domingo, março 14, 2021

Governo reforça apoios, mas empresas asfixiam

 

Lay-off simplificado, programa Apoiar, linhas de crédito com garantia pública, moratórias fiscais... É por aqui que deve passar o guião do Governo para apoiar as empresas face ao prolongamento do confinamento. Os patrões veem estas hipóteses com bons olhos, mas lembram que o dinheiro tarda em chegar às empresas e que as medidas para reforçar a capitalização continuam no papel. Aliás, o Fundo Monetário Internacional (FMI) alerta que os apoios às empresas em Portugal e na Europa não evitam insolvências, e os advogados avisam que pode aproximar-se uma onda de falências.

Até ao fecho desta edição, o Governo não apresentou oficialmente novas medidas, mas o Expresso sabe que o ministro da Economia, Pedro Siza Vieira, reuniu-se na última semana com confederações patronais e sinalizou o que está em cima da mesa. Sem detalhes nem compromissos fechados, falou no alargamento do lay-off simplificado, recuperado em janeiro apenas para empresas encerradas por imposição administrativa e que agora deverá aproximar-se do modelo inicial — como pediam os patrões —, permitindo o acesso a empresas por quebras de faturação. Outra possibilidade é prolongar os apoios ao emprego, seja pelo lay-off ou pelo apoio à retoma, até setembro.

Apoios às empresas garantem liquidez, mas não evitam falências, diz o Fundo Monetário Internacional

Acresce que esta semana, na concertação social, a ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, manifestou disponibilidade para recuperar o incentivo à normalização da atividade para as empresas que forem saindo destes dois mecanismos de apoio, apurou o Expresso junto de fonte do Governo. Em 2020, este incentivo permitiu às empresas receber um ou dois salários mínimos, consoante a modalidade, por cada trabalhador que tivesse estado em lay-off.

Siza Vieira sinalizou ainda o reforço da dotação do programa Apoiar.pt, que está esgotada, e o eventual alargamento a mais sectores de atividade. Antecipou também a extensão dos períodos de carência nas linhas de crédito com garantia pública, bem como das moratórias fiscais. O ministro disse estar consciente do problema das moratórias bancárias — terminam em setembro —, mas aí tudo depende da Europa. E garantiu que o pagamento da compensação pelo aumento do salário mínimo, no valor de 80% do aumento das contribuições sociais a cargo das empresas, acontecerá ainda em março.

PATRÕES NA EXPECTATIVA

As medidas vêm ao encontro das exigências dos patrões. “A questão é como vão ser concretizadas e quando vão chegar às empresas”, frisa João Vieira Lopes, presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP). Francisco Calheiros, presidente da Confederação do Turismo de Portugal (CTP), corrobora: “O grande problema das medidas de apoio é o atraso com que têm chegado ao terreno.” E dá o exemplo do apoio às rendas, “que está previsto desde janeiro, mas três meses depois as empresas continuam sem receber qualquer apoio”.

Numa entrevista recente ao Expresso, António Saraiva, presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), sublinhou que “os empresários recebem os apoios com cinco ou seis meses de atraso e têm de manter os postos de trabalho”. Eduardo Oliveira e Sousa, presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), elenca as sucessivas alterações aos apoios. “Assim não se consegue gerir uma empresa. A regulamentação está sempre a mudar.”

Os patrões apontam ainda baterias ao atraso nos apoios à capitalização. Previstos desde junho de 2020, continuam no papel, garantem. E, para Francisco Calheiros, “são fundamentais para a retoma”. O estudo “Corporate Liquidity and Solvency in Europe During Covid-19: The Role of Policies”, publicado pelo FMI, realça que as políticas públicas para combater a crise, em Portugal e na Europa, têm garantido liquidez às empresas mas não evitam insolvências. Com a informação disponível até agosto de 2020, sinaliza que, “sem apoio adicional ao capital, estão em risco cerca de 15 milhões de empregos” na Europa. Para Portugal, estima que, sem apoios, a proporção de empresas insolventes — em que os capitais próprios são negativos — subiria 11 pontos percentuais face ao pré-crise, para mais de 25%. O problema é que, tendo em conta as medidas, o aumento é quase da mesma ordem.

E a situação terá piorado com o agravar da pandemia. É o que sinalizam os advogados ouvidos pelo Expresso. “Tem aumentado muito o número de empresas a preparar despedimentos coletivos”, diz Pedro da Quitéria Faria, sócio da Antas da Cunha. E “envolvem agora muito mais trabalhadores”, frisa Américo Oliveira Fragoso, sócio da Vieira de Almeida. O problema, dizem, passa pela volatilidade e morosidade dos apoios. “Não só são insuficientes como chegam tarde ou nem têm efeito prático”, diz Américo Fragoso, reforçando que “em alguns casos podem até antecipar decisões que poderiam ser evitadas”. Também Pedro da Quitéria Faria admite que “nesta fase já deveria conseguir-se que o dinheiro chegasse mais rápido às empresas”. Os advogados admitem que em 2021 as sequelas da pandemia se façam sentir com uma intensidade ainda não vista (Expresso, texto das jornalistas CÁTIA MATEUS e SÓNIA M. LOURENÇO)

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