxelas
Em Março de 2021, o presidente executivo da Ryanair, Eddie Wilson (que
substituiu Michael O’Leary, passando o histórico gestor para a presidência do
grupo), já tinha afirmado ao PÚBLICO que a empresa ia lutar contra os apoios
estatais “até às últimas instâncias” (a empresa apresentou queixa contra todos
os apoios dados por governos europeus às companhias nacionais).
“Estamos a atravessar uma pandemia e há muitos estímulos para vários
sectores. E não temos nenhum problema com isso, mas desde que esses apoios
sejam entregues às empresas de forma igual, e não porque uma empresa é de um
determinado país, como França”, afirmou o gestor.
“Não temos problemas com os estímulos económicos ou com as ajudas, desde
que sejam aplicadas de forma igual. E o que está a ser feito neste momento não
beneficia os países”, acrescentou, defendendo um apoio ligado ao volume de
transporte de passageiros para um determinado país.
No caso da TAP, a Ryanair tentou logo no Verão de 2020 anular a
aprovação do apoio estatal de 1200 milhões concedido por Bruxelas após a
eclosão da pandemia e, em Maio de 2021, o TJUE deu-lhe razão, ao afirmar que o
texto do executivo comunitário continha “lacunas”. Apesar disso, a decisão de
anulação do apoio teve efeitos suspensivos até nova análise da Comissão
Europeia.
O pedido global de ajuda à TAP apenas foi formalizada pelo Governo
português liderado por António Costa em Junho de 2021, e, em Julho, Bruxelas
comunicou a abertura de um processo de investigação aprofundada às ajudas de
Estado, respondendo às críticas do TJUE, ao mesmo tempo que reaprovou a
primeira fatia de apoio público de 1200 milhões.
Finalmente, em Dezembro de 2021, foi aprovado o apoio do executivo
português à TAP, mas obrigando a “remédios” ligados à mitigação de impactos
negativos na concorrência, como o fim do negócio de manutenção no Brasil (o que
já foi feito), a alienação das participações na Groundforce (49,9%, com a
empresa num processo de insolvência) e na Cateringpor (51%), e a cedência de 18
slots no aeroporto de Lisboa (que já estão com a Easyjet, que ultrapassou a
Ryanair).
Com a aprovação do plano, afirmou nessa altura em entrevista ao PÚBLICO
a presidente executiva da companhia aérea, Christine Ourmières-Widener, a
percepção de risco da TAP “mudou de imediato”.
Neste momento, a TAP tem ainda para receber 990 milhões de euros até ao final do ano, e a presença dos accionistas privados resume-se a 5% de trabalhadores e pequenos investidores na TAP SGPS, e que vão ver o seu capital diluído muito em breve (Publico, texto do jornalista Luís Villalobos)
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