Os dados da execução orçamental mostram que o adicional de despesa aprovado pelo Suplementar ficou por executar em 2020, o que contribuiu para o défice ficar abaixo da meta. O BE já veio criticar. Os partidos que aprovaram o Orçamento Suplementar tinham a expectativa de que o Governo fosse executar grande parte do adicional de despesa que estavam a autorizar. Afinal, estávamos perante um reforço extraordinário face a um evento inesperado, a pandemia. Contudo, a execução orçamental conta outra história: a despesa efetivamente executada ficou não só abaixo do Suplementar, como da estimativa inicial do Orçamento do Estado para 2020 (OE 2020), o qual não contemplava a pandemia.
Os dados da Direção-Geral do Orçamento divulgados esta quarta-feira mostram que a despesa pública executada em 2020 foi de 94.436,6 milhões de euros, crescendo 5,3% face a 2019. Este valor é significativamente inferior a todas as estimativas feitas pelo Governo em Orçamentos desenhados em 2020: 96.836,5 milhões de euros no OE 2020 (feito antes da pandemia), 101.302,6 milhões de euros no Orçamento Suplementar de 2020 e 97.042 milhões de euros no OE 2021 (atualização da previsão para a execução de 2020), como mostra a tabela seguinte.
No comunicado em que anuncia que o défice
de 2020 deverá ficar abaixo dos estimados 7,3% do PIB e “mais próximo” dos 6,3%
previstos no Suplementar, o Ministério das Finanças, para justificar o défice
inferior, dá mais ênfase à receita, argumentando que correu melhor do que o
esperado por causa da resiliência do emprego, e diz apenas que a despesa
pública “terá ficado próxima do valor previsto na estimativa de 2020 incluída
no Orçamento do Estado para 2021”.
Contudo, os dados da DGO mostram que a execução ficou 2,68% abaixo da estimativa feita em outubro, o que corresponde a menos 2.605 milhões de euros de despesa. Na realidade, a despesa aprovada pelos deputados para 2020 tinha sido bem superior, correspondendo aos valores do Orçamento Suplementar — o qual foi viabilizado pelo PSD e BE — cuja diferença face ao executado é de 6,78% (6.866 milhões de euros). Mais surpreendente ainda é que a despesa tenha ficado abaixo da estimativa do OE 2020, que foi desenhado antes da pandemia. Face ao anúncio de que o défice de 2020 será menor do que o previsto, as críticas à esquerda não tardaram em chegar: “Défice abaixo do previsto não é elogio. É um orçamento suplementar por executar. São apoios que se atrasam ou nem chegam à lei. É investimento por fazer. Não estamos em tempo de brilharetes“, escreveu a deputada bloquista Mariana Mortágua no Twitter, criticando a gestão orçamental de João Leão com uma expressão (“brilharete”) que tinha sido utilizada para classificar o excedente orçamental de 2019 alcançado por Mário Centeno, anterior ministro das Finanças.
Esta análise da execução orçamental é em
contabilidade pública (ótica de caixa, ou seja, o dinheiro que entra e sai
entre janeiro e dezembro) e não tem em conta alguns ajustes adicionais que
possam existir para a contabilidade nacional (ótica que interessa para
comparações internacionais), face ao previsto anteriormente, o que poderá
também influenciar o valor final do défice nessa ótica que será revelado pelo
Instituto Nacional de Estatística (INE) em março. É de recordar ainda que o
Orçamento Suplementar deu não só autorização para mais despesa pública, mas
também para o Estado endividar-se mais (face à previsão de queda da receita) e
para prestar garantias bancárias às linhas de crédito para as empresas.
Questionado pelo ECO sobre o que justifica
esta diferença, o Ministério das Finanças responde que “o Orçamento Suplementar
de 2020 considerou os limites máximos de despesa autorizados pela Assembleia da
República e que se previa que fossem executados num cenário de pandemia
bastante adverso para as contas públicas”. “Com a ligeira recuperação da
economia no 2.º semestre de 2020 face ao 1.º semestre e com o mercado de
trabalho mais resiliente do que o esperado, a despesa acabou por ficar abaixo
do inicialmente previsto“, justifica.
O ministro das Finanças, João Leão, comprometeu-se publicamente a deixar os estabilizadores automáticos (como o subsídio de desemprego) funcionar plenamente e a não colocar limitações aos apoios públicos disponibilizados às empresas e aos cidadãos. A justificação apresentada pelas Finanças é que a menor contração da economia em 2020 face ao previsto (-8,4% no caso do Governo) — que já parece ser consensual entre os economistas — levou a uma menor execução da despesa. Em comparação com os valores do Orçamento Suplementar, os dados finais da execução orçamental de 2020 mostram que as principais divergências na despesa verificam-se na aquisição de bens e serviços, nas transferências correntes e nos subsídios — duas categorias onde se inserem os apoios dados à economia — e nas outras despesas correntes. Além disso, a componente de investimento também ficou aquém do orçamentado.
Receita pública não correu assim tão bem
Em contraste com o comunicado das Finanças
— que notava o comportamento “bastante superior ao esperado” da receita fiscal
(em particular do IRS e IRC) e contributiva (TSU) –, os números da execução
orçamental para o total da receita pública mostram que esta também ficou
significativamente aquém das estimativas do Orçamento Suplementar.
Os dados da Direção-Geral do Orçamental revelam que entraram 84.116,6 milhões de euros nos cofres do Estado, abaixo dos 87.627,1 milhões de euros estimados no Orçamento Suplementar em junho do ano passado. Contudo, é verdade que a receita pública ficou acima da última estimativa feita pelo Governo, revelado no OE 2021, em que esperava encaixar 83.049 milhões de euros. Os dados finais mostram que o Estado conseguiu arrecadar cerca de mais mil milhões de euros. De facto, a receita com impostos diretos (como o IRC), impostos indiretos (como o IVA) e as contribuições para a Segurança Social (TSU, que registou uma queda de apenas 0,8%) não foram muito diferentes do previsto no Suplementar, como notava o Ministério das Finanças no seu comunicado. As principais diferenças, com menos dinheiro a entrar nos cofres públicos, estão nas outras receitas correntes e nas transferências de capital (ECO digital, texto do jornalista Teago Varzim)
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