terça-feira, novembro 29, 2022

Revisão constitucional: Jorge Miranda avisa que aumentar poderes do presidente é das propostas "mais perigosas"

 

O constitucionalista Jorge Miranda considera as proposta para aumentar o mandato e os poderes do Presidente da República das “mais perigosas” já apresentadas e associa-as a constituições ditatoriais. Confessa-se ainda “muito preocupado” com o crescimento da extrema-direita. As declarações foram feitas numa entrevista conjunta à TSF e ao “Jornal de Notícias”, em que Jorge Miranda começou por classificar de “lamentável” a decisão de iniciar agora um processo de revisão constitucional, “quando são tantos os problemas que o país enfrenta”.

Relativamente às propostas apresentadas, o constitucionalista referiu-se especificamente à do PSD, que prevê aumentar para sete anos o mandato do Presidente da República (PR), manifestando-se “totalmente em desacordo”. Para Jorge Miranda, essa possibilidade, a par com um aumento do poder do PR, “pode significar pôr em causa o sistema semipresidencial ou de parlamentarismo racionalizado, que foi consagrado na revisão constitucional de 1982”. “Um mandato muito longo do PR era o que havia na Constituição de 1933 e só em constituições num sentido ditatorial é que os mandatos do PR são muito longos”, explicou.

Assinalando que atualmente o PR é eleito por cinco anos e só pode ser reeleito uma vez, Jorge Miranda defendeu a importância de dar aos cidadãos eleitores a possibilidade de emitir um juízo à forma como o PR tem exercido o poder num primeiro mandato. “É mais democrático admitir a reeleição ao fim de um tempo razoável do que prescrever sete anos sem a possibilidade de os cidadãos emitirem qualquer opinião e visão.”

O constitucionalista abordou também o aumento de poderes do PR, preconizado em vários projetos, considerando ser “extremamente perigoso”, e defendeu a atual definição de PR consagrada na Constituição, pois admite “um exercício em interdependência institucional com o parlamento e com o Governo” e “um juízo dos cidadãos eleitores ao fim de um certo número de anos”. E sublinhou: “Acho inadmissível a proposta e uma das mais perigosas que foram apresentadas.”

Jorge Miranda foi também questionado sobra a forma como olha para o crescimento global dos populismos e dos movimentos de extrema-direita, admitindo “muita preocupação”. Lembrando a chegada, ou aproximação, ao poder da extrema-direita em vários países europeus, o constitucionalista afirmou que pode estar em causa o regime democrático e alertou para a necessidade de os tribunais estarem “atentos”. “Particularmente o Tribunal Constitucional. Um problema grave é a não cooptação de juízes no Tribunal Constitucional. Há um ou dois juízes cujo mandato já terminou e não foram cooptados aqueles que deveriam suceder. E acho que isso é perigoso.”

Assinalando que foi o Chega que desencadeou a revisão constitucional, Jorge Miranda considerou que não havia necessidade de o PSD e o PS apresentarem projetos a seguir, e que deveriam deixar o Chega a “falar sozinho”. “Ainda por cima o Chega, com propostas inadmissíveis, prisão perpétua, não limitação à inviolabilidade do domicílio, revogação dos limites materiais de revisão constitucional. Só há uma proposta do Chega que acho favorável, que é no sentido da valorização da língua portuguesa. O resto é extremamente perigoso. E, volto a dizer, o que os outros partidos democráticos deviam fazer era ficar de braços cruzados, deixar o Chega a apresentar projetos" (Expresso)

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