domingo, fevereiro 07, 2021

Nota: o que eu penso (e o peso dos números) sobre a coligação PSD-CDS no Funchal


 Uma coligação necessária?

Já que falamos de uma coligação e sabendo-se que as coligações eleitorais são feitas não para gerir derrotas, mas para alcançar vitórias. Importa reforçar o princípio sagrado de que uma coligação implica um entendimento político prévio e que esse acordo deve estar acima de tudo o resto, independentemente de gostarmos ou não da solução encontrada, ou sequer termos qualquer empatia com o (s) parceiro (s) dessa coligação. Essas questões passam para um plano secundário se se provar - e isso prova-se com factos, não com visões antecipadas de uns tantos iluminados, o com repugnantes imposições totalitárias das lideranças de partidos - que a consubstanciação de uma coligação parte da garantia segura - relativamente, como é evidente - de que há uma mais-valia eleitoral imediata daí resultante.

Para isso é preciso haver um estudo político prévio, de bastidores, no terreno feito de forma séria e isenta, que comprove que essa aposta da coligação constitui uma mais-valia aglutinadora dos votos do eleitorado dos partidos participantes na coligação e não um elemento de dispersão e de desmobilização desse eleitorado, um dos riscos mais ameaçadores para qualquer coligação.

Fazer uma coligação para satisfazer exigências, pressões, ameaças de bastidores, transformando a política num mero negócio do deve-e-haver caganças de protagonistas políticos, apenas para disfarçar fragilidades, tornear derrotas humilhantes em perpectiva (se concorrerem isoladamente...) gerir uma derrota e não para apontar em direcção a uma vitória, isso seria uma palhaçada insultuosa para o eleitorado de cada freguesia ou concelho. E quando assim é, normalmente ajustam-se contas nas urnas...

A hecatombe de 2013

O PSD-M já passou por isso, não por uma coligação autárquica (exceptuando o que se passou em 2017 em São Vicente e Ribeira Brava, concelhos onde nem concorreu!), mas por decisões tomadas por iluminados que depois as impuseram aos demais companheiros das estruturas de freguesia ou de concelho. A derrota normalmente começa ai, quando o processo de decisão é esse, imposto de cima para baixa e se banalizam e desvalorizam as reuniões com as bases dos partidos, nas quais por vezes ouvir o que elas têm para dizer se transforma numa "chatice".

Em tempo de vacas gordas, como aconteceu durante anos, é fácil. Mas em tempos de crise - e sabe-se lá o que virá ainda até as eleições de Setembro deste ano - tudo se complica.

Alguém dúvida que o desastre eleitoral autárquico do PSD-M, gostem ou não que se diga (e não vou discutir agora factores de natureza diversa que também influenciaram negativamente o desfecho eleitoral dos social-democratas em 2013, incluindo divisões internas, desmobilização organizada e promovida, deliberados boicotes das campanhas eleitorais programadas e que nem das sedes saíram, escolhas erradas contra o sentir das populações, apesar dos alertas dados, influência desmedida, despropositada e nalguns casos nojenta (porque falsa e manipuladora) de alguns  dos chamados "notáveis" da coutada, uns insignificantes promovidos a "ouvidores do reino" lá na freguesia ou concelho mas que não representavam coisa nenhuma, alguns nem lá residiam mais, etc) começou nas eleições de 2013, influenciadas também por factores políticos ocorridos nos dois anos anteriores (falo do PAEF e do agravamento das condições de vida que daí resultou), mas influenciados sobretudo por outras realidades determinantes.

Das principais Câmaras Municipais da RAM o PSD apenas manteve Câmara de Lobos, graças a uma fidelidade eleitoral da esmagadora população local que nem sempre foi bem tratada por quem de direito, que nem sempre foi apoiada da forma que devia ter sido, porque política é também isso, gostem ou não que se diga (e conversas hipócritas comigo não funcionam): apoiar todos sim e sempre, mas apoiar de uma forma mais concreta, sem colocar em causa dos outros, aqueles que mais confiaram em nós quando foram chamados a pronunciar-se.

A minha maior dúvida

A minha primeira dúvida é saber, e não sei, nem tenho sequer essa certeza, se PSD-M e CDS-M, que se encontram na oposição em 00 das 10 freguesias do Funchal, sentem o pulsar das populações das freguesias da capital, onde não são poder, se estão presentes no terreno da forma e modo como seria recomendável a quem quer reconquistar eleitores perdidos, se fazem uma leitura isenta e pragmática da realidade social e política em cada freguesia, se procederam ao levantamento - uma espécie de análise-swot - da realidade das freguesias, das necessidades mais prementes, dos problemas dos jovens, do impacto do desemprego e do consequente peso do apoios sociais, do estado em que se encontram as pequenas empresas existentes em cada freguesia, enfim, o levantamento sério das potencialidades e ameaças, dos pontos mais fortes e das fraquezas, etc. Sem isso esqueçam, não há solução política que resulte e resista porque fica sempre a ideia de que há uns "paraquedistas" que passam 4 anos a vaguear pela zona e que, de repente, só porque se lembraram que se aproximam eleições, querem ser mais vistos na freguesia (não marcaram posições no terreno nem ganharam visibilidade pessoal e política ao longo de todo o tempo que dispuseram para o fazer), tentando a visibilidade que ajuda os propósitos eleitorais, até porque as freguesias nunca ganharam, contrário das Câmaras Municipais - e nem todas! - grande protagonismo no espaço mediático disponível.

