quinta-feira, março 11, 2021

Antecipando (ou tentando) a corrida eleitoral no Funchal: Miguel Gouveia emacipa-se politicamente e Pedro Calado tem riscos


A “jogada” política de Miguel Silva - que mostra que não se trata de nenhum amador, politicamente falando, como alguns erradamente ainda sustentam - e a aventura, algo estranha, confesso, de Calado ao trocar o Governo Regional onde é um dos membros mais influentes trocar CMF e pela incerteza de uma vitória eleitoral, mesmo com coligação com um CDS em perda eleitoral tal como o PSD-M, são os dois apontamentos em foco nesta corrida pela conquista da edilidade da capital madeirense.

Pedro Calado - e justifico a minha estranheza pela decisão, caso ela seja política, porque se for uma opção pessoal, tudo muda de figura e nada a dizer quanto a isso - quando foi chamado ao GRM, ainda no primeiro mandato de Albuquerque (não tendo feito parte desde início, como era ponto assente, ao que consta por não ter concordado com algumas escolhas) era visto como uma espécie de salvador de um GRM em queda, com uma imagem degradada, com falta de empatia popular, com um discurso político fraco e por vezes patético, com um MA perfeitamente entalado e sem soluções, e com alguma incompetência à mistura, há que reconhecê-lo em áreas-chave da governação. 

Por isso, a minha estranheza tem a ver com isso, com o facto da Madeira estar à beira de entrar naquele que será um dos piores ciclos dos últimos anos, na economia, nas finanças e nas questões sociais, e que, neste quadro nada estimulante, Pedro Calado opte por outras prioridades políticas e pessoais. Correndo o risco da incerteza eleitoral e do impacto negativo - resultante em caso de um eventual desaire da coligação PSD-CDS – em caso de contrariedade na capital, nomeadamente das consequências a curto ou médio prazo de um desaire. O mesmo se dirá de Miguel Gouveia se for derrotado no Funchal e da fragilidade para Cafofo e a sua liderança em caso de uma derrota socialista na capital, um dos emblemas dos socialistas, conquistados em 2013 graças a uma arriscada estratégia eleitoral - onde Vítor Freitas foi peça essencial – que resultou ganhadora. Essa opção de Calado, que não sei se é pessoal ou se é política, pode enfrentar outras potenciais vulnerabilidades (e sobre isso o PS-M já deu alguns sinais...). Acresce que Calado pode ser acusado pela oposição socialista – e mesmo pela restante oposição que concorrerá no Funchal fora da coligação liderada por Gouveia - de fugir às dificuldades da governação, o que pode ter algum impacto nas decisões do eleitorado.


A postura de Pedro Calado em vários debates parlamentares - e recordo o Plano e Orçamento para 2021 e outros debates sectoriais - acabou por "enterrá-lo", no bom sentido, mostrando que a sua saída do GRM fragilizará o executivo, a coligação e o PSD-M.

Mas julgo que os "pensadores" do PSD-M sabem o que estão a fazer, os riscos que correm e a inevitabilidade de assumirem as suas responsabilidades políticas, se saírem fragilizados deste processo eleitoral autárquico que eu acredito vai revelar surpresas, incluindo no Funchal.

Miguel domou o PS-M e Calado pode alargar a coligação anti-PSD-CDS

Parece-me evidente que o actual autarca do Funchal poderá ter "domado" o PS-M, já que eram vários os que sustentavam que Miguel Gouveia tinha algumas dificuldades com a dupla Cafofo-Iglésias, algo que sendo matéria do foro interno dos socialistas, dificilmente se poderá comentar dada a escassez de sinais de pretensas divergências públicas que o atestem.

Talvez por isso - e porque me parece que o actual autarca funchalense (que nunca ganhou nenhuma eleição porque nunca encabeçou nenhuma candidatura, tal como Pedro Calado, há que lembrá-lo…) terá acabado com as veleidades de eventuais candidatos a candidatos socialistas - a decisão de Gouveia de não se filiar no PS-M e de repetir a decisão de Cafofo e se candidatar no Funchal como “independente”, mas identificado com do PS-M percebe-se, mesmo que seja uma jogada política inteligente.


A opção de Miguel Gouveia, que não demorou muito a ser apoiada por Cafofo, assentou, em meu entender, na decisão de ser facilitado o processo de uma  coligação autárquica mais alargada - depois do sucesso das apostas de 2013 e 2017 - capaz de derrotar a coligação PSD-CDS e a provável candidatura de Pedro Calado que politicamente é uma candidatura forte, de alguém que esteve anos na CMF e que mesmo sem ter a garantia de vitória eleitoral -  porque as eleições dependem muitas vezes de factores complicados que são colocados na agenda eleitoral e que acabam por beneficiar ou prejudicar candidatos e partidos - não deixa de obrigar o PS-M e Miguel Gouveia a gerirem de forma diferente este processo.

