sexta-feira, novembro 17, 2023

SIC-Notícias: Quem são os políticos na agenda de Ricardo Salgado?

Durante 10 meses, uma equipa da SIC investigou 2268 dias da agenda de Ricardo Salgado. Veja aqui o primeiro de quatro episódios desta Grande Reportagem. Que políticos convocou Ricardo Salgado para o seu gabinete, na sede do BES, em Lisboa, entre outubro de 2008 e dezembro de 2014? A que partidos pertenciam esses políticos? A que governos estavam ligados? Que pedidos lhes fez Ricardo Salgado? Que respostas obteve o banqueiro? A resposta é dada nos quatro episódios da grande reportagem "A Agenda". No primeiro, há duas figuras que sobressaem: Marcelo Rebelo de Sousa e José Manuel Durão Barroso. Nesta longa investigação, mergulhamos em 2268 dias do quotidiano do banqueiro, entre 2008 e 2014. Uma investigação jornalística que envolveu quatro jornalistas a tempo inteiro, percorreu diversas geografias e mergulhou no detalhe de mais de três mil ficheiros. O advogado de Ricardo Salgado recusou dar-nos uma entrevista para esta investigação (SIC Noticias, texto do jornalista Pedro Coelho)

Na agenda de Ricardo Salgado há 957 referências a políticos e ninguém é tão mencionado quanto Durão Barroso

Existem 48 anotações, telefonemas ou marcações de encontros com o antigo primeiro-ministro do PSD, que abandonou o cargo em 2004 quando decidiu ir para Bruxelas. Há também uma presença relevante de José Sócrates, com 32 menções, bem como dos ex-ministros das Finanças Teixeira dos Santos, (26) e Vítor Gaspar (27). Um total de 156 políticos, entre 112 figuras nacionais e 44 personalidades estrangeiras, foram identificados na agenda de Ricardo Salgado numa investigação do Expresso, da SIC e do jornal digital Setenta e Quatro. Esses políticos foram referidos 957 vezes ao longo de cinco anos pelo banqueiro que presidiu ao Banco Espírito Santo (BES) e liderou o Grupo Espírito Santo (GES) entre a década de 1990 e 2014. O nome mais mencionado pelo banqueiro é José Manuel Durão Barroso, presidente da Comissão Europeia até ao ano do colapso do BES.

Existem 48 anotações, telefonemas ou marcações de encontros com o antigo primeiro-ministro do PSD, que abandonou o cargo em 2004 quando decidiu ir para Bruxelas. Há também uma presença relevante de José Sócrates, com 32 menções, bem como dos ex-ministros das Finanças Teixeira dos Santos, (26) e Vítor Gaspar (27). Apesar de ter admitido apenas um encontro com Salgado quando foi ouvido na comissão de inquérito parlamentar sobre o BES, o ex-vice-primeiro-ministro Paulo Portas está igualmente entre os mais mencionados (27). Confrontado com a agenda, Portas assegura que não reuniram nas últimas três vezes em que o seu nome foi anotado, em junho e julho de 2014.

O antigo primeiro-ministro Pedro Passos Coelho aparece menos (16) do que Sócrates, ainda assim uma vez a mais do que Cavaco Silva (15) e duas vezes a mais do que Mário Soares (14). A agenda é constituída não por um volume único, mas por um conjunto de blocos anuais onde Ricardo Salgado organizava a sua vida diária, e compreende um período decisivo e dramático na sua carreira de banqueiro, começando a 2 de outubro de 2008 e terminando a 19 de dezembro de 2014, seis meses depois do colapso do BES e do GES.

De acordo com uma análise às anotações de Salgado, há uma lista grande de políticos que eram membros ou ex-membros do governo à data dos factos, num total de 72 nomes. Nessa soma surgem 124 referências a primeiro-ministros de Portugal (em funções e também os que haviam exercido o cargo no passado), 102 a ministros das Finanças, 42 a ministros dos Negócios Estrangeiros e 39 a presidentes. O PSD é o partido mais representado, com 314 referências a sociais-democratas, seguido do PS, com 276, e do CDS-PP, com 45.