E se temos presentes - e por isso elaborei estes quadros comparativos até para facilitar a percepção do tema - os resultados eleitorais das autárquicas de 2013 e 2017, convém recordar, no caso do Funchal - que virou perigosa e patética obsessão para alguns, como se isso resolvesse os problemas da governação regional e ajudasse a superar os desafios que tempos pela frente - que os resultados das legislativas e regionais de 2019, mesmo tratando-se de eleições diferentes, são uma referência que não pode ser escamoteada porque ajuda a perceber fragilidades e potencialidades.

O peso pessoal

É voz corrente que as eleições autárquicas são as eleições mais pessoalizadas de todas, porque mais do que a fidelidade do voto partidário, há uma outra componente - o voto na pessoa que mais convence a nossa confiança - que pode influenciar os resultados, a escolha dos candidatos. Quando esses dois itens se confundem, os partidos pouco ou nada ganham com isso. No fundo, o que um partido precisa, mais do que manter o seu eleitorado tradicional e que vota por habituação, por escolha ou por fidelização simbólica, é poder e saber penetrar nos chamados indecisos ou abstencionistas - o eleitorado, a maior faixa dele, que sem compromissos vagueia de eleição para eleição alterando o seu voto em função de premissas ou factores exógenos (aos partidos) um dos quais tem a ver com as pessoas escolhidas para liderarem uma candidatura e com a confiança que transmitem e  garantia de competência e entrega que os acompanha.

Os autarcas são os "porteiros"...

Não há "jokers" milagrosos neste processo eleitoral, sobretudo neste. Os autarcas, nas freguesias e nos concelhos, são uma espécie dos "porteiros" que abrem a porta de entrada dos cidadãos na governação, são eles que recebem os eleitores, que estão mais perto deles, que os encaminham, que os ouvem, que resolvem ou tentam resolver os problemas, que pedem ajuda e apoios quando necessários, que constroem pontes com os patamares superiores da governação, que estabelecem essas ligações de confiança entre as instituições e as pessoas.

Por isso, durante anos, era voz corrente afirmar-se que ninguém devia chegar aos patamares mais elevados da política e do exercício da governação, sem antes sentir o pulso da pressão e da responsabilidade ao nível autárquico. Hoje isso perdeu sentido, porque a política aos poucos perdeu a sua essência, as suas ideologias devidamente demarcada umas das outras, para se transformar antes numa arena de oportunismos e de oportunistas cinzentões e sem ideologia, que hoje tanto vendem um sabonete como amanhã tentam fazer passar um quilo de barro como se de ouro se tratasse.

Até a fidelidade militante nos partidos hoje deixou de obedecer a uma lógica que predominou durante anos, mesmo que existissem no passado situações em que essa regra foi espezinhada. São os partidos que fomentam e incentivam o oportunismo militante, que desvalorizam a militância, que quase atiram para o lixo a coerência ideológica que vincula uma pessoa a um partido - ou que devia vincular.

No futebol os clubes não se compadecem com cinzentões, porque quem gosta de futebol tem uma escolha feita. Na política fomenta-se a pretensa influência dos "independentes", institucionaliza-se o cinzentismo idiota, desvalorizando a coerência e empurrando até os militantes para fora, a se afastarem porque há quem queira partidos políticos, não os clubes de futebol, transformados em mantas de retalhos ou, se preferirem, em "albergues espanhóis". A Madeira não escapou a isso, infelizmente. Hoje a militância de uma maneira geral, e apesar das habilidades para disfarçar fragilidades, é um dos calcanhares de Aquiles da política e dos partidos, distanciando-os das pessoas, que deviam fomentar as escolhas, reintroduzir a diferenciação ideológica na política. etc. Um tema actual, pertinente, mas para outas análises.

Se olharmos às regionais e legislativas de 2019 - a últimas eleições realizadas na RAM com partidos, depois das autárquicas de 2017, consta-se o seguinte, tomando como referência o Funchal:

- nas regionais de 2019, o PS foi o mais votado no Funchal com 39% contra 37,1% do PSD e 5,7% do CDS. O PS foi o mais votado em 6 das 10 freguesias da capital contra 4 freguesias para o PSD - Santa Luzia, Sé, São Roque e Monte;

- nas legislativas de 2019, o PS voltou a ser o mais votado no Funchal com 36% contra 34,9% do PSD e 5,6% do CDS. O PS foi o mais votado em 5 freguesias da cidade, contra 5 ganhas pelo PSD - São Martinho, Monte, Sé, Santa Luzia e São Roque.