E como vai MG gerir?

Penso que o actual autarca do Funchal vai querer escolher a sua equipa, pelo menos os primeiros lugares da lista de candidatos a vereadores que serão os operacionais da sua equipa em caso de vitória - aliás lembramo-nos da forma como ele conseguiu trazer para a sua equipa um candidato da sua confiança pessoal, que ocupava um dos lugares mais secundários da candidatura da coligação no Funchal (2017) e que graças a várias renúncias de quem o antecedia na lista, chegou  a vereador - e que vai resistir a pressões políticas que obviamente serão tentadas por sectores da nomenclatura dirigente dos socialistas que porventura não querem dar carta branca ao edil mas recusam qualquer conflito com Miguel Gouveia.

Além disso sei que a candidatura de Calado à CMF - repito, uma candidatura muito forte, mas longe de ser ganhadora antecipada, mesmo num quadro de coligação PSD-M-CDS-M - pode mudar muita coisa no cenário de coligações eleitorais à esquerda.

Com o PCP de fora - os comunistas desconfiam dos socialistas e têm como referência as recentes e repetidas derrotas eleitorais mais recentres com a consequente perda de votos nos últimos anos e no plano nacional, essencialmente por terem sido "engolidos" pelo PS de Costa - não me repugna nada admitir que vários partidos, incluindo JPP e Bloco, se juntem na coligação liderada por Miguel Gouveia, tudo isto para impedir uma vitória de Calado e da coligação PSD-CDS, desfecho que caso os partidos à esquerda concorram isolados poderá ficar mais facilitada pela aplicação do método de Hondt.

Penso que Bloco e JPP (e o PAN?) estariam dispostos a "esquecer" os prejuízos eleitorais causados pelo PS-M nas regionais de 2015. Acho que Miguel Gouveia percebe que o PS-M sozinho dificilmente terá a certeza de vitória no Funchal, mesmo considerando a realidade eleitoral mais recente na capital, e que contraria a fragilidade eleitoral vigente até 2013. 

Aproveito para recordar alguns dados eleitorais no Funchal e importantes neste contexto:

Evolução recente dos votos do PSD no Funchal

2011, regionais, 26.706 votos, 42,9% (abstenção de 41,6%)

2013, autárquicas, 17.450, 32,4% (49,5%)

2015, regionais, 22.545, 42,5% (50%)

2017, autárquicas, 17.971, 32,1% (41,2%)

2019, regionais, 22.408, 37,1% (43,5%)

2019, legislativas, 19.097 votos, 34,9% (abstenção de 48,8%)

Evolução recente dos votos do PS no Funchal

2011, regionais, 7.378 votos, 11,9% (abstenção de 41,6%)

2013, autárquicas, 21.102 (coligação alargada), 39,2% (49,5%)

2015, regionais, 6.894 (coligação), 13% (50%)

2017, autárquicas, 23.577 (coligação), 42,1% (41,2%)

2019, regionais, 23.561, 39% (43,5%)

2019, legislativas, 19.716 votos, 36% (abstenção de 48,8%)

Evolução recente dos votos do CDS no Funchal

2011, regionais, 12.110, 19,5% (abstenção de 41,6%)

2013, autárquicas, 7.828, 14,6% (49,5%)

2015, regionais, 6.958, 13,1% (50%)

2017, autárquicas, 4,819, 8,6% (41,2%)

2019, regionais, 3.466, 5,7% (43,5%)

2019, legislativas, 3.080 votos, 5,6% (abstenção de 48,8%)

Os perigos de sondagens estranhas

Parece-me altamente perigoso que os partidos tomem decisões e façam escolhas em função de sondagens que não têm nada a ver com a realidade, que a distorcem e que confundem tudo e todos. E mantenho o que escrevi, chamando a atenção para os riscos do excessivo empolamento dado aos resultados destas consultas,    quando a sua representatividade efectiva - em ficha técnica - é questionável.

Vamos a factos.


A sondagem do JM, mesmo assim, é a única que utilizo, embora tenha muitas dúvidas sobre a fiabilidade da mesma. A do Económico nem tomo como referência. Em primeiro lugar falham as duas por que inventam candidatos que nunca disseram que serão candidatos o que desde logo torna absurdas as sondagens realizadas. E distorcendo a antevisão de resultados. Em segundo lugar parecem sondagens feitas para ter um determinado desfecho, o que é estranho. Mas são conclusões minhas.

