sábado, novembro 11, 2023

Trabalhadores com ensino superior duplicam desde 2009

É uma fasquia que não era atingida em Portugal há 14 anos. No terceiro trimestre de 2023, o número de pessoas a trabalhar no país superou cinco milhões pela primeira vez desde o primeiro trimestre de 2009. O número exato de pessoas agora empregadas em Portugal foi de 5,02 milhões, precisamente o mesmo registado na altura. Contudo, a composição do emprego no país mudou muito, com uma reconfiguração das qualificações. O número de trabalhadores com ensino secundário mais do que duplicou e o mesmo aconteceu com o número de profissionais com formação superior. Em sentido contrário, o número de empregados com formação no máximo até ao ensino básico (9º ano de escolaridade) caiu para cerca de metade.

O arranque de 2009 marca precisamente o início de um período conturbado da economia nacional, marcada por crises sucessivas. Primeiro, a grande recessão mundial que sucedeu à crise financeira de 2008. Depois, a crise das dívidas na zona euro, com Portugal a ter de pedir ajuda internacional. A história é conhecida. A economia portuguesa afundou, arrastando o mercado de trabalho. No primeiro trimestre de 2013 a taxa de desemprego atingiu o seu pico, 18,5%. Ou seja, quase 10 pontos percentuais acima do registado quatro anos antes, no início de 2009. De então para cá verificou-se uma descida marcada na taxa de desemprego, que apenas a pandemia interrompeu. E, apesar da degradação da conjuntura económica ao longo de 2023, a taxa de desemprego ficou em 6,1% no terceiro trimestre, inalterada face aos três meses ante­riores e apenas 0,1 pontos percentuais acima do terceiro trimestre do ano passado.

Quanto ao emprego, caiu sucessivamente desde 2009, chegando ao mínimo de 4,09 milhões no primeiro trimestre de 2013. Ou seja, perderam-se 930 mil empregos no espaço de quatro anos. São precisamente esses 930 mil empregos que demoraram 10 anos a recuperar até aos 5,02 milhões contabilizados no terceiro trimestre deste ano.

Mas quando se analisam os dados do INE, verifica-se que, apesar de termos 5,02 milhões de empregos, como em 2009, há poucas semelhanças entre esses empregos, tendo-se verificado alterações estruturais no mercado de trabalho. A primeira delas passa pelas qualificações dos trabalhadores. No início de 2009, 68% da população empregada no país tinha, na melhor das hipóteses, o ensino básico, ou seja, até ao 9º ano de escolaridade. Eram 3,43 milhões. Catorze anos depois, no terceiro trimestre de 2023, o número de colaboradores com baixas qualificações tinha caído para cerca de metade, ficando pelos 1,77 milhões. E o seu peso no emprego total recuou para 35%.

Número de trabalhadores com o ensino básico no país caiu para metade entre 2009 e 2023

Em sentido inverso, verificou-se um forte aumento dos trabalhadores mais qualificados e também dos que detinham qualificações intermédias (ensino secundário e pós-secundário). Em ambos os casos o seu número mais do que duplicou. No terceiro trimestre estavam empregados em Portugal 1,62 milhões de pessoas com formação superior e outros 1,62 milhões com qualificações ao nível do ensino secundário. O peso do ensino superior no emprego total passou de 16% em 2009 para 32% em 2023. E o mesmo aconteceu com o peso do ensino secundário e pós-secundário no emprego total.

SAÚDE LIDERA AUMENTO DO EMPREGO

A análise dos dados do INE por sectores de atividade confirma esta reconfiguração do emprego no país. Os sectores onde o número de postos de trabalho mais aumentou entre 2009 e 2023 têm forte incidência de competências de nível superior.

O Expresso comparou o emprego nas várias atividades económicas no país no terceiro trimestre de 2009 — e não no primeiro trimestre desse ano, para eliminar o efeito da sazonalidade que podia distorcer os dados — e no trimestre homólogo de 2023. Da análise resulta que as atividades de saúde humana e apoio social registaram o maior aumento de postos de trabalho — são mais 174,8 mil. O peso do sector no emprego em Portugal subiu de 7% para 10%. Uma trajetória a que a pandemia de covid-19 que assolou o país não é estranha. O número de profissionais de saúde foi reforçado, nomeadamente no Serviço Nacional de Saúde (SNS).

Seguem-se as atividades de consultoria, científicas, técnicas e similares, com as de comunicação e informação logo atrás. O incremento foi de 101,5 mil empregos e de 90,5 mil postos de trabalho, respetivamente. Em ambos os casos trata-se de sectores que empregam profissionais muito qualificados.

Em sentido inverso, o sector primário (agricultura, produção animal, caça, floresta e pesca) perdeu 425 mil trabalhadores entre 2009 e 2023, com o seu peso no emprego a baixar de 12% para apenas 3%. Segue-se na lista a construção, com menos 140,1 mil postos de trabalho. Neste caso, o peso do sector no emprego em Portugal passou de 10% para 7%. A terceira maior redução verificou no pessoal de serviço doméstico, com menos 51,1 mil empregos.

Também na precariedade laboral houve alterações. No terceiro trimestre deste ano, 17,5% dos trabalhadores por conta de outrem (TCO) tinham um contrato de trabalho precário (contratos com termo e outras situações). Em 2009, essa parcela rondava os 22%. Uma redução para a qual poderão ter contribuído as alterações ao Código do Trabalho de 2019 e de 2023, que introduziram maiores restrições ao recurso por parte das empresas empregadoras a este tipo de contratos de trabalho (Expresso, texto das jornalistas CÁTIA MATEUS e SÓNIA M. LOURENÇO)

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