Ou seja, percebendo eu certos estados de alma e sentimentos, sobretudo da chamada "velha guarda" do PSD-M, a verdade é que a política é hoje, e cada vez mais, infelizmente, um negócio que tem a ver com o poder. E os negócios obedecem a uma lógica de mais-valias, a um evidente pragmatismo, para que não fracassem. O que é preciso é que as diferentes estruturas partidárias do PSD-M e do CDS-M, sem generalizarem coligações - sou frontalmente contra essa imposição generalizada e inclusivamente não me repugna uma revolta eleitoral em resposta a essa lógica totalitária nos tempos que correm em que as bases precisam de ter mais voz e mais capacidade de decisão, mas também o dever de assumirem responsabilidades caso falhem e sejam derrotadas - pergunto:

- as bases do PSD e do CDS regionais, considerando todos estes números, acham que, concorrendo separadas - mesmo que devam ser considerados factores novos do lado do PS, a começar pelo facto de não existir ainda uma perspectiva de coligação, embora seja previsível (apenas o Bloco e uns tantos partidos pequenotes sem expressão, deverão alinhar nessa coligação, porque os bloquistas são os únicos que precisam de um guarda-chuva porque eles têm um enorme pavor de concorrerem sozinhos e voltarem a ser derrotados como aconteceu em 2019) e de Miguel Silva concorrer pela primeira vez a eleições (apenas fez parte das duas listas lideradas por Cafofo no Funchal), mas sobre isso um dia destes escreverei mais desenvolvidamente  - estão convictas que isoladamente conseguem os mandatos que lhes deem a maioria na edilidade funchalense? Francamente, muito francamente - nem com "jokers" que alguns andam a inventar - não acredito. Porque há ainda alguns anticorpos do pós-regionais de 2019 que podem influenciar o desfecho eleitoral, caso uma parte significativa do eleitorado pretenda deixar um aviso penalizador, essencialmente ao PSD-M, cujo peso autárquico nem se compara, nunca se comparou ao do CDS-M. Basta ver os quadros globais para percebermos que mesmo que a coligação não garanta nada, dificilmente ela deixará de ser a solução política nesta altura. Mas certo de que as autárquicas de 2021 no caso da Madeira não se resumem ao Funchal nem esta cidade contribui em nada para o sucesso ou fracasso da governação regional. Cada realidade no seu recanto (LFM)


Legenda: estes quadros mostram por freguesia, as votações, em 2013 e 2017, para a Câmara Municipal, abstenção e votação e percentagem, dos partidos utilizados para este meu estudo, PSD, CDS e PS (em coligação nos dois casos). A primeira constatação, usando os valores oficiais (MAI) das duas eleições, é a de que enquanto em 2013 o somatório dos votos PSD e CDS nunca seria ultrapassado - repito, na votação para a Câmara Municipal - pelos votos da coligação (que individualmente foi a mais votada, para a CM, em 8 das 120 freguesias da capital), já em 2017 o somatório dos votos PSD e CDS apenas não seria superado pelos votos da coligação em 4 das 10 freguesias da capital. Contudo lembro que a coligação, na eleição da Câmara Municipal, foi a mais votada em 6 das 10 freguesias. Um cenário que muda - como podemos ver noutras imagens - para as Juntas de Freguesia. Acho que as estruturas social-democratas, sobretudo estas, deviam olhar com atenção para esta realidade matemática e perceberem se acham, colocando vaidades pessoais, egos ou interesses de grupo, que, 4 anos depois, a situação mudou para o PSD-M e CDS-M, em que dimensão, onde, em que sentido e com que amplitude eleitoral.


Legenda: este quadro compara os resultados do PSD, CDS e do PS (coligado ou sozinho) nas autárquicas de 2013 e 2017 e ainda nas regionais e legislativas de 2019. Lendo estes quadros constata-se que o PS-M foi o mais votado no Funchal nas eleições seleccionadas para este estudo comparativo, com a particularidade de nas regionais e nas legislativas de 2019 conseguir "roubar" votos aos seus parceiros das coligações autárquicas de 2013 e 2019 que acabaram fortemente penalizados, com destaque para o Bloco de Esquerda e a JPP nas regionais de 2019.


Legenda: este quadro mostra os totais do PSD, PS (coligação) e CDS nos três órgãos municipais, nas eleições autárquicas de 2013 e 2017, possibilitando assim uma comparação, caso queiram fazer, da evolução eleitoral de cada partido num espaço de 4 anos. Estes quadros mostram que nas autárquicas de 2017 o PSD obteve o melhor resultado na votação para as Juntas de Freguesia, tendo mesmo obtido mais votos que o PS (coligação). Mostra ainda que o pior resultado do PSD-M no Funchal, nas autárquicas de 2017, foi para a Assembleia Municipal mas a uma escassa diferença do total para a Câmara Municipal.


Legenda: estes quadros mostram a comparação entre os votos do PSD-M obtidos em 2017 nas votações para a Câmara Municipal e para as Assembleias de Freguesia (Juntas de Freguesia).

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