Quanto à do JM chamo ainda a atenção para o seguinte aspecto que é demasiado importante para que os políticos e os partidos dominem as suas emoções e não percam o controlo dos processos de decisão:

- na sondagem do JM, Calado tem apenas 49,1% contra 37,9% de Miguel Silva. A estes juntam-se os demais 10,9% de votos noutros "candidatos"

- a sondagem do JM tem um universo de 406 entrevistados com um grau de resposta de 62,7% (ou seja apenas 255 respostas, conforme a ficha técnica)

Ainda assim os resultados apontam para uma margem, de erro de cerca de 5%! O recenseamento eleitoral usado foi o de 2018 quando em 2019 já tivemos duas eleições e um, recenseamento eleitoral actualizado em 2021. Estranho!

Depois, repito, a sondagem usa como candidatos, personagens ligadas a vários partidos que nunca anunciaram que serão candidatos a coisa nenhuma - aliás muitos deles até serão parceiros de uma coligação liderada por Miguel Silva e não concorrentes - o que não me parece honesto nem sério.

E as equipas de candidatos incluindo nas freguesias onde se perspectivam várias mudanças?

Tenho para mim que para além dos líderes das candidaturas autárquicas, as equipas são igualmente importantes aos olhos das pessoas, não apenas por causa dos candidatos a vereadores, mas de quem são os candidatos à presidência das juntas de freguesia, no fundo aqueles que estão mais perto das pessoas na sua relação com o poder instituído.

Como sabemos, é cada vez mais generalizado e normal uma mudança do sentido de voto das pessoas que diferenciam as candidaturas. Lembro, neste contexto, que em 2017 o PSD-M obteve no Funchal a sua melhor votação nas Assembleias de Freguesia, cujos resultados dariam para conquistar a CMF.

Eu recordo:

Câmara Municipal

PSD - 17.971 votos, 32,1%

PS (coligação) - 23,577, 42,1%

Assembleia Municipal

PSD - 17.903 votos, 31,9%

PS (coligação) - 21.693, 38,7%

Assembleias de Freguesia

PSD - 21.093 votos, 37,5%

PS (coligação) - 20.428, 36,3%

Por isso, apesar de alguma desvalorização erradamente feita pelos partidos desta questão é muito importante que isso marque presença no processo de decisão e de escolhas de pessoas, até por que várias mudanças vão-se operar também nas lideranças das Juntas de Freguesias do Funchal (e não só) por imposição da limitação de mandatos.

E o Chega? Que estragos pode causar à coligação PSD-CDS no Funchal?

Como sempre, em toda a análise que se faz, sobretudo política, há os dois lados da moeda. O problema é que sendo isso natural, deixa de o ser quando se valoriza apenas um desses lados e se esquece o outro, regra geral por implicar mais incómodos, desafios, incertezas e mais dúvidas.

No caso da corrida à CMF, e no que ao PSD-M e CDS-M diz respeito, os dois partidos estão-se a "esquecer" do potencial impacto que o Chega, caso concorra à edilidade da capital - algo que eu acho que está obrigado, pelo que seria desastroso não o fazer, dado que isso revelaria uma fragilidade ou até mesmo um potencial medo de se apresentar ao eleitorado - terá nas contabilidades de social-democratas e centristas.

Mais por culpa do PSD-M, que tem adoptado em relação ao Chega uma atitude errada de promoção do partido de Ventura e de se mostrar algo submisso e até subserviente pensando mais em futuros potenciais cenários políticos e eleitorais regionais, ainda no imaginário, em detrimento da realidade mais imediata. Falo em grande medida da pressão das sondagens, dos resultados das presidenciais e pelo que aconteceu nos Açores - apesar dos constantes sinais de incerteza e de instabilidade, como esta semana ocorreu, que o Chega empresta à governação regional açoriana, completamente refém de um partido pequeno e sem grande dimensão eleitoral (onde é que há vi isto...) mas que, como o povo diz, nasceu com o "traseiro virado para a lua" graças aos mandatos obtidos pela aplicação do método de Hondt.

Eu recordo os resultados nas regionais dos Açores, só por curiosidade:

Abstenção - 54,6%

PSD - 35.094 votos, 35,1%, 21 deputados

PS - 40.703 votos, 40,7%, 25 deputados

CDS - 5.739, 5,7%%, 3 deputados

Chega - 5.262, 5,3%, 2 deputados

Bloco - 3.962, 4%, 2 deputados

Iniciativa Liberal - 2.012, 2% e 1 deputado

PCP - 1.741, 1,7%, 0 mandatos

PAN - 2.005, 2% e 1 deputado

PPM - 2.415, 2,4 e 1 deputado

PPM-CDS, 115 votos, 0,1%, 1 deputado (Corvo)

