Uma coligação necessária?
Já que falamos de uma coligação e
sabendo-se que as coligações eleitorais são feitas não para gerir derrotas, mas
para alcançar vitórias. Importa reforçar o princípio sagrado de que uma
coligação implica um entendimento político prévio e que esse acordo deve estar
acima de tudo o resto, independentemente de gostarmos ou não da solução
encontrada, ou sequer termos qualquer empatia com o (s) parceiro (s) dessa
coligação. Essas questões passam para um plano secundário se se provar - e isso
prova-se com factos, não com visões antecipadas de uns tantos iluminados, o com
repugnantes imposições totalitárias das lideranças de partidos - que a
consubstanciação de uma coligação parte da garantia segura - relativamente,
como é evidente - de que há uma mais-valia eleitoral imediata daí resultante.
Para isso é preciso haver um estudo
político prévio, de bastidores, no terreno feito de forma séria e isenta, que
comprove que essa aposta da coligação constitui uma mais-valia aglutinadora dos
votos do eleitorado dos partidos participantes na coligação e não um elemento
de dispersão e de desmobilização desse eleitorado, um dos riscos mais
ameaçadores para qualquer coligação.
Fazer uma coligação para satisfazer
exigências, pressões, ameaças de bastidores, transformando a política num mero
negócio do deve-e-haver caganças de protagonistas políticos, apenas para
disfarçar fragilidades, tornear derrotas humilhantes em perpectiva (se
concorrerem isoladamente...) gerir uma derrota e não para apontar em direcção a
uma vitória, isso seria uma palhaçada insultuosa para o eleitorado de cada
freguesia ou concelho. E quando assim é, normalmente ajustam-se contas nas
urnas...
A hecatombe de 2013
O PSD-M já passou por isso, não por uma
coligação autárquica (exceptuando o que se passou em 2017 em São Vicente e
Ribeira Brava, concelhos onde nem concorreu!), mas por decisões tomadas por
iluminados que depois as impuseram aos demais companheiros das estruturas de
freguesia ou de concelho. A derrota normalmente começa ai, quando o processo de
decisão é esse, imposto de cima para baixa e se banalizam e desvalorizam as
reuniões com as bases dos partidos, nas quais por vezes ouvir o que elas têm
para dizer se transforma numa "chatice".
Em tempo de vacas gordas, como aconteceu
durante anos, é fácil. Mas em tempos de crise - e sabe-se lá o que virá ainda
até as eleições de Setembro deste ano - tudo se complica.
Alguém dúvida que o desastre eleitoral
autárquico do PSD-M, gostem ou não que se diga (e não vou discutir agora
factores de natureza diversa que também influenciaram negativamente o desfecho
eleitoral dos social-democratas em 2013, incluindo divisões internas,
desmobilização organizada e promovida, deliberados boicotes das campanhas
eleitorais programadas e que nem das sedes saíram, escolhas erradas contra o
sentir das populações, apesar dos alertas dados, influência desmedida,
despropositada e nalguns casos nojenta (porque falsa e manipuladora) de
alguns dos chamados "notáveis"
da coutada, uns insignificantes promovidos a "ouvidores do reino" lá
na freguesia ou concelho mas que não representavam coisa nenhuma, alguns nem lá
residiam mais, etc) começou nas eleições de 2013, influenciadas também por
factores políticos ocorridos nos dois anos anteriores (falo do PAEF e do
agravamento das condições de vida que daí resultou), mas influenciados
sobretudo por outras realidades determinantes.
Das principais Câmaras Municipais da RAM o PSD apenas manteve Câmara de Lobos, graças a uma fidelidade eleitoral da esmagadora população local que nem sempre foi bem tratada por quem de direito, que nem sempre foi apoiada da forma que devia ter sido, porque política é também isso, gostem ou não que se diga (e conversas hipócritas comigo não funcionam): apoiar todos sim e sempre, mas apoiar de uma forma mais concreta, sem colocar em causa dos outros, aqueles que mais confiaram em nós quando foram chamados a pronunciar-se.
