quinta-feira, março 26, 2020

Covid-19. Número de mortes de homens é o dobro das mulheres. Porquê?

A pergunta tem sido levantada em países como Espanha, Itália, China ou Coreia do Sul. Para já, a resposta é clara: são sobretudo os anteriores problemas de saúde que os colocam em maior risco. Cerca de metade dos casos de novo coronavírus confirmados em Portugal são homens (47%) mas entre os óbitos registados a percentagem é bem maior. Segundo os dados divulgados esta quarta-feira pela Direção-Geral da Saúde (DGS), 70% das mortes registadas são de homens, ou seja, contam-se 30 óbitos do sexo masculino num total de 43. Não é só em Portugal que se verifica essa diferença: em Espanha, Itália, China e Coreia do Sul, a tendência é a mesma.
 “Para já, não se vê nenhuma razão biológica para que este vírus afete mais os homens do que as mulheres. A explicação passará pelos comportamentos de risco dos homens e os seus problemas de saúde anteriores, semelhante ao que leva as mulheres a ter uma maior longevidade”, aponta o virologista Pedro Simas, investigador do Instituto de Medicina Molecular (IMM).


Os dados da DGS divulgados esta quarta-feira mostram que só no grupo etário entre os 70 e os 79 anos é que há mais homens do que mulheres infetados. Em todos os restantes grupos o sexo feminino surge em maioria, representando 53% do total. Já entre os óbitos confirmados, das 43 mortes, apenas 13 são do sexo feminino e só nas idades acima dos 80 anos é que há um equilíbrio entre homens e mulheres.
Afastando também a possibilidade de a diferença se dever às características do vírus, o epidemiologista Guilherme Duarte aponta algumas explicações possíveis, tendo em conta que uma grande parte das mortes acontece em pessoas mais idosas com anteriores problemas de saúde, como problemas respiratórios, hipertensão ou diabetes.
 “Pode haver uma relação com o facto de os homens tenderem a desvalorizar os seus sintomas e reagirem a uma doença numa fase mais tardia. Além disso, a carga tabágica também tem peso. Durante muito tempo a percentagem de homens fumadores era maior do que a das mulheres e isso significa que têm maiores debilidades respiratórias”, acrescenta o especialista, membro da Associação Nacional dos Médicos de Saúde Pública (ANMSP).
O tabaco tem sido precisamente apontado como uma das principais explicações para esta diferença dos números na China, onde não só a percentagem de fumadores é uma das maiores do mundo, como a diferença entre homens e mulheres é muito grande. Cerca de 54% dos homens são fumadores, enquanto apenas 3,4% das mulheres dizem ter fumado alguma vez na vida, segundo um estudo de 2016 citado pelo “Los Angeles Times”.
Em paralelo ao tabaco, estão os problemas cardiovasculares. “Sabemos que os homens sofrem mais destes problemas do que as mulheres, por exemplo, com enfartes agudos do miocárdio”, afirma o epidemiologista. “Diria, portanto, que as explicações poderão neste momento passar por uma questão de prevenção, ou seja, se se respeita ou não as regras de distanciamento social, assim como os hábitos sociais e os problemas anteriores de saúde.”
Lá fora
Também em Espanha, segundo um artigo publicado esta semana no “El País”, a existência de doenças anteriores é a principal explicação para que o número de homens a morrer seja o dobro das mulheres. Em Itália, os homens representam 60% dos infetados e 70% dos óbitos, segundo os dados oficiais. E a tendência repete-se na China: um estudo sobre doentes infetados entre dezembro de 2019 e fevereiro de 2020 mostra que 60% dos casos positivos são do sexo masculino. Na Coreia do Sul, cerca de 54% dos óbitos foram entre os homens.

É de sublinhar ainda, como salientam os especialistas, que a comunidade científica em todo o mundo está ainda a investigar e a tentar perceber com maior pormenor as características deste vírus, pelo que os estudos mais minuciosos só serão conhecidos daqui a algum tempo (Texto de Raquel Albuquerque e Infografia de Jaime Figueiredo, Expresso)

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