NENHUMA “DILIGÊNCIA IMPRÓPRIA”

Numa resposta por escrito, Durão Barroso desvaloriza o número de vezes que aparece citado por Salgado. “Haverá que retirar todas as que correspondem a reuniões coletivas que eu tinha com uma associação onde ele, ou o grupo a que ele presidia, era apenas um entre muitos outros participantes.”

Na realidade, só seis dessas 48 ocasiões dizem respeito a encontros em que estavam outras pessoas presentes. Eram, de resto, comuns as marcações de jantares e reuniões com JMDB, como Durão Barroso costumava ser tratado na agenda. Os encontros aconteciam não só em Portugal, mas também em Bruxelas. Algumas dos registos são sugestivos. A 14 de dezembro de 2009, por exemplo, no mesmo dia em que agendou um almoço com o então primeiro-ministro José Sócrates e um jantar com o ministro dos Negócios Estrangeiros Luís Amado, Salgado escreveu: “Preparar JMDB”.

O ex-número 1 da Comissão Europeia e atual presidente do conselho executivo internacional do banco Goldman Sachs garante que Ricardo Salgado nunca usou a relação entre eles “para qualquer diligência imprópria, ilegítima ou eticamente censurável.

No entanto, em vários momentos Salgado parece ter querido a ajuda de Durão Barroso para situações aparentemente muito afastadas do âmbito da sua missão na Comissão Europeia. Em agosto de 2011, a propósito de um empréstimo de 220 milhões de euros que o BES tentava obter junto do Banco de Desenvolvimento da China, o CDB, e de questões levantadas por uma agência de rating chinesa, a Dagong, o banqueiro considerava a hipótese de fazer lóbi via Edmund Ho, ex-governador de Macau, de um agente do SIED (Serviço de Informações Estratégicas de Defesa) e de JMDB.

Mais tarde, a 22 de dezembro de 2013, o presidente do BES quis levá-lo a uma reunião no Banco de Portugal, depois de os responsáveis da supervisão bancária defenderem a perda da sua idoneidade, pela forma como não declarou rendimentos obtidos no estrangeiro (fê-lo mais tarde, quando aproveitou um regime extraordinário de regularização tributária). Nessa época, o regulador também já tinha descoberto que a Espírito Santo International (ESI), uma das holdings de topo do GES, ocultara nas suas contas um passivo de 1,3 mil milhões de euros.

O cenário era ainda mais dramático em abril de 2014, quando no dia 7 Salgado escreveu que planeava partilhar com JMDB uma carta para o então governador do Banco de Portugal, Carlos Costa. Essa referência volta a surgir no dia seguinte, embora tenha sido apagada — como, aliás, seriam apagadas muitas das anotações na agenda — e mais tarde recuperada pelo laboratório científico da PJ.

Durão Barroso nega que tenha se pronunciado sobre essa carta e diz que houve “uma única vez” em que Salgado “suscitou concretamente os problemas” do BES. “Nessa reunião, ouvi as preocupações do Dr. Ricardo Salgado e remeti-o para as autoridades portuguesas.”

Teixeira dos Santos, ministro das Finanças entre 2005 e 2011, não chegou a apanhar o banqueiro nessa fase e diz que as reuniões entre os dois aconteceram a pedido de Salgado. “Atendendo à crise que se vivia, eu entendia que teria de ouvir aquilo que os banqueiros me queriam dizer. Até porque muitas vezes eu tinha consciência que eles diziam uma coisa quando estavam em privado e outra quando estavam com outros participantes.” Mas todas essas conversas não foram suficiente para o salvar (Expresso, texto dos jornalistas Micael Pereira, Grande repórter, Pedro Coelho, Jornalista da Grande Reportagem SIC e Filipe Teles e Paulo Barriga)

Veja aqui o primeiro episódio desta reportagem da SIC-Notícias

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