A minha maior dúvida
A minha primeira dúvida é saber, e não sei,
nem tenho sequer essa certeza, se PSD-M e CDS-M, que se encontram na oposição
em 00 das 10 freguesias do Funchal, sentem o pulsar das populações das
freguesias da capital, onde não são poder, se estão presentes no terreno da
forma e modo como seria recomendável a quem quer reconquistar eleitores perdidos,
se fazem uma leitura isenta e pragmática da realidade social e política em cada
freguesia, se procederam ao levantamento - uma espécie de análise-swot - da
realidade das freguesias, das necessidades mais prementes, dos problemas dos
jovens, do impacto do desemprego e do consequente peso do apoios sociais, do
estado em que se encontram as pequenas empresas existentes em cada freguesia,
enfim, o levantamento sério das potencialidades e ameaças, dos pontos mais
fortes e das fraquezas, etc. Sem isso esqueçam, não há solução política que
resulte e resista porque fica sempre a ideia de que há uns
"paraquedistas" que passam 4 anos a vaguear pela zona e que, de
repente, só porque se lembraram que se aproximam eleições, querem ser mais
vistos na freguesia (não marcaram posições no terreno nem ganharam visibilidade
pessoal e política ao longo de todo o tempo que dispuseram para o fazer),
tentando a visibilidade que ajuda os propósitos eleitorais, até porque as
freguesias nunca ganharam, contrário das Câmaras Municipais - e nem todas! -
grande protagonismo no espaço mediático disponível.
E se temos presentes - e por isso elaborei estes quadros comparativos até para facilitar a percepção do tema - os resultados eleitorais das autárquicas de 2013 e 2017, convém recordar, no caso do Funchal - que virou perigosa e patética obsessão para alguns, como se isso resolvesse os problemas da governação regional e ajudasse a superar os desafios que tempos pela frente - que os resultados das legislativas e regionais de 2019, mesmo tratando-se de eleições diferentes, são uma referência que não pode ser escamoteada porque ajuda a perceber fragilidades e potencialidades.
O peso pessoal
É voz corrente que as eleições autárquicas são as eleições mais pessoalizadas de todas, porque mais do que a fidelidade do voto partidário, há uma outra componente - o voto na pessoa que mais convence a nossa confiança - que pode influenciar os resultados, a escolha dos candidatos. Quando esses dois itens se confundem, os partidos pouco ou nada ganham com isso. No fundo, o que um partido precisa, mais do que manter o seu eleitorado tradicional e que vota por habituação, por escolha ou por fidelização simbólica, é poder e saber penetrar nos chamados indecisos ou abstencionistas - o eleitorado, a maior faixa dele, que sem compromissos vagueia de eleição para eleição alterando o seu voto em função de premissas ou factores exógenos (aos partidos) um dos quais tem a ver com as pessoas escolhidas para liderarem uma candidatura e com a confiança que transmitem e garantia de competência e entrega que os acompanha.
Os autarcas são os "porteiros"...
Não há "jokers" milagrosos neste
processo eleitoral, sobretudo neste. Os autarcas, nas freguesias e nos
concelhos, são uma espécie dos "porteiros" que abrem a porta de
entrada dos cidadãos na governação, são eles que recebem os eleitores, que
estão mais perto deles, que os encaminham, que os ouvem, que resolvem ou tentam
resolver os problemas, que pedem ajuda e apoios quando necessários, que constroem
pontes com os patamares superiores da governação, que estabelecem essas
ligações de confiança entre as instituições e as pessoas.
Por isso, durante anos, era voz corrente
afirmar-se que ninguém devia chegar aos patamares mais elevados da política e
do exercício da governação, sem antes sentir o pulso da pressão e da
responsabilidade ao nível autárquico. Hoje isso perdeu sentido, porque a
política aos poucos perdeu a sua essência, as suas ideologias devidamente
demarcada umas das outras, para se transformar antes numa arena de oportunismos
e de oportunistas cinzentões e sem ideologia, que hoje tanto vendem um sabonete
como amanhã tentam fazer passar um quilo de barro como se de ouro se tratasse.
Até a fidelidade militante nos partidos
hoje deixou de obedecer a uma lógica que predominou durante anos, mesmo que
existissem no passado situações em que essa regra foi espezinhada. São os
partidos que fomentam e incentivam o oportunismo militante, que desvalorizam a
militância, que quase atiram para o lixo a coerência ideológica que vincula uma
pessoa a um partido - ou que devia vincular.