Ora nestas autárquicas, e no que ao Funchal diz respeito - porque é na capital que se prevê o grande confronto entre os dois blocos liderados por PSD-M e PSD-M - tudo o resto é eleitoralmente menos importante, na óptica errada dos partidos em causa, porque esquecem que no caso da RAM o universo de eleitores inscritos, dados das presidenciais de 2021, é de 258.045 pessoas, enquanto que o Funchal representa apenas 106.611 eleitores inscritos, ou seja 41,3% do total! - subsiste a dúvida sobre o que poderá fazer o Chega, que estragos pode este partido causar no PSD-M e no CDS-M, dado que o seu eleitorado é claramente obtido na abstenção e na mudança do sentido de voto de eleitores dos dois partidos que se declaram desiludidos e querem protestar e dar sinais dessa desilusão.

Neste quadro, o que vale o Chega no Funchal?

Os 911 votos, 0,70% das legislativas de 2019, ou os 266 votos, 0,4% das regionais de 2019 ou os 4.607 votos e 10,1% das presidenciais e de Ventura? Fica essa dúvida...

Disputa mediática

Finalmente já todos percebemos que está em curso uma disputa mediática entre Pedro Calado e Miguel Gouveia, uma dependência quase total da presença diária nos meios de comunicação, particularmente na imprensa, como forma de cativação da atenção dos eleitores e preparação da disputa eleitoral. Duvido que seja por essa via que qualquer um deles consiga seja o que for em termos eleitorais. Pelo que sei ambos os candidatos, depois da sua confirmação das candidaturas terão ao dispor experimentadas equipas de comunicação política e imagem, confirmando as características dos actos eleitorais nos dias que correm, e quando é sabido que a campanha eleitoral será despida de afectos, de contactos porta-a-porta e de outras características que sempre fizeram parte das nossas campanhas eleitorais.

No caso de Calado, esse protagonismo alterna com a presença em actos públicos em áreas que nem são tutelas pela VP do GRM - ele vai visitar um pavilhão desportivo em construção numa escola do Funchal, vai a uma entrega pelo SRPC de uma ambulância aos bombeiros em Santana, ele reúne com um ministro e anuncia que consegue mais uns milhões para as empresas da RAM apesar de Lisboa ter dado uma nega à pretendida antecipação de fundos europeus, etc. Para Gouveia tudo é notícia no quadro da CMF, tudo é pretexto para aparecer na comunicação social.

Outra minha dúvida resulta do facto de não saber o que fará Pedro Calado, caso seja obrigado a abandonar o GRM - quando a sua candidatura for anunciada - para garantir a continuidade desse protagonismo mediático que agora tem. Se o fará imediatamente assumindo o lugar de deputado na ALRAM onde poderá ter visibilidade política quando passar a ser o alvo preferencial da oposição (e há entre os social-democratas quem tenha algum receio disso, sobretudo por não saberem que tipo de discurso os socialistas utilizarão, mormente a ala mais radical encabeçada por Iglésias, e do potencial desgaste que daí possa resultar junto do eleitorado), ou se cometerá o mesmo erro de Rubina Leal que em 2017 demorou tempo demais a abandonar o GRM desvalorizando a campanha e a sua presença no terreno (algo que Calado este ano não poderá fazer com a mesma facilidade) já ocupado então por Cafofo que percorreu a "sua" cidade enquanto autarca promovendo as medidas adoptadas e as obras feitas. Esse erro político de Rubina e do PSD-M acabou por acelerar a derrota e a manteve praticamente a mesma votação (insuficiente) de 2013 em circunstâncias muito especiais que não vou agora recordar.

Remodelação? Finanças com autonomia

Com a saída de Pedro Calado, prevejo que seja efectuada uma remodelação do GRM - que pode nem se limitar apenas à Vice-Presidência que admito possa deixar de existir. Assim como me parece que, em caso de remodelação do GRM, a pasta das finanças devia ser totalmente autonomizada do resto, ou seja, o GRM deveria ter, com a saída de Pedro Calado, um secretário regional das finanças, apenas com a tutela nessa pasta, porque os próximos anos serão demasiado complicados e difíceis no domínio orçamental e financeiro, com a previsão de imensas dificuldades face ao aumento das necessidades financeiras que a RAM e o GRM vão sentir devido ao impacto da crise.

Ou seja, parece-me mais do que evidente que, com a saída de Calado do GRM - algo que poderá suceder logo que for anunciada a sua candidatura, já que não faz sentido que acumule as funções governativas com as de candidato autárquico até pelas razões que referirei noutra passagem deste texto – deixará de existir o cargo de Vice-Presidente que não existia no primeiro GRM liderado por Albuquerque mas que foi criado propositadamente para Pedro Calado, quando foi confirmada a sua integração no executivo de onde parece que agora quer sair (LFM)

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