No futebol os clubes não se compadecem com
cinzentões, porque quem gosta de futebol tem uma escolha feita. Na política
fomenta-se a pretensa influência dos "independentes",
institucionaliza-se o cinzentismo idiota, desvalorizando a coerência e
empurrando até os militantes para fora, a se afastarem porque há quem queira
partidos políticos, não os clubes de futebol, transformados em mantas de
retalhos ou, se preferirem, em "albergues espanhóis". A Madeira não
escapou a isso, infelizmente. Hoje a militância de uma maneira geral, e apesar
das habilidades para disfarçar fragilidades, é um dos calcanhares de Aquiles da
política e dos partidos, distanciando-os das pessoas, que deviam fomentar as
escolhas, reintroduzir a diferenciação ideológica na política. etc. Um tema
actual, pertinente, mas para outas análises.
Se olharmos às regionais e legislativas de 2019 - a últimas eleições realizadas na RAM com partidos, depois das autárquicas de 2017, consta-se o seguinte, tomando como referência o Funchal:
- nas regionais de 2019, o PS foi o mais
votado no Funchal com 39% contra 37,1% do PSD e 5,7% do CDS. O PS foi o mais
votado em 6 das 10 freguesias da capital contra 4 freguesias para o PSD - Santa
Luzia, Sé, São Roque e Monte;
- nas legislativas de 2019, o PS voltou a ser o mais votado no Funchal com 36% contra 34,9% do PSD e 5,6% do CDS. O PS foi o mais votado em 5 freguesias da cidade, contra 5 ganhas pelo PSD - São Martinho, Monte, Sé, Santa Luzia e São Roque.
Ou seja, percebendo eu certos estados de
alma e sentimentos, sobretudo da chamada "velha guarda" do PSD-M, a
verdade é que a política é hoje, e cada vez mais, infelizmente, um negócio que
tem a ver com o poder. E os negócios obedecem a uma lógica de mais-valias, a um
evidente pragmatismo, para que não fracassem. O que é preciso é que as
diferentes estruturas partidárias do PSD-M e do CDS-M, sem generalizarem
coligações - sou frontalmente contra essa imposição generalizada e
inclusivamente não me repugna uma revolta eleitoral em resposta a essa lógica
totalitária nos tempos que correm em que as bases precisam de ter mais voz e
mais capacidade de decisão, mas também o dever de assumirem responsabilidades
caso falhem e sejam derrotadas - pergunto:
- as bases do PSD e do CDS regionais,
considerando todos estes números, acham que, concorrendo separadas - mesmo que
devam ser considerados factores novos do lado do PS, a começar pelo facto de
não existir ainda uma perspectiva de coligação, embora seja previsível (apenas
o Bloco e uns tantos partidos pequenotes sem expressão, deverão alinhar nessa
coligação, porque os bloquistas são os únicos que precisam de um guarda-chuva
porque eles têm um enorme pavor de concorrerem sozinhos e voltarem a ser
derrotados como aconteceu em 2019) e de Miguel Silva concorrer pela primeira
vez a eleições (apenas fez parte das duas listas lideradas por Cafofo no
Funchal), mas sobre isso um dia destes escreverei mais desenvolvidamente - estão convictas que isoladamente conseguem
os mandatos que lhes deem a maioria na edilidade funchalense? Francamente,
muito francamente - nem com "jokers" que alguns andam a inventar -
não acredito. Porque há ainda alguns anticorpos do pós-regionais de 2019 que
podem influenciar o desfecho eleitoral, caso uma parte significativa do
eleitorado pretenda deixar um aviso penalizador, essencialmente ao PSD-M, cujo
peso autárquico nem se compara, nunca se comparou ao do CDS-M. Basta ver os
quadros globais para percebermos que mesmo que a coligação não garanta nada,
dificilmente ela deixará de ser a solução política nesta altura. Mas certo de
que as autárquicas de 2021 no caso da Madeira não se resumem ao Funchal nem
esta cidade contribui em nada para o sucesso ou fracasso da governação
regional. Cada realidade no seu recanto (LFM)
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